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História Candor Lunar: Livro 2 - Alice e Jasper


Escrita por: Earendil

Notas do Autor


Olá, meu povo!

Aproveitando que hoje é dia dos Namorados (parabéns a todos que tem algum parzinho), vou postar o capítulo que contém alguns reencontros amorosos aguardados desde o final do livo 1.

Ademais, peço desculpas, este capítulo ficou maior que o previsto e teve de ser fragmentado, tava já em 50 páginas no word e eu tive que quebrá-lo ao meio e isso por si só pode gerar algum estranhamento na hora de ler... mas infelizmente teve de ser feito.
Espero que tenha ficado bom ainda assim.

Boa Leitura a todos.
Ang.

Capítulo 35 - Alice e Jasper


Fanfic / Fanfiction Candor Lunar: Livro 2 - Alice e Jasper

 

Ele se moveu rápido como os ventos de um furacão.

Os que lhe ensinaram a guerrear, séculos atrás, deixaram claro o lema primordial de todas as batalhas: golpeie, golpei novamente e torne a golpear e nunca permita que seu oponente erga-se para enfrentá-lo. Esta era a síncope perfeita de como se manter vivo numa batalha, se quiser sobreviver a uma luta, mate primeiro... ou morra.

Nascera sob a Pax Romana, durante o Governo de Augusto César lá pelas idas de 50 a.C. Com dezessete anos ingressou nas Legiões Pia como soldado e durante oito anos saboreou uma paz que servia apenas de fachada para as atrocidades cometidas pelos romanos sobre seu próprio povo. Seu pai era um patrício chamado Galenonius e lhe dera o nome de Matheu.

E aos poucos, apesar do orgulho de ser um romano e um legionário, Matheu descobrira que a Pax Romana não era o que deveria ser. Fora de Roma, nos povos dominados e chamados de escravos, muito pouco se fazia além do saque, da matança e do roubo. Casas eram transformadas em ruínas, os jovens eram recrutados para a construção das estradas e seus corpos eram sepultados nas florestas quando trabalhavam até a exaustão, mulheres eram violadas, cobrava-se impostos abusivos das propriedades e as colheitas eram recolhidas como forma de tributo na base de insultos e espancamentos.

Foi em um destes casos, numa pequena vila galesa que Matheu revoltou-se contra seus próprios companheiros legionários. Houve um destacamento de sete soldados para colher impostos de uma pequena comunidade camponesa, mas o que era para ser apenas uma tarefa simples tornou-se algo aterrorizante quando os soldados espancaram um jovem agricultor e começaram a estuprar sua esposa quando o homem insistiu que não tinha todo o dinheiro para o tributo.

Matheu tentou impedi-los, ele não alistara-se nas Legiões para aquilo, lutou contra os próprios companheiros e matou três deles, porém os outros quatro deixaram-no à beira da morte em uma estrada poeirenta. Mesmo com a espinha partida, Matheu arrastou-se até um córrego que murmurava ali perto para tentar aliviar sua sede, e ali, à beira do rio, deixou-se caído para morrer. Mas não morreu.

Ao contrário, foi encontrado por um General que há muito já deveria ter morrido. Flávius Aurélius fora o pretor das Legiões Felix que estabilizaram o governo da Pax Romana de Agusto César havia quase quarenta anos, e este mesmo general cujo nome e reputação eram quase tão grandes quanto a do próprio césar, deveria estar morto há décadas. Porém, ali estava ele olhando para Matheu com olhos inescrutáveis.

- Eu sei o que aconteceu – dissera-lhe Flávius Aurélius – Tens honra meu pequeno soldado, honra como não existe mais neste Império onde tudo é regido pela volúpia e pela ambição de poucos sobre muitos. Você está preparado para morrer?

- É o meu destino – respondera Matheu – Eu lutei e agora vou morrer... é a sina do soldado.

- E se eu lhe oferecer uma vida eterna de glória e guerras? Venha servir a mim e à minha Legião Felix imortal.

Àquela época já era Flávius Aurélius uma criatura de Marcus Volturi e comandava um exército imortal de vampiros com planos paralelos ao de Roma e do Imperador. Matheu acabou se tornando Centurião, comandante de sua Legião, que eram conhecidos como Mercadores da Morte. Durante séculos aos Três serviu sob o comando de Flávius Aurélius e só deixou de ser um Mercador da Morte quando conheceu Arian e pela amizade entre eles abandonou o General e foi viver em Volterra atrás de aventuras e batalhas sem fim com o amigo que considerava um irmão de armas.

Mas Arian foi aprisionado por se apaixonar pela Rainha e Matheu tornou-se um refém dos Reis sendo reduzido a um mero cavaleiro guardião de um portão inútil, o guerreiro milenar outrora romano tornara-se um mero serviçal por lealdade a duas pessoas que amava... por vezes pensou em partir ou simplesmente provocar os reis e morrer em batalha, não tinha mais motivos para viver uma vida daquelas, eternamente aprisionado em um castelo de gente morta.

Ao menos até ela aparecer.

Matheu havia apaixonado-se apenas uma única vez em seus mais de dois mil anos de vida, chamava-se Venilia e tinha o perfume das ondas do mar. Ele contava vinte anos na época e ela dezessete, Venilia tinha os cabelos negros como as madrugadas de inverno e os olhos brilhantes e curiosos, era linda tanto quanto uma deusa encarnada em forma humana poderia parecer. Matheu demorou oito meses para conquistá-la e planejava se casar assim que voltasse da campanha do sul que, infelizmente, culminou com sua morte.

Na forma imortal, Matheu procurou Venilia mesmo contra os conselhos de seu mestre Flávius, o general avisou que ele agora não poderia mais proporcionar o amor à Vanilia e que provavelmente colocaria a vida da moça em perigo... e ele estava certo. Venilia quase enlouqueceu ao ver Matheu a sua frente, ela havia passado meses chorando sua morte e ao contemplá-lo branco como um cadáver pensou que tivesse sido acometida por algum mal da loucura pelo pesar. No fim, vendo o sofrimento de sua amada, Matheu partiu... e jamais em dois milênios tornou a entregar seu coração novamente a qualquer mulher.

Até conhecer Alice Cullen.

A paixão, Matheu sabia, era avassaladora e mesmo querendo ficar com Alice de um jeito ou de outro, sabia que o coração da princesa vampira estava coberto de pesar pela morte do marido, mas Matheu decidiu esperar por ela, ele tinha a eternidade para isso. Mas agora que Jasper surgiu no horizonte ele havia perdido todas as esperanças de ficar com sua amada... para ele morrer seria uma boa solução, um bom fim. Morto ele não sofreria mais por amor ou por qualquer outra dor que vinha assombrando seu coração valoroso, entretanto, era justamente este amor, justamente a possibilidade mesmo que remota de ficar com Alice que o manteve vivo.

 

Sua velocidade furiosa o impulsionou para cima de seus inimigos, no meio do caminho Matheu saltou erguendo totalmente o corpo no ar e atingiu com seus dois pés o peito de um dos guardas, o impacto ribombou pelo jardim sagrado de Caius enquanto o vampiro era atirado contra a muralha há mais de duzentos metros de distância, o som de seu corpo se fragmentando pode ser ouvido por todo o grupo de atacantes.

Mas antes mesmo de pousar no chão, Matheu jogou seu braço para o lado e varreu com a haste da lança mais dois guardas cujo crânio ficaram rachados com a violência do golpe; e quando um dos vampiros pensou em reagir, Matheu socou-o com força repetidas vezes até que o rosto do guarda não passasse de uma cratera vazia emoldurando uma cabeça devastada.

- MATEM O DESGRAÇADO! - berrou o guada que liderava o grupo e que viera atrás de Alice.

Três guardas voaram para cima de Matheu, mas o cavaleiro jogou o corpo para trás e gingou para o lado evitando o golpe do trio, rápido como uma serpente, Matheu ergueu a lança e ferozmente traspassou dois vampiros de uma única vez. Sem largar a arma ele arremeteu contra o terceiro laçando a cabeça do guarda em uma abraço poderoso que apenas terminou quando a cabeça do inimigo separou-se do corpo. Soltando o cadáver ele girou o braço em arco contra os dois guardas presos à sua lança e arrancou a cabeça dos dois com um só golpe.

Com metade do número reduzido em questão de segundos, os outros vampiros mantiveram uma distância razoavelmente segura de Matheu, o cavaleiro permaneceu no centro, rodeado pelos guardas, seus olhos estavam sombrios e um sorriso maligno se desenhava em seu rosto.

- Há mil anos eu não tinha a chance de batalhar – falou ele para o grupo – Eu lhes agradeço por esta oportunidade, irmãos, mas se continuarem com esta loucura... serão todos mortos.

