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História Entre Sem Bater - Capítulo 12 - Mesmo quando o passado volta a bater na sua po


Escrita por: andreiakennen

Notas do Autor


Obs: Esse arco do passado do Caio será narrado em terceira pessoa para que vocês leitores tenham um panorama geral de tudo que ocorreu, depois a história volta para narrativa em primeira pessoa.

Capítulo 12 - Capítulo 12 - Mesmo quando o passado volta a bater na sua po


Obs: Esse arco do passado do Caio será narrado em terceira pessoa para que vocês leitores tenham um panorama geral de tudo que ocorreu, depois a história volta para narrativa em primeira pessoa. 

 

Entre Sem Bater

Por Andréia Kennen

Capítulo 12

Mesmo quando o passado volta a bater em sua porta?

Parte 2

 

— Oi, Caio — cumprimentou a colega de sala de Caio, debruçando-se sobre a mesa dele. — Vamos juntar o pessoal da sala em uma festinha na piscina na casa da Samara, saiba que está intimado.

— Não posso — respondeu rápido. — Tenho compromisso esse final de semana.

— Quem disse que vai ser no fim de semana? A Sam vai para Orlando no sábado.

— A Samara vai para Disney de novo?

A que fazia o convite deu de ombros.

— Parece que a mãe dela vai levar o Bruninho, o caçula, e ela vai junto.  

Caio suspirou, consternado. O irmão de Samara deveria ter no máximo cinco anos e iria fazer sua primeira viagem internacional, enquanto ele mal saíra do estado de Paraná.

— A vida é muito injusta.

— Oi, Caio?

— Nada.

— Mas e aí? — a colega insistiu, encarando-o com os olhos castanhos vidrados nele. — Vai ou não?

— Fala o dia que vai ser então, Luana — ele pediu, perdendo a paciência com o convite sem detalhes da colega.

— Hoje, ué! Agora à tarde, as aulas acabaram mesmo. Vamos todo mundo almoçar lá e torrar no sol na beira da piscina o resto do dia. Vai ser super divertido. E aí, o que me diz?

— Eu... — Caio ficou constrangido em ter que justificar que precisava pedir permissão aos pais antes.

— Liga para sua mãe, bobo — a menina respondeu como se tivesse lendo os pensamentos dele. — A família da Luana estará em peso lá. Se quiser pede para sua mãe ligar para dona Soraya e confirmar com ela. Afinal, é uma confraternização da nossa sala.

— Tá — ele aceitou para que Luana parasse de argumentar e terminou de guardar os materiais dentro da mochila. — Vou acompanhar meu amigo até a rodoviária e no caminho converso com minha mãe e te dou uma resposta.

— O Argentino?

— É.

A menina fez uma cara de desânimo.

— O que foi agora?

— Bem, a intenção era que você chamasse ele também — ela riu sem graça, voltando a ficar ereta. — Era a ideia das meninas.

— Eu acho que não sou tão bem vindo quanto esperava. Vocês querem o Cassiano.

— Lógico que não, besta! Mas você é todo certinho, né, Caio? Bem que as meninas curtem uns caras mais assanhadinhos de vez em quando. Sem ter que contar para eles que gostam, entende?

— Ah, claro.

“Mas pode contar para mim, ou seja, não estou no grupo dos caras ‘assanhadinhos e interessantes’”.

— Mas de qualquer forma, você tem que ir, porque...

A menina se deteve ao sentir um puxão na sua orelha.

— Está falando demais, sua tagarela.

— Ai, ai, Fê!

 Era a Fernanda, uma menina de cabelos curtos, óculos e que havia entrado na escola naquele ano.

— Oi, Caio — ela cumprimentou de forma seca o colega de classe.

— Oi, Fernanda — Caio respondeu o cumprimento, mas achou estranho a atitude de Fernanda, a colega parecia estar evitando olhá-lo nos olhos, pois manteve o rosto voltado para saída da sala.

— Não disse nada, Fê. Juro! — se explicou Luana, deixando Caio mais confuso.

— Sei, sei. Mas chega. As meninas estão te esperando, vamos logo — Fernanda demandou, dando um sorrisinho tímido para Caio e saiu puxando a colega pela orelha. — A gente te espera lá, Caio — acrescentou. 

Caio acenou se despedindo das duas, não entendendo muito bem o que estava acontecendo entre elas. Mas tinha compromisso, não era hora de pensar naquilo. Consultou as horas no relógio de pulso, pegou suas coisas e saiu depressa.

Foi abordado por mais alguns colegas no caminho até a saída, os meninos queriam saber se ele tinha sido convidado para festa na casa da Samara e se ele iria.

Não deu certeza, mas estava começando a se sentir empolgado com a ideia.

— Eu que não perco isso por nada! — exclamou Pedro, fazendo gestos de entusiasmo ao crispar os punhos. — As mais gatas da nossa sala de biquíni? Meu Deus!

— Vou fazer o possível para ir também, pessoal — Caio garantiu e se afastou. — Até mais tarde.

— Até, Caio! — respondeu Pedro.

— Vai sim — gritou Henrique. — Acho que a Fê está interessada em você, hein!

A revelação de Henrique fez com que Caio parasse de acenar e arregalasse os olhos na direção dos garotos que se afastavam rindo.

Ele ficou constrangido, pois a cena de poucos instantes atrás, da Fernanda impedindo a Luana de dar com a língua nos dentes, acabou tendo alguma coerência.

Respirou fundo. Era uma coisa de cada vez. Primeiro: ir para casa de Cassiano, acompanhar o amigo até a rodoviária.

...

Estavam no carro de dona Rosinda, mãe de Cassiano, quando comentou com o amigo sobre a festinha na casa da Samara.

— Lo que usted dice?

— Você sabe como os meus pais são, Cass. Vou ter que ligar para eles, pedir permissão, prefiro evitar o constrangimento.

O melhor amigo bateu na própria testa e afundou no banco do carro, não acreditando no quanto o colega era devagar.

— Caiozito, por Dio!

— O Cássio Fabiano está cierto, Caio Henrique — dona Rosinda entrou na conversa. — Ligue ahora pra su madre. Se ela decirte que no, yo voy hablar com ella. Como asi? Usted es jovem. Tienes estar con otros jóvenes de su edad. Y no metido em igrejas o tempo todo! Vaya, rápido. Ligue e voy hablar com Suzana.

Dona Rosinda estacionou o carro e Caio encarou assustado no banco de trás os olhares brilhantes, refletido no retrovisor central do carro, da mãe e do filho no banco da frente. Agora Caio entendia um pouco de quem o amigo havia herdado o jeito desinibido.

Procurou ficar menos tenso. Sorriu, suspirou fundo e retirou o celular da mochila e o entregou para mãe de Cássio, pensando que o máximo que conseguiria era um “sim”, pois o “não” ele tinha com certeza. 

O coração de Caio passou a bater mais forte enquanto a conversa entre a mãe de Cássio e a sua transcorria. Quando dona Rosa estendeu o telefone de volta em sua direção dizendo que a mãe queria falar com ele, imaginou que teria uma resposta positiva.

— Mãe?

— Caio, sobre essa festinha, eu vou falar com seu pai primeiro e depois mando uma mensagem confirmando. Mas, antes, eu quero falar com a mãe da sua colega de sala e confirmar algumas coisas. Não estou lembrada dela, me passa o telefone, por favor.

— Certo!

Caio conhecia dona Suzana bem o suficiente para saber que, pelo tom de voz e por ela estar ponderando sobre o assunto, a resposta seria afirmativa sim.

E, como esperado, antes que Cassiano embarcasse no ônibus que o levaria para Curitiba, de onde pegaria o avião para Buenos Aires, Caio recebeu a mensagem da mãe dizendo que estava liberado para ir à festa de confraternização da sua sala.

“Quando terminar me ligue para eu ir buscá-lo. Divirta-se, querido”, fora a frase final dela.  

Depois das recomendações de dona Rosinda para Cassiano e dos vários pedidos de abraços e beijos para a família na Argentina, a mãe liberou o filho para se despedir do amigo.

Sem muitos rodeios, Cássio abraçou Caio e o rapaz de olhos azuis tratou de cochichar algumas instruções ao pé do ouvido do outro. Tais como: não ficar acanhado na hora da festa e se alguma garota se mostrasse a fim dele, que ele tomasse a iniciativa e desse o primeiro beijo sem remorsos. Ainda, caso tivesse oportunidade, tentasse tocar discretamente nela, poderia ser uma mão boba na coxa, em um dos seios, por cima da blusa, na barriga, ou até um aperto mais firme na cintura. E completou com um: “você vai ver como a garota vai cair de amores por você”.

Caio só conseguiu ficar vermelho e a dona Rosinda balançar a cabeça negativamente para o filho, afirmando o quanto ele não tinha jeito, pois apesar de ele estar cochichando ela ouvira muito bem.

— Te amo, Caiozito! — Cassiano declarou, acenando da janela do ônibus, após se acomodar no acento interno. — Te ligo así que chegar.

— Deveria ligar para su mamá primeiro, né, Cássio Fabiano? Niño ingrato!

— Mamá, yo falo com usted todos os dias de mi vida.

— Tchau, Cass! Boa viagem. Me ligue depois que ligar pra tia Rosa.

O ônibus começou a se movimentar. Cassiano jogou beijos da janela para os dois na plataforma, assim como outros passageiros que acenavam em despedida para os parentes que ficavam. Depois que o ônibus se foi, dona Rosa colocou as mãos nos ombros do melhor amigo do filho e perguntou onde ficava o endereço da coleguinha de escola dele, onde seria a festa.

— Não precisa se incomodar, dona Rosa, pode me deixar em um ponto de ônibus e eu dou um jeito de chegar lá.

— De ninguna manera, mi querido. No é trabajo. Ahora vamos!

...

Caio segurava o copo de bebida quando sentiu as mãos finas de Fernanda sobreporem as suas. Estavam ambos amparados debaixo do guarda-sol. Os amigos brincavam ao fundo na piscina e no rádio ao longe tocava uma dessas canções de pop internacional que provavelmente estava estourada nas paradas e que ele pouco conhecia. Mesmo que a voz feminina acompanhada de um vocal masculino soasse realmente agradável e harmônica (1)[1].

Mas o mais importante é que na frente de Caio estava Fernanda e ela havia acabado de confessar que queria ficar com ele.

Não fora uma confissão amorosa, ela não havia dito que o amava e nem nada do que Caio imaginara, simplesmente dissera que o achava bonito e que fazia um tempo que queria ficar com ele.

Entendia muito bem que “ficar” era algo sem compromisso. Cass vivia “ficando” com uma garota e outra. Não achava a atitude do amigo correta e o vivia censurando por brincar com os sentimentos alheios.

Mas o amigo ria das suas observações e agora entendia um pouco o motivo: sua ingenuidade. Afinal, as próprias meninas também propunham “ficar”, ou, pelo menos, usavam do argumento para conseguir ter um momento com a pessoa de quem estavam a fim.