- Maldito cavaleiro – bufou o líder – Maldito Mercador da Morte, os reis tinham razão em mantê-lo na coleira debaixo daquele portão inútil. Você está traindo os Três ajudando aquela vampira, o marido dela está aqui causando um tumulto dos diabos.

- Que seja traição, eu não me importo, vivi durante quase um milênio como um maldito prisioneiro daqueles Reis caquéticos. Eu lhes avisarei apenas uma última vez, deixem-me passar ou perecerão.

Mas os guardas tinha mais medo dos reis do que do cavaleiro e mesmo sabendo que seriam destruídos preferiam mil vezes isso do que o castigo de seus mestres.

Os dois primeiros investiram contra Matheu seguindo um de cada lado tentando distraí-lo e evitar a defesa nas duas frentes, mas o cavaleiro adiantou-se para o que estava a sua direita e veloz como um relâmpago agarrou o vampiro pela garganta atirando-o contra o grupo que permaneceu parado, e antes que o guarda que atacava do lado esquerdo pudesse chegar perto, Matheu ergueu a lança cravando-a no peito do vampiro. Com força o cavaleiro puxou o cabo trazendo o guarda para perto de si decapitando-o em seguida.

- Façam o que quiserem – gritou o vampiro que Matheu atirara sobre os outros, o guarda levantou-se com dificuldade e já caminhava para o lado contrário de onde ocorria a luta – Eu vou embora, não estou com vontade de morrer hoje.

Os outros vampiros seguiram o companheiro ferido deixando apenas o líder deles para trás que encarou Matheu com uma fúria fria e lancinante.

- Você pagará por isso, Cavaleiro do Portão Leste – disse ele cuspindo as palavras enquanto também se afastava – Os Reis saberão de sua traição.

Mas Matheu não se importava com, ele havia sido condenado no momento em que perdeu seu coração para sua Princesa Alice, o cavaleiro permaneceu ali parado enquanto observava os guardas se afastarem dele, estava na hora de ir de encontro ao seu destino... já que o irmão de Alice, Edward Cullen, havia conseguido libertá-la, será que haveria a possibilidade de ele conseguir abrir mais celas?

Mas a resposta de Matheu não tardou. Enquanto o Cavaleiro atravessava o Jardim do Bem e do Mal, um tremor abalou as estruturas de Volterra... um ronco subiu pelos céus e as muralhas tremeram. As torres da ala Leste balançaram e duas delas ruíram sob o efeito daquela onda de força, telhas deslocaram-se e caíram dos telhados como uma cascata, vidraças estilhaçaram-se espalhando cacos brilhantes por todos os lados; o chão do pátio tremeu e pedras alicerçadas há milênios foram atiradas para o alto.

Matheu encarou horrorizado o Lago Espelho do Jardim de Caius tremer... ele sabia que nada era capaz de perturbar a tranquilidade da água, nem mesmo o vento tinha força para criar qualquer crispação naquela superfície espalhada.

Nenhuma força a não ser uma.

- Arian – murmurou Matheu consigo mesmo em completa estupefação – Você está livre! Que os céus nos protejam...

*****************

Seu olho direito estava arruinado, a pedra deveria pesar facilmente trezentos quilos e ele não a vira chegar, o bloco recordado de forma retangular para servir de piso do pátio o atingiu no rosto com a força de uma explosão nuclear. Sua cabeça automaticamente rodou e sua visão escureceu, ele perdeu o equilíbrio e sentiu quando um braço forte o impediu de cair no chão.

- Jacob – berrou Garret acima dele – Impeça-os.

Houve um rugido poderoso e o som de corpos sendo rasgados por garras e presas afiadas como navalhas. Uma cabeça apareceu em sua frente, no início estava escurecida e desfocada, mas poucos segundos depois o rosto de Carlisle formou-se e uma expressão preocupada encarava-o.

- Jasper – perguntou Carlisle – Você está bem?

- Acho que sim, o que foi que aconteceu? - perguntou ele atordoado.

- CUIDADO – gritou Vrau Urban empurrando os dois enquanto mais um bloco de rocha espatifava-se conta a parede atrás deles.

- Como não conseguiam se aproximar devido à barreira que criou com seu poder, os guardas estão arrancando os blocos de pedra do pátio e atirando contra nós – explicou Garret.

- Seremos aniquilados! - desesperou-se Vrau Urban quando mais três blocos espatifaram-se perto de onde ele estava.

- Bastardos espertos – riu Jasper – Eles me atingiram justamente para eu não usar o meu poder.

Os vampiros tentaram aproveitar a brecha com o desligamento da barreira de Jasper, mas Jacob Black despedaçava-os assim que tentavam se aproxima e a fúria do lobo foi momentaneamente suficiente para impedir que os guardas se aproximassem tanto. Mas mesmo Jacob não seria capaz de mantê-los incólumes por muito tempo.

- Temos que sair daqui – disse Jasper levemente desequilibrado – Jacob, recue.

A muito custo Jasper conseguiu novamente se concentrar e erguer sua barreira, no momento em que os guardas perceberam isso a saraivada de pedras recomeçou, com a força dos vampiros impulsionando-as, aquelas pedras retangulares tinham a força de dinamites explodindo por todos os lados. Lascas de rocha voavam, parecia que as paredes estavam sendo dissolvidas sobre eles.

Estavam encurralados e não conseguiriam se esquivar durante muito tempo daquele fuzilamento rochoso.

******************

Alice corria desesperada por entre os corredores do palácio, ouvia ao longe a luta reverberando como uma tempestade presa dentro de Volterra, gritos ecoavam assim como o som de corpos sendo despedaçados... ela acelerou ainda mais para tentar chegar onde a luta acontecia.

Enquanto corria, a pequena Alice sentia seu coração desestabilizado. Uma parte dela queria seguir em frente para juntar-se a Jasper e a outra parte queria voltar para junto de Matheu, mas, entretanto, sua mente estava clara e seu corpo obedeceu-a... continuando a correr para tentar ajudar sua família antes que tudo terminasse de uma forma ainda mais trágica do que começara.

Ela pensou em Jasper e foi como se um filme passasse em sua mente... ela se recordou de toda a sua vida e de como encontrou pela primeira vez o amor.

 

Era início da década de 40 e tudo era mais lento e de alguma forma... apaixonante.

Alice caminhava sozinha já há alguns anos, aprendera a se virar sem a ajuda de ninguém quando descobriu que poderia ganhar algumas apostas desde que se concentrasse nos resultados... ela adorava corrida de cavalos. Juntou sozinha uma pequena fortuna e com isso conseguia manter sua insaciável fome por vestidos de festa.

Maio já se estendia e a primavera coloria as ruas com flores delicadas, ela caminhava pela calçada com um vestido escandalosamente vermelho recheado de bolinhas pretas, um chapéu largo cobria sua cabeça de cabelos repicados e um sapato baixo estalava pelo calor do calçamento. O batom era tão vermelho quanto seu vestido e seus olhos dourados faiscavam como gotas de ouro líquido; o ocaso já cobria o mundo e as luzes da cidade estavam começando a acender-se enquanto o sol deitava-se no horizonte distante.

Quem olhava para ela se apaixonava... Alice sempre fora estupendamente linda. O porte de fada permitia que os homens a cada passada tocassem o chapéu que usavam como cumprimento por sua beleza, mas apesar do constante e insistente assédio, Alice até agora não conseguira se apaixonar por nem um homem sequer.

Sorrindo para o trânsito de carros barulhentos ela dobrou na esquita até entrar na floricultura que costumava frequentar há seis meses... era difícil encontrar boas floriculturas no centro de Nova York, mas Alice sempre conseguia comprar begônias frescas ali. Ao entrar uma campainha singela de sinos avisou de sua presença.

Um rapaz sardento com o cabelo desalinhado e com as mãos cheias de terra sorriu para ela de trás de um balcão recheado com pequenos vasos de flores.

- Senhorita Alice – disse ele com o sorriso mais absurdo da face da Terra – Em busca de suas flores semanais?

- Como vai, Jim? - respondeu Alice provocando o pobre mortal com um sorriso devastador – Sim, você as reservou para mim?

- Como sempre, aliás a senhorita não precisa vir aqui buscá-las, nós as entregamos em seu apartamento sem o menor problema.

- Eu gosto de caminhar, Jim... faz bem para clarear os meus pensamentos.