E, mesmo não gostando da ideia, sentiu um grande tremor com a aproximação do rosto de Fernanda do seu. Os lábios dela se umedeceram e vieram em direção dos seus. Logo fora a vez dos olhos se fecharem e assim que a distância entre ambos os rostos diminuiu as boca se tocaram.

O beijo aconteceu um pouco sem jeito. Era o primeiro beijo de Caio, por isso não soube ao certo como reagir. Ficou parado, deixando que Fernanda comandasse. Os dois estavam sentados de frente um para o outro. Ele ainda segurava o copo de refrigerante em suas mãos, ouvindo ao fundo os risinhos de deboche.  

Fernanda notou a tensão do colega, devido a estarem muito expostos, e se afastou. Ela também ouvia as gracinhas dos amigos de classe, então teve outra iniciativa: tomou o copo da mão de Caio, deixou-o na mesinha do lado da cadeira de sol, apanhou a mão do colega na sua e o puxou para se afastarem dali.

— Vamos para um lugar menos barulhento — ela sugeriu, levando-o para os fundos da casa da Samara, onde havia um grande jardim.

Segura do que queria Fernanda não mediu suas ações seguintes: empurrou Caio para o tronco de uma das árvores do local e encostou seu corpo no dele. Caio vestia uma bermuda e camiseta. Fernanda estava com a parte de cima do biquíni e o short jeans curto. O adolescente pode sentir os seios discretos dela roçarem no tecido da sua camisa.

Lembrou-se das orientações de Cassiano, mas a única atitude que conseguiu tomar foi segurar firme na cintura de Fernanda e novamente se beijaram.

Ficaram por um bom tempo, até que o clima mudou, relâmpagos tamborilaram no céu e uma garoa fina e fria se iniciou. O sol se pôs, levando com ele o calor gostoso do dia e do corpo feminino encostado no de Caio.

Estavam conversando, trocando números de telefone, quando Samara apareceu afobada, dizendo que a mãe de Fernanda tinha acabado de chegar para buscá-la.

Os dois se despediram.

— Foi legal — Fernanda declarou, dando um último beijo no rosto de Caio, sorrindo sem jeito ao tentar ajeitar o cabelo bagunçado pela chuva. 

— Também gostei.

— Obrigada. A gente se fala por telefone.

— Tá — ele acenou e as meninas saíram depressa, rindo e conversando.

Esperou as duas desaparecerem e voltou para área da piscina, sentindo um pouco nervoso ao pensar que encararia os colegas de sala. Mas, para o seu total alívio, a maioria tinha ido embora. Somente uma meia dúzia estava na varanda da casa, e aos pares também. Pedro era um dos poucos que restaram. Ele estava grudado na cintura da Vanessa, não era novidade para ninguém que os dois estavam juntos fazia um tempinho.

— E aí, Caio?— Pedro abriu a palma da mão para o amigo, junto com um largo sorriso.

Caio correspondeu ao pedido de cumprimento batendo sua mão na palma do amigo e sentou-se em uma das cadeiras de madeira.

— Você e a Fê, hã? Quem diria.

— Pois é — comentou sem muito entusiasmo, estava começando a sentir frio. Pegou o celular no bolso da bermuda e enviou mensagem para mãe ir buscá-lo.

— Ei, que animação é essa depois de ter ficado com a gata da Fê, meu amigo?

— Para de pegar no pé dele, Pedro — a ficante do amigo o defendeu. — Ele é tímido.

— É nada! Esses tímidos que são os mais safados.

Eu só dei uma risada.

— Vocês formam um casal bonitinho, Caio — Vanessa comentou.

— Hm. Obrigado, Vanessa.

— Nós que formamos um casal bonitinho, meu amor — Pedro disse, invejoso, e beijou o rosto da menina.

Caio espirrou, estava com a roupa úmida e a temperatura continuava caindo. Não queria manter o foco da conversa nele, por isso mudou de assunto rapidamente, perguntando quem mais tinha ficado com quem naquele dia, mesmo que não fosse seu real interesse.

Apenas queria desviar do fato de que Fernanda e ele tinham ficado. Afinal, não podia alimentar esperanças de um futuro namoro para ninguém, pois tinha a obrigação de firmar compromisso com Rebeca naquele fim de semana no retiro.

Pedro e Vanessa desataram a tagarelar sem parar, contando em resumo todas as novidades do dia. Caio apenas assentia para o casal, fingindo que estava ouvindo.

Mas a verdade é que não estava prestando atenção neles e sim pensando em si próprio. Ainda não tinha certeza do que havia sentido com Fernanda e se realmente tinha gostado. No começo veio aquele frio na barriga, seu corpo reagiu, a virilha formigou, mas talvez fora devido ao novo, a surpresa, a descoberta. Depois o clima foi ficando morno e esfriou.

Havia se deixado levar pela curiosidade e a única coisa que sentia agora era o peso do remorso, por pensar que havia se enganado, enganado Fernanda, além de traído a confiança dos pais e de Rebeca.

Deu um novo espirro e os amigos pararam somente para desejar “saúde” e logo voltaram a fofocar.

Começou a sentir uma dor de cabeça leve e calafrios. Nunca quis tanto estar na sua casa, em sua cama, debaixo do seu cobertor.

E, em pensamento, desejou que mãe chegasse para apanhá-lo logo.

...

A festa na piscina fora ótima para Caio, mas o resultado catastrófico para os pais dele.