E com as flores nas mãos ela saiu desfilando pela cidade escura, mesmo há setenta anos atrás Nova York já era uma megalópole e as ruas ainda mantinham um fluxo contante de pessoas caminhando, porém, apesar de tudo, Alice gostava daquele ambiente de luzes e vozes, de pessoas e carros, de vitrines espalhafatosas e do cheiro do café nas panificadoras. Era estranho uma vampira se dar tão bem no meio dos humanos sem pensar em atacá-los, normalmente os de sua espécie vivam bem distantes de uma aglomerado tão grande de pessoas comuns, a sede poderia não permitir que se comportassem.

Mas Alice sempre foi estranha e isso explicava o fato de ela ter sido enviada a um manicômio... mas isso era passado e ela não gostava de se lembrar daquela estranha época em sua vida pouco antes de se tornar vampira. E a imortalidade caia bem a ela, por que reclamaria de ser eternamente jovem? Por que reclamaria de um dom que permitia que ela pudesse ver o futuro? Já há mais de vinte anos ela aproveitava esta vida... e estava muito feliz com isso.

Ou quase totalmente feliz.

Faltava algo em seu coração apesar de ela não conseguir saber o que era, mas sentia como se uma ausência se alojasse em seu coração imortal, como quando se entra num quarto vazio recheado apenas por eco e vento. Ela viva alegre e feliz em seu apartamento chique na 5ª Avenida, rodeada por vestidos e sapatos e colares, entretida com as modas da sociedade da época e cercada por jovens sedentos de sua companhia... mas aquele vazio estranho, aquele ocioso espaço em seu peito sempre estava ali como um peso morno que ela sentia sempre que se distraia.

Alice, mesmo sendo uma vampira extremamente jovem já havia percebido naquela época que a pior maldição dos vampiros era a impossibilidade de poder adormecer, ela passava as noites e madrugadas sentada na janela de seu quarto olhando a cidade faiscante suspirar de sono. E era justamente nestes momentos em que as indagações pareciam ecoar em sua mente... ela viveria para sempre sozinha?

Mas geralmente quando o dia chega o sol espanta os fantasmas da noite, os medos de Alice sumiam assim que ela olhava pela janela e via o movimento das ruas, adorava quando chovia e podia sair de dia sem que sua pele resplandecente chamasse atenção de todos. E assim ela foi seguindo durante mais alguns anos até que finalmente, em uma festa de virada do ano na casa da filha de um político influente, ela percebeu o quanto estava sozinha.

O ano de 1947 chegaria ao fim dali a pouco mais de uma hora e 1948 não parecia estar trazendo a Alice uma perspectiva diferente para sua vida. Ela estava olhando os humanos confraternizando, o salão estava cheio de pessoas elegantes sorrindo uma para a outra, distantes de qualquer problema que o mundo lá fora pudesse lhes apresentar, comiam e bebiam sem que Alice pudesse acompanhá-los e foi aí que ela percebeu: ela era realmente diferente.

O que significava ser uma vampira no meio de tantos humanos? Ela não coparticipava da vida deles apesar de aparentar ser humana, mas mesmo tão perto Alice percebeu que estava infinitamente distante deles, distante de sua efêmera existência, e a solidão pareceu florescer ainda com mais força em seu peito. Ela tinha que partir... não adiantava mais fingir que era humana, ela queria uma família, mas não uma família fadada ao perecimento... Alice queria uma família imortal.

Para tanto deixou o calor daquele ambiente e se dirigiu até a sacada, o salão erguia-se no alto de um arranha-céu no coração de Nova York e ela subiu delicadamente no parapeito para respirar aquele ar puro e gelado da cidade. Flocos de neve desabavam do céu com uma leveza lenta e delicada, o fim do ano chegava sorrateiramente prometendo mistérios e sonhos, mas tudo o que Alice queria era encontrar um motivo para que seu coração silenciasse.

E como que um pedido atendido pelo fim do ano, Alice teve uma visão.

 

Ela viu uma casa gigantesca, com um pórtico descomunal e colunas gregas sustentado um teto altíssimo, depois a imagem correu por uma rua lateral branca de neve até uma esquina sem qualquer relevância, mas ali naquela esquina repousava um pequeno café com vidraças embaçadas e uma letreiro verde lumioso com um nome: Pop's. Dentro do café havia pessoas conversando animadamente, garçonetes servindo café e velhos no balcão esperando por um pedaço de torta de amoras; uma musiquinha lenta enchia o ambiente. No canto oposto à entrada, no lado onde o balcão estava deserto, sentava-se um jovem rapaz e em toda aquela imagem borrada, seu rosto foi a única coisa que Alice conseguiu definir com clareza.

E assim ela se apaixonou... por uma visão.

Quando saiu de seu transe ela ouviu que dentro do salão a contagem já estava quase terminando:

- 5, 4, 3, 2, 1... FELIZ ANO NOVO! - gritavam as vozes alegremente.

Alice voltou seu rosto para o salão e viu as pessoas beijando-se para saldar o ano novo e sorriu de leve, ela sabia agora que jamais tornaria a passar um ano novo sozinha, mas antes de fazer qualquer movimento um rapaz vestindo um terno preto e segurando uma taça de champanhe surgiu na porta olhando-a com espanto.

- Moça – chamou ele – O que pensa que esta fazendo? Há neve neste parapeito e você pode escorregar, sabe há quantos metros de altura nós estamos?

- Eu sei, sim. Venha cá, fofinho – chamou Alice e quando o rapaz se aproximou totalmente embasbacado com a beleza da vampira, ela se agachou no parapeito e laçou os braços ao redor do pescoço do rapaz dando-lhe um beijo estalado na boca – Você foi o primeiro e último humano que eu beijei e eu lhe desejo uma vida plena e cheia de alegria, mas agora eu irei atrás do meu verdadeiro amor. Adeus, lindinho.

E dito isso, Alice simplesmente levantou-se, virou-se e pulou da sacada para o chão, lá, há centenas de metros abaixo, desaparecendo na noite e em meio aos flocos de neve. O rapaz em questão chamava-se Oscar e seus amigos jamais acreditaram que ele havia beijado a garota mais linda do mundo poucos momentos antes de ela simplesmente se atirar do prédio, principalmente pelo fato de que nenhuma moça apareceu morta no outro dia estatelada no asfalto, eles associaram isso ao excesso de álcool do amigo. Mas apesar de tudo, o desejo de Alice deu muito certo, Oscar se tornou um brilhante advogado e casou-se com uma bonita garota chamada Silvia e com ela teve dois filhos; levou uma vida muito feliz e morreu aos noventa e dois anos, e até o momento de sua morte acreditava piamente que a moça linda e estranha no parapeito daquela virada de ano de 1947 era real... e estava tremendamente certo mesmo que apenas ele soubesse disso.

 

Alice conhecia aquela casa em seu sonho, não era uma casa, mas sim o Museu de Arte da Filadélfia que ela visitara pelo menos umas cinco vezes ao longo dos anos, e também conhecia aquela graciosa rua que vira em sua visão, era uma rua lateral à do Museu. Havia passado apenas três dias desde que tivera a visão e ela levara pouco mais de duas horas de carro de Nova York até a Filadélfia, chegando lá instalou-se num hotel luxuoso, tomou um banho de duas horas e aguardou até que a noite caísse para encontrar o rapaz de sua visão.

E a noite trouxe uma neve fina e dançante, Alice caminhava nervosa passando pelo museu fechado e escurecido e seguindo pela rua cheia de neve conforme sua visão, percorreu mais de cinco quadras até dar de cara, de repente, com um letreiro verde desbotado que piscava para a noite: Pop's. Era ali.

As vidraças grandes estavam embaçadas pelo frio assim como ela tinha previsto, havia sombras de pessoas lá dentro e ali, lindamente parada na neve, Alice respirou fundo, estava nervosa e prestes a dar meia volta e sair correndo, mas ali estava o amor de sua vida e ela não podia desistir, então entrou.

Estava quente ali dentro, aconchegante e acolhedor, um zum zum zum de vozes conversando mesclava-se ao som de uma música lenta, as garçonetes desfilavam para lá e para cá enchendo xícaras vazias com um café fumegante e cheiroso; Alice viu os velhos parados no balcão esperando a torta sair do forno e assim, lentamente, virou-se para o lado oposto da entrada, para o fundo do Café, onde o balcão terminava... e o encontrou.

Ele a olhava com olhos espantados.

Um rapaz bonito de cabelos cor de palha envelhecida encarava-a com os olhos rubros mais hipnotizantes que ela já vira, vestia botas velhas de caminhada, uma calça surrada e uma camisa preta por baixo de uma jaqueta marrom tão velha e marcada que parecia não ver água há anos, mas para Alice era o homem mais bem vestido e elegante do recinto... mesmo que aos outros clientes parecesse um mero vagabundo.

Ela notou que não se sentava ninguém perto dele, ele parecia emitir uma aura ameaçadora e hostil que afastava os humanos, e Alice sabia que o rapaz tinha percebido imediatamente que ela também era uma vampira, porém, não houve qualquer menção de hostilidade ou raiva, ele apenas estava completamente surpreso.

Com seu jeito de fada, desfilando elegantemente pelo café (e atraindo os olhares de todos), Alice caminhou até o rapaz e sentou-se ao seu lado enquanto ele parecia duas vezes mais desconcertado. Os homens balançaram a cabeça imaginando o que uma moça fina daquelas fazia ao lado de um vagabundo mal encarado, mas ela não lhes deu bola, lançou ao rapaz seu sorriso mais sedutor.

- Eu sou Mary Alice Brandon, mas pode me chamar apenas de Alice... e eu vim até aqui para ver você – disparou ela com seu jeito estapafúrdio.

- Perdão, senhorita... mas eu não estou entendendo... - começou ele assustado.

- Nós somos da mesma espécie... eu tenho um dom, sabia? - riu ela, sua voz entrando na mente dele como as águas de um rio caudaloso e quente – Eu vejo o futuro e você e eu estamos destinados a ficar juntos.

- Você está falando sério? - perguntou ele lançando a Alice o sorriso enviesado mais lindo que ela já vira.

- Como você se chama?

- Jasper Whitlock, madame.

- É um bonito nome.

- Não tanto quanto seus olhos – observou Jasper que de repente sentiu como se naquele Café só existissem ele e Alice – Olhos espantosamente dourados.

- Você ficaria melhor com olhos dourados – disse ele sorrindo.

- Talvez você possa me contar o segredo?

- Sim, é claro que conto.

- Este segredo e mais alguns? - perguntou Jasper lançando outro sorriso irônico pra ela.

- Bem, nós teremos tempo para isso, não é?

Eles conversaram até que finalmente as garçonetes vieram expulsá-los dali para fechar o Café, pelas ruas geladas Jasper e Alice passearam, ela com o braço enganchado no dele, explicando como comprava flores em Nova York e de como gostava quando a neve acumulava-se nas calçadas e as pessoas escorregavam no gelo. Conversaram até que chegaram à frente do bonito hotel onde Alice estava hospedada.

- É um bonito hotel, senhorita Brandon.

- Obrigada Major Whitlock, e onde o senhor está hospedado?

- Em lugar algum, madame, eu nunca me hospedo em lugar algum – respondeu ele com seu sorriso enviesado que fazia Alice prender a respiração.

- Um nômade – categorizou ela – Você não para em lugar algum, não é?

- Nunca tive motivo para isso antes, madame.

- Está usando seu poder em mim? - perguntou Alice de maneira travessa.

- Mas é claro que não, por que faria isso?

- É que não estou inclinada a permitir que você se vá...

- Não estou com vontade de ir.

- Sobe comigo, então? - perguntou ela olhando-o com atenção.

- Eu não deveria, mas mesmo que tentasse não conseguiria resistir – disse Jasper oferecendo o braço para Alice.

 

O gerente do hotel lançou ao casal o mesmo olhar que as pessoas do Café, mas afinal ele não podia ser culpado por isso, Jasper destoava de Alice completamente, um maltrapilho caminhando ao lado de uma princesa. Mas nem Alice ou Jasper se importaram com o olhar dos hóspedes grã-finos ou do gerente e subiram para o quarto dela como se ninguém mais no mundo existisse além dos dois.

Jasper olhou com interesse o quarto imenso com móveis elegantes e refinados, o cheiro floral de Alice se espalhava pelo ambiente, uma cama imensa de dossel convidava-o a se deitar, mas o que mais lhe chamou atenção foi a peculiar vampira parada à sua frente que lhe dissera que ficariam juntos para sempre.

- E o que faremos agora, madame? - perguntou Jasper levemente tenso.

- Eu e você faremos amor... - disse Alice num sussurro.

- E o que será que eu fiz de certo na minha vida para merecê-la?

- Não me interessa o que fez ou não fez, interessa que eu esperei por você todos estes anos e um vazio estranho que eu sentia no meu coração acabou de desaparecer – disse ela se aproximando dele.

- Eu estava apenas de passagem por esta cidade – falou Jasper hipnotizado pelo dourado dos olhos de Alice – Mas por alguma razão, alguma força desconhecida me trouxe para o centro e me fez entrar naquele Café, eu fiquei lá por duas horas até você aparecer e eu nem ao menos sabia o motivo de estar lá parado.

- Eu sei... você não sabe o nome desta força?

- Não, senhora.

- Chama-se destino, Jasper... destino.

E dito isso eles se beijaram e pouco depois fizeram amor em meio aos sedosos lençóis da cama, Alice amou Jasper pela primeira vez, Jasper fora sua primeira vez e talvez por isso tenha sido tão inesquecível... e Jasper descobriu ali, enquanto seu corpo e o de Alice estavam unidos, que finalmente a escuridão que o cercava havia se dissipado, ele encontrara sua luz, ou melhor, foi encontrado por uma luz. Alice o encontrara, o salvara.

 

E as lembranças fizeram com que Alice apenas acelerasse ainda mais sua velocidade já sobrenatural, os corredores ecoantes abriam-se para ela enquanto o som da luta continuava aumentando, amplificando-se... parecia uma guerra e não uma batalha.

Com pressa ela atirou-se contra a porta fechada que conduzia ao pátio central e de onde todas as alas confluíam, era ali que ela seguiria pelo caminho atá a ala oeste onde Jasper lutava, mas, obviamente, o azar parecia estar perseguindo-a de perto. No momento em que chegou ao pátio deu de cara com um grupo de guardas que a olharam espantados, rapidamente Alice se recompôs olhando-os com indiferença.

- Princesa Alice – chamou um dos guardas, era imenso como uma montanha, os braços tão grossos quanto o corpo de Alice – É um alívio saber que a senhora está bem.

- Sim, obrigada – respondeu Alice levemente surpresa.

- E para que a senhora permanece segura até que capturemos seu marido, terá de ficar sob nossa custódia – completou o guarda caminhando para ela.

Com duas passadas imensas o guarda estava sobre Alice e mesmo sendo ágil ela foi incapaz de fugir dele e seus golpes não pareceram sequer importuná-lo, o guarda agarrou-a pelo pescoço a mantendo longe do chão, os pés batendo inutilmente no ar.

- Agora, minha Princesa – disse o guarda com um sorriso cruel – Vamos ao encontro de seu marido.

 

************************

 

Jacob urrou de dor quando um bloco de rocha atingiu-o na lateral, o som de costelas quebrando pode ser ouvido a metros de distância, o lobo se deitou no chão para tentar impedir que lhe esmigalhassem o crânio, Garret correu para o lado dele e pulverizou um bloco de rocha com um murro antes que tocasse no lobo caído.

- A coisa está piorando – berrou Vrau Urban segurando o braço direito que pendia ferido depois que um dos pesados blocos de calçamento o atingira em cheio.

Jasper, não perdendo tempo, atravessou a barreira e rapidamente catou um de seus atacantes trazendo-o para perto de si, o vampiro ainda desferiu um golpe violento em Jasper que, sem a visão do olho direito, não conseguiu desviar, entretanto, ele não perdeu tempo em laçar a cabeça do guarda matando-o em seguida. Rapidamente Jasper recuou até encostar-se à parede que os encurralava, ele ergueu o cadáver do guarda ainda seguro nas mãos usando como escudo contra os blocos atirados sobre eles.

- Vamos, matem-nos e usem-nos como escudo – gritou Jasper para os companheiros.

O fator de cura dos lobos já havia dado conta de curar Jacob e suas costelas fraturadas, mas enquanto criatura gigantesca de quatro patas cobrir-se com o cadáver de um vampiro não seria uma coisa muito fácil, a única coisa que pode fazer foi esgueirar-se para uma singela reentrância na parede e se espremer até onde pode para se esconder dos tiros seu corpo volumoso. Apesar de ter conseguido uma cobertura razoável, parte dele ainda ficara exposta como alvo para os guardas e a todo momento lascas de rocha voavam e cravavam-se em sua carne ferindo-o aos poucos... mesmo sendo um guerreiro destemido, Jacob Black percebeu que estava em maus lençóis.

Garret, Carlisle e Vrau Urban tratam de imitar Jasper e arrancaram seus próprios guardas dentre a multidão para fazer escudos improvados com seus corpos sem vida, obviamente isso causou ainda mais furor entre os seus agressores e a cada novo arremesso eles sentiam os cadáveres em suas mãos se desfazendo com o impacto dos pesados blocos de rocha. Aqueles escudos também não durariam muito tempo.