— E, então, querido? — aflita, dona Suzana perguntou ao marido, as mãos juntas como se estivesse orando e esperando que suas orações agissem um milagre instantâneo.

— Resfriado — constatou o marido tirando o termômetro debaixo da áxila do filho e analisando a temperatura. — A febre está alta porque a garganta está inflamada.

A mãe bateu os braços ao longo do corpo em sinal de desespero.

— Meu Deus, não pode ser verdade, Edvaldo! Piscina, calor, chuva fria. Eu sabia! Deus estava me dizendo que não era para permitir o Caio ter ido nessa bendita festa. E agora o retiro...

— Querida, isso são coisas que acontecem. Não vai ficar se lamentando aqui dentro, pelo amor do Pai. Nosso filho precisa de tranquilidade para se recuperar. Vamos deixar o Caio descansar e a gente conversa lá fora em como faremos com a viagem. Mas não temos muito que fazer, certamente, e, infelizmente, eu terei que ir sozinho. Sou um dos ministros principais, não posso me dar ao luxo de faltar. Você fica e cuida dele.

— Espera, meu amor. Podemos deixá-lo na mamãe.

— Viajar até sua mãe, Suzana? — o marido perguntou irritado com a proposta sem nexo da esposa, visto que a mãe dela morava em Pato Branco. — São duas horas e meia de viagem contando ida e volta. Pelo amor de Deus, o retiro começa em menos de uma hora.

— Deus não pode estar fazendo isso conosco. E a pobre da Beca?

— Deus não está fazendo nada de ruim, Suzana. Deus só age de forma boa. Somos nós, seus filhos ingratos, que temos a boca estragada para culpá-lo dos nossos erros. E compromisso nosso filho pode firmar em qualquer ocasião. Para quê tanto drama? Chega. Eu vou até a farmácia pegar antibióticos para o Caio e volto rápido. O analgésico não fará efeito nessa inflamação.

Caio não estava ouvindo direito a discussão dos pais, o remédio que o pai lhe dera estava fazendo efeito e a única coisa que ele conseguia sentir era sono. Por algum motivo, não conseguia se sentir chateado por não passar aquela última semana do ano enfurnado na fazenda do pastor Emanuel. Até mesmo ficar em casa, doente, parecia melhor opção àquilo.

Não era bem aquele algo diferente que estava esperando para o início de suas férias, ainda assim, quis acreditar que Deus estava intervindo ao seu favor.

...

Suzana se encostou a pia da cozinha e tomou um copo de água, pensando em quão horrível seria seu fim de ano longe do marido. Era a primeira vez que Edvaldo e ela estariam separados em uma data importante e era tal fator a causa da sua angústia.

Desde pequena sua mãe dizia que passar a virada do ano junto de alguém fazia com que ficasse junto desse alguém pelo ano todo. Apesar de ser uma superstição boba e sua religião repugnar esse tipo de crença, ainda acreditava nela.

— Será que Deus está querendo nos provar? Como eu devo agir, Senhor? — ela perguntava angustiada para si própria. — Mande-me uma luz, Pai. Faça-me enxergar a solução, por favor? Sua filha não está preparada para passar por uma crise familiar e estou clamando sua ajuda.

Suzana fechou os olhos, juntou as mãos novamente e passou a proferir uma oração em tom baixinho. Mas foi interrompida por alguém chamando por seu nome, reabriu os olhos e percebeu que a voz vinha de fora, do portão. Olhou pela janela e viu a vizinha.

— Oi, Mari. Espera um momento — pediu e foi até o interfone para destravar o portão e a amiga poder entrar.

Estava começando a garoar novamente, clima típico daquela estação de calor. Mariana entrou rápido, afastando os pingos da chuva da roupa e Suzana a recebeu com dois beijos no rosto.

— Você está bem, Mari?

— Sim. Mas eu encontrei o Edvaldo saindo de carro, achei que estavam indo viajar, mas ele me disse que ainda não e que o Caio estava doente. O que aconteceu, irmã?

— Ai, Mari — a mulher abraçou a vizinha. — Estou tão preocupada.

— Não é só um resfriado?

— Sim, é só um resfriado. Não estou preocupada com o Caio. O problema é que não dá para viajar com ele doente e eu vou ter que ficar cuidando dele. Estou tão aflita, Mari. Sabe...  — a mulher se afastou da vizinha e limpou as lágrimas que começavam a margear seus olhos. — É a primeira vez nesses dezoito anos de casada que Edvaldo e eu iremos passar separados. E eu não consigo parar de pensar que isso é uma provação. Eu não quero, Mari. Não quero. Estou sentindo algo ruim.

— Amiga, por que você não deixa o Caio com a gente? — Mariana sugeriu, não percebendo que sua simples sugestão causara um impacto tão grande em Suzana que a deixara paralisada por um tempo, encarando-a com um olhar firme, até que as lágrimas escorreram pelo rosto dela. — Meu Deus, Suzana, eu disse algo de errado?

— Não, não. Eu só estava pensando em quanto Deus é maravilhoso, Mari. Eu estava aqui, clamando baixinho, pedindo por uma luz e você chega e agora faz essa sugestão. Você é o milagre que eu pedi.

Mariana suspirou mais aliviada e apanhou a mão da amiga na sua.

— Eu e o Denis não vamos a lugar nenhum. Não custa fazer esse favor. E, eu acho que ter o Caio doente em casa, precisando da nossa atenção, fará com que desperte o lado paternal dele.

— Sim, sim. É ação do nosso Senhor, com certeza.