- Aquele maldito ferreiro não disse que seriam apenas algumas dezenas de guardas? - berrou Garret furioso.

- Lotho só presta atenção às suas espadas, lanças e armaduras – respondeu Vrau Urban depois de desviar um bloco de pedra com o cadáver em suas mãos – Provavelmente ele ouviu esta contagem há décadas atrás e guardou em sua mente distraída, aquele velho ferreiro só tem olhos para metais, esperar que ele tivesse alguma informação segura seria muita sorte.

- Deve ter mais de três centenas de guardas aqui dentro – completou Carlisle – Na época em que morei aqui os guardas não passavam de duas centenas.

- Os reis são colecionadores ávidos – retorquiu Garret de mau humor.

Mas subitamente os ataques diminuíram e um burburinho se formou no fundo da formação dos guardas do palácio, eles pareciam estar conversando sobre algo e alguns até bradaram em altas vozes. De repente um dos guardas, grande como uma casa, ergueu-se sobre os outros e encarou os invasores como um gigante olha para insetos.

- Encurralados? - gritou ele rindo alto e uma onda risos seguiu-se ao dele – Vermes, pensam que podem invadir a Cidadela dos Vampiros totalmente ilesos? Eu vou lhes dar apenas um chance de rendição, aceitam?

- Venha até aqui perguntar pessoalmente seu maldito – retrucou Garret.

- Imaginei que não se renderiam – continuou o guarda – Bem, então teremos de negociar, façamos o seguinte: vocês se rendem e eu prometo não desmembrar esta linda mocinha aqui.

E dito isso ele ergueu o delicado corpo de Alice pelos pulsos para que os invasores pudessem dar uma boa olhada nela. Os guardas não pretendiam ferir Alice, não eram idiotas a ponto de se meter com a protegida de Marcus Volturi, mas os seus invasores não sabiam disso e ela se mostraria uma boa moeda de troca... ao menos esta era a teoria. A prática não seguiu bem este raciocínio.

Jasper e Alice se viram depois de muito tempo (um tempo que foi muito maior do que Jasper podia supor, mas isso ele iria descobrir mais tarde) e aquele olhar que trocaram foi o suficiente para que a exaustão de Jasper fosse dissipada. O rosto de Alice se encheu de medo ao ver seus amigos e seu marido rodeado por uma infinidade de guardas do castelo, ela temeu que fossem todos mortos caso eles se entregassem, Alice percebeu que Jasper estava ferido assim como todos os outros e se sentiu horrivelmente impotente para ajudá-los... ela não suportaria ver Jasper morrer na sua frente, não agora que conseguira novamente estar tão próxima dele.

Mas a visão de Alice presa causou um efeito em Jasper muito mais forte do que se poderia esperar, pensava-se que vê-la pudesse fazer com que a escuridão que geralmente o cercava se dissipasse um pouco, que as sombras em seu coração abrandassem... mas, entretanto, a fúria por vê-la ameaçada apenas serviu para aumentar ainda mais sua raiva.

O problema primordial foi que o sequestro de Alice libertou algo que estava há muito tempo aprisionado: o verdadeiro ser de Jasper. Durante todas décadas em que esteve com Alice junto aos Cullen, Jasper adormeceu sua essência no fundo de sua mente e tornou-se um vampiro mais tranquilo ou pelo menos mais determinado em não ser o que era antes. Mas com a ausência de Alice e tudo o que ele passou, algo dentro dele se quebrou. Como uma cela que se abre para libertar algo ruim, o coração de Jasper libertou o seu verdadeiro eu, aquele vampiro que viva para guerrear e matar, que não tinha sequer uma gota de piedade em sua alma corroída e que matara tantos vampiros e tantas pessoas ao longo de sua vida que já não se recordava mais do número exato de suas vítimas.

E ali a raiva dele explodiu, vendo sua esposa cativa uma segunda vez ele decidiu libertar toda a sua fúria, tudo o que estava represado dentro si foi liberado na forma de um grito de ódio seguido por uma onda de poder, seu dom espalhou-se por todas as direções como uma onda de choque atingindo o chão. Os guardas sentiram quando seus corpos foram empurrados por aquela onda e subitamente foram acometidos por um medo pavoroso que transbordou de seus corações fazendo com que suas pernas amolecessem como geleia.

Jasper, ultrapassando os limites de seu corpo, espalhou o seu dom de manipular as emoções muito além do que supunha ser capaz, os guardas começaram a debandar de medo correndo apavorados em todas as direções. Jasper atirou para longe o cadáver destruído do guarda que lhe servira como escudo e gritando investiu contra a horda que ainda persistia à sua frente.

- Sigam-me – gritou ele para os companheiros – Matem quantos destes malditos puderem!

O primeiro a se mover foi Jacob Black, furioso, feito uma montanha de presas e garras, espalhou guardas para todos os lados tentando abrir caminho até Alice, membros eram decepados por sua fúria, cabeças rolavam, rostos eram fatiados... e ele não parava. Os vampiros tentavam fugir , tentavam sair de perto daquele monstro em forma de lobo que ceifava suas vidas imortais com tanta facilidade, mas era inútil, paralisados de terror pela onda de Jasper todos caiam ante Jacob Black.

Garret, Carlisle e Vrau Urban tentaram acompanhar de perto Jasper, mas o vampiro simplesmente corria como um alucinado para onde Alice estava e no momento em que o guarda viu o que aconteceria, atirou-a para os braços do companheiro ordenando que a princesa fosse levada para dentro do palácio. Mas era tarde demais.

Quando os guardas entraram, Jasper já estava em seu encalço, o gigante que a pouco segurara Alice pelos pulsos jazia morto com metade do crânio despedaçado. Alice se livrou de um de seus captores e Jasper, furioso, devastou os outros três até que deles nada restasse além de pó; lá fora os outros guardas fugiam enquanto Jasper mantinha sua influência feroz, seus companheiros destruindo o que podiam antes de entrarem atrás deles para o interior do palácio.

E no meio de toda aquela carnificina, de toda aquela matança, Jasper parou para olhar sua esposa. Alice estava ali, tremendo de leve, vestida nas vestes da guarda Volturi, linda como os raios prateados do luar sobre o mar impassível; parecia que não se viam há séculos, como se nunca tivessem pertencido um ao outro, mas ainda assim, a mera presença de Alice pareceu causar um efeito calmante em Jasper.

O olhar assassino, a sede de sangue, a fúria... foram repentinamente represadas. Ele encarou o motivo de sua tranquilidade e por um segundo sentiu-se aliviado. Correra meio mundo para estar ao lado de Alice

E Alice, naquele momento, ou por um momento fugaz, viu a sombra da fúria perpassar os olhos de Jasper, viu o que ele era por dentro, aquilo que ela tentava esconder dela durante todos estes anos. A selvageria, a natureza bélica, a sede por sangue e morte estavam ali incrustadas nele tal qual o ouro enterrado fundo numa mina aos pés de uma montanha, poder-se-ia ocultar aquela raiva, mas a verdade é que estava ali... e Alice viu num vislumbre, viu as trevas em Jasper, mesmo o olhar dele tendo suavizado pouco depois.

- Alice – chamou ele parecendo não crer que ela estava ali.

- Jass – sussurrou Alice pouco antes de se atirar nos braços dele.

E Jasper a acolheu num abraço tão desesperado que parecia que jamais tornaria a permitir que Alice saísse de seu alcance, depois disso a beijou, beijou como se não a beijasse há séculos... a milênios, beijou-a como se jamais a tivesse beijado antes, beijou-a como quando a beijou pela primeira vez num hotel na Filadélfia enquanto a neve caía e cobria o mundo com uma colcha branca e gelada.

E para Alice foi como se sentir em casa pela primeira vez. Tudo era familiar a ela, os fortes braços de Jasper a segurando, o cheiro do vampiro mesclado a morte e viajem, os lábios ávidos dele pressionando os seus, até mesmo o corpo de Jasper servia para lembrá-la de uma excitação que há tempos não sentia. E isso tudo serviu para comprovar acima de qualquer coisa que ela pertencia a ele desde que encontrara-o em um café numa noite fria há muitas décadas atrás... o seu coração era familiar ao de Jasper, ele representava sua salvação, sua segurança e tudo nele fê-la sentir-se profundamente aliviada.

Finalmente uma parcela daquele mundo louco havia se colocado em seu lugar, eles estavam novamente juntos.

- Se você soubesse por onde andei para chegar até aqui – disse Jasper encarando-a com com olhos abrasivos e recheados de desejo.