— Será que para o Edvaldo não terá problema?

— Pode deixar — ela respirou fundo, agigantando o sorriso no rosto. — Eu farei com que ele entenda a providência enviada por Deus.

— Certo! — e as duas se abraçaram mais uma vez.

...

Caio sentia vez ou outra uma mão delicada tocando sua testa, medindo a temperatura durante a madrugada. Mas o toque que o confortava era de uma mão mais pesada, fria, que parecia aliviar o ardor em sua pele.

A inflamação em sua garganta era tanta, que não conseguia falar direito, não sentia vontade de comer, tão pouco de beber água, queria apenas dormir.

Mas de manhã percebeu que estava causando preocupações quando acordou ouvindo uma conversa ao telefone de Mariana e seu pai. Parecia que conversavam sobre seu estado de saúde, visto que ambos eram médicos. No final, parece que concordaram na aplicação de uma injeção.

Caio descerrou as pálpebras com algum esforço e viu Mariana colocando as luvas de borracha e abrindo a embalagem de uma seringa.

— Bom dia, querido — ela o cumprimentou, sentando-se ao lado dele na cama. — Como está se sentindo hoje?

— Melhor — Caio esforçou-se para falar, percebendo que sua garganta ainda doía.

— Conversei com seu pai e concordamos em ministrar seus medicamentos por injeção. Eles estão muito preocupados, estavam até pensando em deixar o retiro.

­— Não precisam.

— Eu sei que é um bom filho e não quer atrapalhá-los, mas entenda que eles são seus pais. Faz parte dessa condição a preocupação. Mas se você melhorar, eles voltaram apenas quando acabar. Então, trate de se recupera rápido — ela pediu e sorriu gentil. — Vai sentir uma picadinha.

— Quer que eu aplico, Mari? — Caio percebeu pela primeira vez a presença de Denis parado na entrada do quarto. — Você tem uma mãozinha pesada para injeções — o esposo observou.

— Engraçadinho. Mas eu dou conta, viu?

— Caio, consegue virar de bruços? — Mariana perguntou.

O menino balançou a cabeça positivamente e o marido de Mariana ajudou a descobri-lo puxando o edredom. Caio estava de calça de moletom cinza, camisa branca e meias.

— Vou descer seu pijama um pouquinho, tá, querido?

— Hm.

Como fora avisado por Denis, a injeção dada por Mariana foi dolorida e Caio fez uma careta, mas quando ela perguntou se estava tudo bem ele balançou a cabeça em um sim.

— Agora o efeito será mais rápido — ela garantiu, informando que estava pronto e que ele podia se virar. — Mas eu tenho plantão agora de manhã, Caio. Eu preparei o café para você tomar, tente comer um pouquinho, tá? O Denis vai te ajudar. Na hora do almoço eu venho para ver como está e passar a situação para o seu pai.

— Não se preocupe, Mari — Denis interrompeu novamente. — Eu tomo conta dele. Pode cumprir as doze horas do seu plantão.

— Sim. Mas eu tenho uma hora para o almoço.

— Não precisa se deslocar de lá aqui para cuidar dele, amor. Eu estou falando que dou conta.

— Mas...

— Eu vou ficar bem com o Denis, Mariana.

Mariana sorriu e Caio sentiu um beijo dela na testa. A vizinha acabou por concordar que o marido tomasse conta dele sozinho. Ficara até contente com o fato de Denis estar tão disposto àquela tarefa, como se fosse um preparatório para ele se tornar pai.

 Mas a única coisa que Caio queria era se recuperar para que os pais não precisassem voltar e ele pudesse aproveitar um pouco daquele período sem a vigília incessante deles.

Por isso, esforçou-se para comer todo o mingau de aveia feito por Mariana e voltou a dormir.

Acordou horas mais tarde, sentindo-se bem melhor. O cheiro bom de comida do ambiente fez seu estômago roncar alto. Havia suado bastante debaixo do edredom, tanto que teve que afastá-lo. Além disso, precisava ir ao banheiro. Levantou-se e depois de verificar que a porta anexa no quarto era o banheiro seguiu rápido para dentro dele.

Após suas necessidades, lavou o rosto na pia e estalou os lábios, sentindo a boca amarga. Soprou o hálito na mão e o cheiro forte do que restara da inflamação embrulhou seu estômago.

— Caio, você está bem? — ouviu a pergunta de Denis vinda de dentro do quarto.

Abriu a porta do banheiro e colocou apenas a cabeça para fora, a mão cobrindo a boca.

— Preciso escovar os dentes e tomar um banho — explicou para o vizinho.

O homem aproximou-se e repousou a mão na testa do adolescente.

Caio sentiu que aquela era a mão que o confortara algumas vezes durante a noite, era pesada e naturalmente fria, gostosa de sentir.

— A febre baixou — ele constatou. — Bom, né?

— Hm.

— Pode ir tomando banho. Vou trazer o que precisa.

— Obrigado, Denis.

— Ânimo, garotão. Estou preparando um almoço e tanto para nós dois — e saiu piscando um dos olhos.

Ganhou uma escova de dente nova. Denis era dentista e certamente tinha muitas delas em casa. Recebeu uma toalha limpa e pode tomar um banho frio e demorado. O que pareceu aliviar o cansaço do seu corpo.

Percebeu que não tinha nenhuma mochila sua por perto ao sair do banheiro, mas bastou vasculhar o roupeiro de hóspede para notar que suas roupas estavam bem organizadas ali dentro.