- O importante é que você está aqui agora – tornou ela beijando-o apressadamente uma vez mais.

- E jamais tornarei a ficar longe novamente, madame – riu Jasper aquele riso enviesado que Alice adorava.

- Eu achei que estive morto – sussurrou Alice assustada como que pedindo desculpas – Eles me disseram que estava morto... eu não sabia o que fazer Jasper, não sabia o que fazer. Foram tantos meses assim, sozinha.

- Eu estou aqui agora Alice, me perdoe por ter permitido que eles a levassem.

- Não foi sua culpa, a culpa sempre será deles - disse ela ainda no colo de Jasper e sem perder tempo beijou-o novamente sentindo sua paixão por Matheu distante.

Mas apesar do enlace apertado em que se encontravam, apesar de Jasper desejar jamais precisar deixar Alice longe de si novamente, um eco reverberou pela passagem do corredor quando o corpo de um guarda voou pelos ares espatifando-se em mil pedaços rochosos contra uma parede. Da porta escancarada entraram Garret, Carlisle, Vrau Urban e Jacob Black que ainda mantinha nas presas o braço de um inimigo.

- Pai! - gritou Alice desprendendo-se dos braços de Jasper e correndo para Carlisle que a recebeu num abraço apertado.

- Minha pequena Alice – disse Carlisle emocionado – Só o fato de tê-la visto já valeu parte desta viajem amaldiçoada. Você está bem?

- Sim, estou... e Esme?

- Ela ficou em casa... mas é uma história muito longa para ser contada agora, minha querida.

- É bom saber que está bem, Alice – disse Garret também abraçando a vampira.

- É bom vê-lo, Garret. E Kate?

- Permaneceu em Forks junto de Esme.

- Jacob Black, é muito bom ver novamente esta sua cara peluda – riu Alice passando a mão nos pelos densos e manchados de sangue do lobo.

- Alice, este é Vrau Urban – apresentou Carlisle – Ele é um aliado.

- Sua beleza em nada foi exagerada, Princesa Alice – disse Vrau Urban numa mesura – Ouvia falar ao longe das novas Princesas de Volterra, mas jamais imaginei que poderia ser tão bela.

- O prazer é meu – respondeu Alice levemente desconfiada.

Mas aquele encontro estava fadado a não se estender por muito mais tempo, vozes soaram pelo corredor em direção à sala onde se encontravam, momentaneamente um guarda surgiu no pórtico do corredor há uns cem metros de onde estavam, mas tornou a desaparecer logo em seguida.

- O que foi isso? - perguntou Garret.

- Ainda estou conseguindo mantê-los afastados com o meu poder – respondeu Jasper.

- Suas forças estão se esgotando – disse Carlisle – Alice, há algum lugar seguro por aqui?

- Talvez o Salão dos Tronos, os guardas são proibidos de entrar lá sem a autorização dos reis, talvez tenham mais medo de desobedecer uma ordem de Aro do que nos perseguir.

- Onde está Edward?

- Ele ficou nas catacumbas, parece que precisava libertar mais alguém...

- Miguel e Alexandrovish ainda não apareceram – apontou Vrau Urban – Fico me perguntando onde eles se enfiaram... e onde está Didi?

- Temos que tentar chegar ao Salão dos Tronos – disse Alice indo abraçar Jasper – Talvez seja o único lugar onde...

 

Mas o que quer que Alice fosse dizer, não disse. As palavras lhe foram roubadas quando um tremor roncou pelo chão fazendo o palácio tremer, janelas estilhaçaram-se ao redor deles e o som de coisas sendo jogadas no chão ecoou pela sala; o chão de pedra sofreu um abalo inacreditável fazendo com que o grupo perdesse o equilíbrio. Os guardas gritaram em horror, Volterra havia sido abalada por um terremoto de ira, todos foram capazes de sentir a intenção naquela onda de choque mortal, algo havia sido despertado... algo que não deveria estar acordado.

E enquanto o ronco do tremor ainda estremecia as torres de Volterra e as telhas despejavam-se do alto feito uma cascata estilhaçante, Jasper olhou assombrado para Carlisle enquanto tentava manter Alice segura em seus braços.

- O que foi isso? - perguntou ele confuso.

- Edward – sussurrou Carlisle olhando para fora das janelas fragmentadas – O que foi que você fez?

***********************

 

Era o mesmo que encarar uma tormenta.

Edward já presenciara furacões, colunas colossais de nuvens negras erguiam-se a alturas imensuráveis sobre as águas oceânicas impelindo seus ventos furiosos para cima do continente, a força de um furacão é algo elemental, criado pelas forças do mundo para açoitar os homens como castigo. Era impossível deter um furacão, a única chance era sair de seu caminho, fugir para bem longe a fim de evitar ser esmagado por seus braços aéreos e inclementes... mas diante da tormenta em pé à sua frente, Edward sabia que não teria como escapar.

Talvez fosse um de seus dons, contou Alec que Arian possuía vários dons especiais e que ele podia manejá-los e criá-los a seu bel prazer, naquele momento talvez fosse um dos poderes dele se manifestando... era impossível se mover. “O dom da Caça” pensou Edward, há muitos anos Carlisle contou-lhe uma história sobre os antigos vampiros que possuíam dons especiais que surgiam de acordo com a idade, quanto mais velho o vampiro, mais talentoso ele era, o dom da Caça era a capacidade de um vampiro neutralizar sua presa apenas com sua presença, como um ávido caçador da natureza o faz... alguns animais ao notarem a presença de um predador simplesmente paralisam de medo e são incapazes de correr para se salvar. Com o homem não era diferente, o primitivo instinto de autopreservação do ser humano era muito aguçado, muitos simplesmente ficam estáticos diante de um perigo e Edward Cullen sentia-se assim neste mesmo momento.

A voz de Arian ainda reverberava pelo salão.

- Estranhos... vocês me libertaram. E como prova de meu agradecimento... eu lhes darei uma morte rápida.

Edward tentou se mover e não conseguiu, nem ao mesmo conseguiu falar, ele queria argumentar com Arian para que ele lhes desse apenas um momento a fim de explicar quem eram e o que faziam ali, mas também sabia que talvez o argumento se mostrasse inútil. Arian avançou um passo pesado em direção a ele, Kaori e Charlotte, o imenso machado de guerra erguendo-se de sua mão blindada como o arauto da morte, não havia qualquer expressão no rosto de Arian, qualquer raiva ou impaciência, não havia emoção naquele rosto antigo e régio. Arian parecia um rei, um deus nórdico saído de algum deserto de gelo diretamente sobre eles. Uma tormenta.

“Arian Volturi” - Edward ouviu a voz mental de Kaori tocar também a sua mente, se a paralisia era obra de Arian, ele provavelmente não era capaz de bloquear aquele dom mental - “Se nos permitir permanecer vivos, há alguém aqui que lhe quer ver”.

Por um segundo, uma batida do coração de Seth e Giuliana, a Tormenta parou, não por pensar em acatar o pedido de Kaori, mas talvez levemente surpreso por ouvir aquele voz instrumental e leve diretamente em sua mente. Mas o segundo passou e Arian, gigante armado, deu o segundo passo em direção a eles e o seu machado continuava a erguer-se para dar fim aos estranhos à sua frente. Edward recordou-se de um dos adjetivos que o fantasma de Forje lhe atribuíra antes de Charlotte abrir sua cela: O Imparável. De fato, olhando Arian em toda a inconformidade de seus poderes e força, da sombra de realeza em seu olhar e da aura de poder que ele emanava, era impossível conceber a ideia de que qualquer outro ser no mundo fosse capaz de deter seu avanço.

Edward não era capaz e quando se percebeu disso apenas fechou os olhos sabendo que a morte não tardaria, a morte definitiva o espreitava na forma de um machado de lâmina dupla, em sua mente ele se despediu de Bella e de Renesmee, pediu perdão aos seus companheiros por ter libertado o que não devia ser livre e liberou um último suspiro enquanto sua mão procurava a de Kaori para lhe dar força antes que os dois fossem enviados ao mundo-de-lá.

Arian estava quase sobre eles e o machado erguido no ar quando, de repente, um movimento no fundo do salão foi ouvido e uma voz soou no salão ecoante, uma voz doce como a primavera, instrumental como as sinfonias dos pássaros no fim da tarde, delicada como a chuva sobre uma lagoa, calorosa como raios de sol batendo contra as folhas das árvores.

- Arian – chamou Bianca.

Edward abriu os olhos e viu que Bianca estava parada no limiar da luz do fogo encarando-os, sua voz estava carregada de emoção e seu rosto, talvez pela primeira vez, traíra completamente suas emoções. A perfeita face de Bianca estava assustada, nervosa ou temerosa... olhava Arian com ardor, uma mulher encarando o homem que amava no aguardo de um sinal de reciprocidade, sedenta por receber em seus braços aquele vampiro pelo qual foi aprisionada por mais de setecentos anos. No fim, Bianca parecia apenas uma menina assustada, delicada e pecaminosamente bela, seu porte de rainha e sua arrogância haviam sido deixados de lado, naquele momento tudo o que importava era Arian.

E Arian olhou para o lugar de onde partiu a voz e encontrou uma menina linda encarando-o com avidez, a expressão em seu rosto hirto não se modificou, seus olhos indiferentes e igualmente furiosos não fizeram qualquer menção de reconhecimento. O gigante não pareceu se importar com quem estava à sua frente.

- Arian? - chamou Bianca agora numa voz fraca e magoada, ela deu um passo em direção a ele – Sou eu... Bianca. Sua Bianca.

Foi assim que, depois de mais alguns segundos tormentosos, Arian piscou. Como se tivesse só naquele momento despertado ele encarou Bianca e seus olhos se estreitaram como se tentasse se certificar de que era realmente ela. Lentamente seu machado de batalha foi baixado e Arian se voltou para Bianca e finalmente uma expressão de total espanto se espalhou por seu rosto. O reconhecimento veio como um murro em seu estômago, ele quase não acreditou que ela realmente estava ali.

- Minha Rainha – chamou Arian em sua voz trovejante que ecoou pelo salão – Não pode ser...

 

Mas Bianca não esperou por mais nada, colocando de lado toda a sua arrogante elegância ela atravessou a distância que a separava de Arian com uma velocidade absurda e atirou-se nos braços do gigante que não fez esforço algum em lhe sustentar o peso morno. Bianca colheu o rosto de Arian em suas mãos e olhou em seus olhos como que para comprovar que ele a reconhecera, Kaori notou o quanto Bianca era pequena perto dele, parecia uma criança abraçando uma rochedo, o contraste era gritante... Arian era imenso, imóvel, inflexível enquanto Bianca era delicada, singela e elegante.

- Arian – ela disse agora completamente emocionada – Arian...

E ele não lhe tinha palavras para lhe dizer, por um momento os dois se encararam apenas, estudando os traços de cada um, percebendo que continuavam como sempre foram nas lembranças um do outro e que depois de quase mil anos não haviam se esquecido. O machado do gigante foi deixado de lado, escorado em sua perna, os braços agora se atarefavam apenas de manter Bianca em seu colo, enquanto ela cruzava as pernas ao redor de seu corpo como que para mantê-lo ali sem lhe dar a chance de largá-la de alguma maneira.

Aquela era uma saudade de mil anos.

- Eu temi – arfou Bianca – Temi que você não me amasse mais...

- Lembras o que lhe prometi naquela vez... na floresta? - perguntou Arian invocando lembranças que pertenciam apenas aos dois – Meu coração e minha alma são teus por toda a eternidade, minha Rainha, teus e de mais ninguém, e nem por um dia durante todos estes séculos eu passei sem lembrar-me de teus sorrisos e de tua voz. Amo-a como amei-te há setecentos anos.

E aqui foi o suficiente para Bianca, era provavelmente o que esperava ouvir desde que fora aprisionada e nada mais era necessário. Quando se beijaram fora um beijo que aguardara séculos para acontecer, o fervor, a paixão incandescente pareceu fortificar as chamas que queimavam no chão, era algo tão intenso e tão imensuravelmente potente que Kaori e Edward perceberam que o maior crime que Aro algum dia pode cometer foi separar Arian de Bianca. E o coração assustado de Edward por um momento ficou em paz, talvez no fim das contas ele não tivesse feito a coisa errada, talvez o fato de ter unido aqueles dois apaixonados fosse algo bom... algo que precisava ser feito.

E a pressão que havia sobre eles desapareceu no momento em que o ódio de Arian foi substituído pelo amor que sentia por Bianca, a que detém a Tormenta. Talvez em todo o mundo apenas ela tivesse o poder de pará-lo, de amainar seus ventos de tempestade, de aquietar sua fúria e de domar seu coração. O beijo profundo entre os dois era quase desesperado, Bianca agarrava-se a Arian como temesse tê-lo afastado dela novamente e depois de um tempo os lábios se desfizeram um do outro e a vampira olhou para o gigante e tudo o que restou ali era uma garota apaixonada.

- Ti amo, ti amo per sempre – sussurrou Bianca em italiano encostando o rosto no rosto de Arian.

- Per sempre, la mia Regina – respondeu Arian agora com a voz estrondosa nitidamente aliviada.

Longo foram os minutos em que os dois permaneceram ali, um nos braços do outro, sentindo-se depois de quase mil anos de espera, e só depois disso, Arian pousou Bianca novamente no chão e olhou para Edward e Kaori, seu rosto já não era indiferente, havia um leve espanto percorrendo seus olhos, algo que parecia deixá-lo um pouco mais homem e menos... deus.

- Libertaram minha Rainha – disse ele, a voz como um trovão do céu – Lhes devo mais do que poderia pagar, estranhos. Assim sendo vocês permanecerão com suas vidas intactas e terão para sempre a minha gratidão, mas o que fazem aqui no centro do mundo? Como puderam passar pelos Três Reis sentados nos três tronos?

- Eu sou Edward Cullen – respondeu Edward aproximando-se um passo e percebendo só então que Arian era pelo menos trinta centímetros mais alto – Vim até aqui com meus amigos para libertá-lo, Arian, e não vou mentir... vim precisamente para pedir emprestado o seu poder e a sua mágoa contra Volterra. Eu posso lhe contar minha história se quiser.

- Haverá tempo para histórias mais tarde – disse Arian – Depois que eu pôr a baixo este castelo, agora, entretanto, diga-me Edward Cullen, não sois apenas vós e estas mulheres que estão aqui nesta profundeza, eu sinto cheiro de sangue e de uma criatura bestial.

- Esta é Kaori Sayuri, minha aliada e aqui estão Seth Clearwater da tribo quileute da América e uma humana Giuliana cujo sangue lhe proporcionou a liberdade. Seth não é um lobisomem, mas um transmorfo, pertence a uma tribo de nativos que tem a capacidade de se metamorfosear em lobos gigantescos, e a menina que carrega nas costas é uma singela criança que prestou de bom grado o seu sangue para nossa causa e eu lhe prometi devolver em segurança à sua casa... pretendo manter esta promessa custe o que custar.

Seth saiu das escadarias e caminhou até onde a luz do fogo pudesse mostrá-lo por completo, Arian admirou-o com certo comedimento e literalmente prendeu a respiração quando olhou para Giuliana, mas de alguma forma não fez menção de atacar-lhe.

- Tens razão, não é um lobisomem, é um ser altivo demais para parecer um Filho da Lua. Quanto à menina, não te preocupes, se do sangue dela as celas foram abertas nada de mal lhe acontecerá, prometo-te.

- Além deles há Charlotte, filha de Salesiana... uma feiticeira de quem talvez você se recorde – continuou Edward.

- De fato, recordo-me – falou Arian – A filha de Forge, o vampiro-feiticerio e cria de Caius. Eu lhe vi algumas vezes na corte, uma sombra descabelada que não dizia palavra alguma e parecia sempre assustada.

- Meu pai fora uma cria de Caius – disse Charlotte que, apesar da tentativa de parecer destemida, estava visivelmente temerosa – Mas também fora traído pelos Três e morreu sepultado em uma destas celas para que o segredo das catacumbas permanecesse apenas com ele... foi uma sorte eu conhecer estes segredos ou mesmo você, poderoso como é, estaria ainda aprisionado.

- E há mais alguém aqui – Arian farejou o ar – Alguém familiar.

Depois disso o último integrante daquele estranho grupo deu um passo a frente e quando mostrou-se à luz tênue do fogo o rosto de Arian escureceu numa sombra de ingrato reconhecimento. Bianca já havia substituído a máscara de apaixonada por outra de Rainha e agora encarou a sombra que surgiu no salão com olhos arrogantes e vazios.

- Já faz muito tempo, velho amigo – disse Alec esboçando um sorriso triste.

- Sim, quase oitenta séculos, velho amigo – tornou o gigante com a expressão fechada – Então trouxestes estes estranhos aqui para libertar a mim e Bianca? Este é vosso pedido de desculpas pela traição que atiraste sobre mim, Bianca e Matheu?

- Oitenta séculos – repetiu Alec num murmúrio culposo – Muito tempo para pedir desculpas, a princípio não concordei com a ideia de Edward em libertá-lo, eu estava vindo a Volterra para matar minha irmã e me vingar ao menos em parte pela traição de Aro ao mandar me assassinar, mas agora penso que minha vinda aqui terá outro destino.