Estava calor, mas o tempo parecia nublado, por isso optou em colocar uma bermuda preta e uma camisa de manga longa listrada de branco e azul. Ainda estava se recuperando, era bom manter-se agasalhado. Não encontrou pente e nem desodorante nas suas coisas, mas notou que havia ambos sobre a escrivaninha. Não sabia se podia usar, mas deduzindo que fora Denis quem deixara ali para ele, decidiu que utilizaria.

Caio saiu do quarto e andou em direção as escadas de pedra de granito e corrimão de metal. A casa dos vizinhos era muito grande, de arquitetura moderna, com uma fachada de vidro fumê que começava no primeiro piso e subia até o segundo.

Desceu as escadas com cuidado, por estar se sentindo um pouco tonto ainda, então seguiu para sala de jantar, imaginando que a cozinha estava depois dela. Mas antes de entrar na cozinha, procurou sentir novamente o hálito. Havia escovado bem os dentes e feito gargarejo com enxaguante bucal, mas ainda sentia seu hálito ruim.

Entrou na cozinha, de onde ouvia uma música animada, algo como um hip-hop americano (2)[2]. Denis só sabia o refrão que repetia “beautiful” o tempo todo e não se importava em não saber o restante da letra e cantarolava errado junto com o cantor, mexendo o corpo de um lado para o outro.

Denis também estava de bermuda, mas na cor creme, chinelos, uma camiseta vermelha regata, de malha fria e avental. Caio riu e sua presença foi notada.

— Ô, campeão! Você parece ótimo.

— É. A injeção fez mesmo efeito e o banho ajudou também — ele respondeu um tanto rouco.

Denis largou os utensílios que estava usando para virar os filés na grelha e limpou a mão no avental. Aproximou-se de Caio, segurando o rosto dele com ambas as mãos, algo que fez o adolescente se sobressaltar.

— Abre bem a boca e diga “a” — Denis pediu.

Entendendo a intenção do vizinho — analisar sua inflamação na garganta — Caio obedeceu, mesmo que com vergonha, por ter que fazer Denis aspirar seu hálito fedorento.

— É, está melhor.

Fechou a boca rapidamente e ainda a tampou com uma das mãos.

— Desculpe.

— Pelo quê?

— Meu hálito está fendendo.

— Sério? Só senti cheiro de enxaguante. E, olha, você é o doente mais preocupado com a higiene que conheci. Além disso, você parece cuidar bem dos seus dentes, eles são perfeitos. Fiquei admirado agora. Parabéns.

Caio ficou constrangido com o elogio repentino, mas contente. Ele sempre fora elogiado pelos dentistas, mas o elogio do vizinho pareceu ter um peso diferente.

— Será que você vai aguentar comer meu filé de frango com molho branco?

Mas foi o estômago de Caio que respondeu, roncando com o cheiro bom que vinha das panelas.

— Desculpe. Mas acho que comeria até pedras com a fome que estou.

Denis riu.  

— Está certo. Também, está tarde, é quase duas horas e você não come direito desde ontem. Com certeza está faminto. Vou servir a mesa para gente comer. Se quiser esperar sentado. Você precisa se alimentar bem para tomar os remédios.

— Eu posso ajudar colocando os pratos?

— Você está bem mesmo?

— Posso fazer isso tranquilamente.

— Certo. Então, estão naquelas prateleiras ali.

Mesmo com a garganta dolorida, Caio conseguiu saborear o filé com creme branco e arroz com legumes feitos por Denis. Estava tudo macio, bem temperado e cozido, não foi difícil.

— Não imaginei que homens podiam cozinhar tão bem — ele concluiu ao terminar o terceiro prato. — Comi três vezes.

Denis riu.

— Você está em fase de crescimento, tem que comer bem mesmo. E homens cozinham muitas vezes melhores que as mulheres, os maiores chefes de cozinha são homens, Caio. Sou eu quem cozinho sempre aqui em casa, a Mariana não sabe fritar um ovo sequer.

— A minha mãe não cozinha tão bem assim. Mas não diga que falei isso, por favor.

— Será nosso segredo — ele piscou um dos olhos.

— Se não fosse dentista, poderia investir em um restaurante.

Ele riu novamente.

— Eu pensei em ser gourmet, sabia? Mas meus pais me convenceram do contrário ao dizerem que cozinheiro trabalhava muito e o ganho não compensava o esforço. Não tenho tanta certeza disso hoje em dia, pois eu sou dentista e também trabalho muito e o ganho parece não compensar o trabalho. Mas quando a gente é jovem é facilmente influenciado pela opinião dos mais velhos, não é verdade?

Caio baixou a cabeça e resmungou um “sim” baixinho. Aquela parecia ter sido uma indireta bem direta para ele.

Denis também percebeu que estava falando demais e se levantou.

— Quer sobremesa? — ao perceber Caio relutante Denis explicou o que era. — É pudim com calda de morango, está morninho ainda.

A boca de Caio se encheu de água.

— Acho que vou aceitar.

— Você não vai se arrepender. Sobremesas são minhas especialidades! Adoro doces. Vou lavar os pratos e já sirvo pra gente. Espera na sala, liga a televisão, pode colocar em algum programa que queira. Também tenho alguns DVDs de séries e filmes nas repartições da raque onde está a televisão, pode ficar a vontade.

— Não quer ajuda com a louça?

— Caio, você é visita e está doente. Relaxa, vai. Eu cuido disso em um piscar de olhos.

E novamente Denis deu aquela piscadela para Caio.

O adolescente moveu-se para sala sentindo-se invadido por sensações boas, estava satisfeito por ter comido bem e o corpo não estar mais tão dolorido. Achara a casa dos vizinhos grande, limpa, clara e agradável. Denis era gentil e atencioso, conversava bem e de forma espontânea.

Caio nem queria se recordar que deveria estar no retiro, rodeado das mesmas pessoas, ouvindo as mesmas conversas monótonas. Que Deus o perdoasse, não estava reclamando dos momentos de orações e aclamações.

Lembrou-se também que era dia 25. Era Natal. Pensou em mandar uma mensagem para Fernanda e falar com Cassiano. Porém, não fazia ideia de onde estava seu celular e não queria procurá-lo no momento.

Todavia, todas suas anotações mentais do que precisava fazer se dissiparam com a entrada de Denis e as duas porções generosas de pudim que ele trazia em mãos.

O vizinho entregou um recipiente de vidro com a colherzinha e pode notar que o doce estava tão bonito que brilhava. 

— Parece muito bom.

— Modesta parte, está sim. — Denis olhou a televisão desligada. — Você não procurou nada para ver ainda?

— Ah, pois é. Não sei o que assistir.

— Você gosta de animes?

— Animes? Não assisto muitos.

— E videogame?

Caio negou com a cabeça.

— Ah, é. Eu esqueço que você é evangélico.

— Mas não me importo de ver o que queira ver.

— Se é assim. Eu vou colocar um anime que eu gosto para você ver. Mas, antes, experimente o doce. Vou pegar o DVD lá em cima, acho que deixei na biblioteca. Tenho que pegar seus remédios também.

— Tá — Caio experimentou um colherzinha do doce e ficou admirado o quanto estava bom.

Denis retornou com um DVD e uma sacola plástica com os remédios de Caio. Primeiro ele ligou a televisão e colocou o anime. Depois se voltou para Caio.

— Terminou? — perguntou, observando o recipiente vazio.  

— É que estava tão bom que não consegui parar de comer.

— Vou pegar mais pra você.

— Não precisa.

— Claro que precisa. Um pedaço nunca é suficiente. Faz assim, fica com o meu e eu pego outro para mim. 

— Vou aceitar então, obrigado.

— Bom menino — Denis esfarelou os cabelos de Caio e foi para cozinha.

O anime começou a rodar e quando as falas em japonês começaram junto com uma legenda Caio se lembrou que os pastores da sua igreja falaram certa vez que as animações japonesas, que estavam em moda, continham mensagens demoníacas sublimares.

Sempre achou aquela conversa estranha, eram desenhos, como desenhos poderiam fazer algo tão ruim? Lembrou-se que Cassiano também gostava um pouco daquele tipo de animação, as mais voltadas para os videogames, com muita ação, lutas e personagens femininas com muito peito e pouca roupa. Era bem do feitio do amigo. Mas não parecia ser do Denis, achou engraçado um adulto como ele ainda gostar daquelas coisas.

O vizinho retornou da cozinha com o que parecia a mesma vasilha aonde tinha comido seu doce. Ele também trouxera um copo de água dizendo que era para que ele tomasse os remédios após a sobremesa.

Depois disso Denis acomodou ao seu lado. Caio se sentiu um pouco envergonhado ao pensar que ele estava comendo com a mesma colherzinha que ele havia posto na boca.

— E aí, o que está achando do anime?

— Não estou entendendo nada — foi sincero.

O vizinho riu divertido.

Mas era a verdade, a única coisa que Caio havia entendido até aquele instante era que aquele desenho não parecia ser do tipo que o amigo Cassiano gostava, pois o enredo retratava os próprios jovens japoneses, universitários, que gostavam daquele tipo de cultura (animes, mangás e jogos) e que de alguma forma eram descriminados pelas pessoas comuns (que não gostam desse tipo de cultura) dentro do próprio país.

— Genshiken(3)[3] é meio antigo, mas é um dos meus favoritos — Denis comentou empolgado e foi explicando para Caio algumas coisas que ele não entendia conforme os capítulos iam transcorrendo.

Até ao ponto que a história começou a ficar divertida, havia uma garota comum gostando de um dos meninos nomeados de “otaktus” e mesmo tendo preconceito pelo grupo ela estava procurando vencer sua aversão para ficar com o rapaz que gostava.

Após assistirem os primeiros quatro episódios, Denis pausou a série para fazer um lanche para os dois e aproveitou para preparar a segunda dose da injeção para Caio.

— Desculpa companheiro, mas parece que sua receita diz que a aplicação é de oito em oito horas. Está na hora — Denis mostrou a injeção pronta. 

— Sim, tudo bem — Caio concordou prontamente, abrindo o calção e virando de bruços.

Denis prendeu a respiração nesse momento. Não devido ao fato de ter que aplicar a injeção, era acostumado fazê-lo quando aplicava anestesia na boca dos seus pacientes, o fato é que seria o Caio.

Fazia alguns meses que deixara de negar ou fingir que vinha sentindo atração pelo filho único dos seus vizinhos.

No começo da sua descoberta, lutou muito contra aquilo, descobrir que sentia atração por homens depois de alguns anos de casado fora abominável suficiente para abalar suas estruturas emocionais por anos.

Mas quando aceitou que aquilo era da sua natureza decidiu deixar a igreja e dar fim no casamento, mas não esperava que Mariana fosse fazer um drama tão desestruturado ao ponto de ameaçar tirar a própria vida caso pedisse o divórcio. Ela implorou para que ficasse, dizendo que o aceitaria mesmo longe da igreja. Então, tentou explicar que não era apenas a igreja, mas havia a atração que sentia pelo sexo oposto e que talvez não conseguisse mais se deitar com ela.

Surpreendeu-se mais ainda quando a mulher afirmou que o aceitava mesmo naquela condição. E que se ela continuasse orando Deus proveria a cura.

Desde então, seu casamento se tornou uma mera fachada. Dormiam juntos uma vez ou outra quando ela insistia muito, mas prazer de verdade só sentia na cama com outros homens.

— Vou baixar um pouco sua roupa íntima, Caio — Denis avisou ao adolescente.

— Hm — o menino concordou.

Mas desde que a atração por Caio surgiu vem notando que suas necessidades estavam piorando. O adolescente parecia olhá-lo com certo deslumbre, encanto, algo que mexia com seus instintos, com sua vaidade e principalmente a libido, fazendo-o desejá-lo de uma forma despudorada.

Alisou a região onde aplicaria a injeção com delicadeza, a massageando em círculos, depois segurou a pele e introduziu a agulha com cuidado. Sentindo com aquela simples ação uma palpitação desmedida.

A mão de Denis era mesmo preparada, Caio não sentiu absolutamente nenhuma dor, apenas uma picadinha muito discreta.

— Está pronto — o vizinho avisou e Caio subiu sua roupa.

— Está me dando sono de novo — Caio avisou, sentindo o efeito da comida e dos remédios.

— Quer subir para o quarto?

— Posso ficar aqui mesmo se não se importar, queria continuar assistindo o desenho.

— Claro que pode ficar, vem cá — Denis sentou no sofá novamente e bateu a mão em seu colo. — Coloca a cabeça aqui.

Sem pensar muito, Caio obedeceu e repousou a cabeça no colo de Denis, recebendo um cafuné gostoso nos cabelos.

— O toque da sua mão é tão agradável — Caio confessou de um jeito inocente, o rosto virado para cima, os olhos fixos na barba rala que se formava no queixo de Denis.

— Não diga isso, Caio — Denis pediu em um sussurro, sentindo um forte tremor abalá-lo. — Não me olhe assim também, vai querer me fazer tocá-lo ainda mais e está ficando difícil me conter.

— Eu não entendi.

Denis olhou o adolescente com a cabeça em seu colo e não medindo muito sua atitude: inclinou a cabeça e depositou um beijo sobre os lábios macios de Caio.

O beijo foi um mero selinho, logo se afastou para encarar a reação dele.

— Entende isso?

Não houve reação. Caio estava com os olhos arregalados, confuso, era até mesmo capaz de ouvir o coração dele batendo alto.

— Caio?

— Denis?

— Perdoe-me pelo abuso e pelo que vou te falar agora. Mas antes de qualquer coisa quero que saiba: a gente não manda nos nossos sentimentos. Eles acontecem, explodem, tomam conta do nosso corpo e da nossa mente e passamos a viver somente em função deles. Eu sou gay, Caio. Meu casamento acabou faz muito tempo. A Mari não quis me dar o divórcio e concordamos em continuarmos vivendo um casamento de fachada. Mas eu gosto mesmo é de pessoas do mesmo sexo. E desde que te conheci não consigo te tirar da minha cabeça. Seu jeito meigo, doce, seu sorriso, seus olhos, seu corpo, sua expressão, tudo me hipnotiza. Eu estou trêmulo agora — expôs a mão que tremia para ele. — Você faz ideia como é deixar um adulto nesse estado?

— Eu acho que não — Caio confessou.

— Pois é. Mas eu estou loucamente apaixonado por você, Caio. Loucamente apaixonado. Perdoe-me, por favor?   

Caio fechou os olhos após ouvir aquela declaração, havia sido palavras tão sinceras que mexeram completamente com suas estruturas. Respirou devagar, comparando a reação daquele momento com a que tivera com Fernanda.

Concluiu, enquanto sentia o coração desesperado no peito, que o que sentia naquele momento com Denis era muito mais intenso, profundo e verdadeiro.

Ergueu sua mão e tocou o rosto dele e o adulto entendeu o toque como um convite para se aproximar novamente.

— Devemos perdão somente a Deus — Caio respondeu.

— Então, peço perdão, meu Deus, por amar meu irmão dessa forma tão imprópria.

Caio sorriu e assentiu com um menear de cabeça.

— Peço perdão também, Deus, por pecar e querer muito, aceitar esse amor.

A resposta de Caio fez Denis explodir em excitação. O homem o apanhou no colo e o depositou devagar no tapete, onde tinha espaço para os dois, então o abraçou e o beijou.

Continua...

 

[1] Rehab (Rihanna feat. Justin Timberlake)

[2] Beautiful – Akon ft. Colby O'Donis, Kardinal Offishall

[3] Genshiken é uma série de mangá criado por Kio Shimoku e trata sobre um clube universitário para otakus e sobre o estilo de vida de seus membros. O título é a abreviação no nome oficial do clube: “Gendai Shikaku Bunka Kenkyuukai" ou "Sociedade para Estudo da Cultura Moderna Visualmente Dirigida". A série também foi adaptada para um anime dirigido por Tsutomu Mizushima. O mangá foi serializado originalmente na antologia de mangás da revista mensal Afternoon da editora japonesa Kodansha de Junho de 2002 até Junho de 2006, e foi reimpresso em tankoubon. O nono e último volume foi lançado no Japão em Dezembro de 2006 (Fonte: Wikipédia).


Notas Finais


Já sabem, se puder, comentem! o/


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