Alec aproximou-se de Arian e de Bianca e ajoelhou-se à frente deles, seu rosto trazia uma expressão tranquila e terrivelmente consciente do que fazia, como se o vampiro tivesse aceitado seu destino desde o momento em que concordara em descer às catacumbas para libertar seus antigos amigos.

- Faça o que tem de ser feito, velho amigo – disse Alec numa voz sincera – Eu estou aqui para pagar pelos meus pecados... por todos eles.

- Então sentiste tu também a mordida venosa de meu pai – Arian disse enquanto afastava delicadamente Bianca para o lado e pegava no machado de guerra – Se vieste aqui para receber tua punição eu não me recusarei a fazer-te a vontade, Alec. Quereis dizer algo antes do fim?

- Espere – disse Kaori assutada percebendo o que estava para acontecer – Alec, o que está fazendo? Explique para ele o que foi que aconteceu de verdade, conte que os Reis te enganaram também e que você não teve escolha... o que está fazendo? Você quer ser morto? Desceu até aqui, sobreviveu até aqui apenas para se entregar de boa vontade à fúria de Arian?

- É a minha sina – respondeu Alec olhando-a com pena através de seus olhos leitosos e vazios – Acho que agora finalmente eu compreendi a nobreza, no fim. Talvez convivendo um pouco com vocês ou sendo constantemente envergonhado através de suas palavras, Kaori, a cada novo gesto de honestidade que partia de você eu percebia o quão minha vida não fazia sentido. Eu menti. Menti a todos vocês. Menti para você.

- Mas do que está falando? - Kaori indagou nervosa, ela tentou se aproximar de Alec, mas Edward a impediu, ele sabia o que estava por vir.

- No fim tive vergonha – admitiu Alec – Vergonha de contar a verdade sobre isso a você, eu não queria pensasse que eu era ainda pior do que sou, mas o fato é que eu menti. Disse que me enganaram, mas não foi assim, fora eu quem contara a Aro sobre Arian e Bianca... eu queria ser mais do que um mero ajudante, eu e Jane tínhamos tanto potencial! Arian tinha tudo, era um príncipe e a minha inveja acabou abafando o amor que sentia por ele e por Matheu... e Bianca. Mas Arian nunca queria nada com nada, apenas guerrear e lutar e destruir inimigos, que bobagem, ele poderia ajudar a governar Volterra, poderia direcionar seu próprio povo a um nível jamais visto no mundo dos vampiros... mas tudo o que fazia era procurar briga por aí como um bêbado.

A voz de Alec agora soava como um poço de amargura e rancor, ele revelava tudo o que realmente sentia sem ter de se esconder por baixo de seu habitual sarcasmo, tudo o que queria era contar o que realmente acontecera... o que realmente fizera.

- Quando Arian se apaixonou por Bianca eu considerei que sua sandice havia chegado ao limite – continuou ele – Além de tudo queria roubar a esposa do pai? Uma loucura, um descabimento total e Matheu o apoiava em tudo, mas não era de se esperar nada menos... Matheu era tão pior quanto Arian, queria apenas lutar e lutar e lutar. Quando vi que tudo o que havia sido construído por Aro, Caius e Marcus estava para ruir eu agi, não permitiria que Arian destruísse tudo por um desejo egoísta de ter Bianca para si, este sempre foi seu mal, por ser o mais poderoso pensava que poderia ter o que quisesse no momento que melhor lhe aprouvesse. Eu contei a Aro e depois ele ordenou a Forge para construir o encantamento e o resto é história... mas fui eu, eu os traí por ganancia e egoísmo e por inveja. Não fui enganado, eu enganei.

O silêncio reinou por alguns momentos, pesado como uma camada grossa de neve, Edward observava Alec enquanto esse olhava com seus olhos vazios para Kaori, acima deles erguia-se Arian que encarava o antigo amigo com uma leve expressão de desgosto e desapontamento.

- Tudo isso por nada – disse Bianca e mesmo ela estava agora com uma expressão de desalento - Séculos de um nada por conta de sua vontade de ser especial aos Reis, Alec? Agora diz-me, o que ganhaste com isso? Aro mandou matar-te depois que te tornaste inútil a ele, esta é a gratidão dos Três, a morte para quem não se encaixa na ideia de perfeição deles.

- Conheces agora o sabor da traição, velho amigo – roncou Arian com sua voz de tempestade – Conheces agora o sentimento que doeu-me durante todos estes séculos. Eras meu amigo, meu irmão e eu o amava, Bianca o amava e Matheu o amava, e vós trocaste isso tudo por um punhado de veludo negro e uma posição mais alta ao lado dos tronos dos reis a fim de lhes alcançar melhor a bota a ser lustrada.

- Por isso eu me arrependo – disse Alec – Entendo o mal que fiz, quase dois mil anos de idade que não serviram para nada a não ser destruir e obscurecer. Os melhores anos de minha vida foram ao seu lado, Arian, ao lado de Matheu lutando e rindo a cada nova batalha... eu fui tolo, estou velho e estou cansado e não quero mais participar deste mundo. Por isso, peço-lhe perdão e espero que estenda esta piedade tirando-me a vida que me resta.

- Não – gritou Kaori com uma voz reverberante.

- Assim seja, velho amigo – respondeu Arian parando diante do pequeno Alec com o machado na mão – Eu o perdoo por ter-nos aprisionado aqui durante quase mil anos, perdoo por ter sido tolo e por ter desejado mais do que poderia ter, mas jamais o perdoarei por ter destruído nossa amizade, o que tínhamos era verdadeiro, Alec, e você o trocou por nada mais que promessas vazias e uma vida servil.

- Alec, o que está fazendo? - gritou Kaori tentando livrar-se do aperto de Edward.

- Me perdoe – pediu Alec olhando para Kaori com seus olhos vazios – Você me fez sentir vivo como não me sentia há séculos, fez-me sentir feliz por alguns instantes e me fez perceber que temos de ser melhor do que podemos para que as pessoas confiem em nós. De uma forma ou de outra, obrigado por ter me trazido até aqui enxergando através dos teus olhos... no fim das contas, a vida não é uma droga?

Alec voltou-se para Arian e com um sorriso zombeteiro aquiesceu brevemente, a lâmina não fez quase qualquer ruído enquanto descia com uma velocidade meteórica em direção ao pescoço do vampiro, a cabeça de Alec separou-se do corpo com uma tênue lufada de vento e o sorriso maroto ainda estava em seu rosto enquanto sua cabeça rolava pelo chão indo queimar e alimentar o fogo no limite do salão. Seu corpo decapitado estremeceu algumas vezes antes de morrer definitivamente, mas tirando isso a única coisa que se ouvia era o eco do grito de Kaori.

 

Edward a agarrou pela cintura e a tirou de perto de Arian, ele não achou prudente perturbar o vampiro mais poderoso do mundo e apesar de ter se habituado a presença de Alec, bem, Edward não mentiu pra si mesmo dizendo que não foi uma morte merecida.

“Kaori, pare” - pediu ele usando o elo mental que ligava os dois.

“Não, ele o matou... o matou, sem qualquer chance” - choramingou ela indignada tentando livrar-se dos braços de Edward.

“Kaori, eu sei que você se afeiçoou a Alec” - disse Edward com Urgência - “Mas preciso que entenda, por mais que lhe doa... Alec Volturi não era um bom homem. Você ouviu o que ele disse, fora ele quem traiu Arian e Bianca, e não preciso lhe dizer que se Benjamin não tivesse ferido Alec durante a batalha no Canadá nós provavelmente teríamos tido ainda mais problemas. Por favor, nossa situação é delicada demais, Kaori, eu preciso que você se concentre, Alec pagou por seus pecados passados e Deus sabe que isso não deve ter representado nem metade de todo o mal que ele fez enquanto vampiro durante todos os séculos que viveu”.

Por fim, Kaori parou de se debater e ergueu os olhos para ver que Arian e Bianca a olhavam com um ar de interesse, Charlotte se chegou perto dela e sorriu-lhe de maneira amigável, Edward tratou de atirar o corpo de Alec para o fogo e depois disso se voltou para Arian.

- Os Três não estão aqui em Volterra – disse ele – Mas meus companheiros precisarão de auxílio para domar os guardas, depois disso precisaremos conversar, o mundo está muito mudado, acredite, nada é como antigamente.

- Edward tem razão, meu Príncipe – disse Bianca segurando a mão do gigante – Acho que seria prudente escutar a história deles depois que tiverdes tomado Volterra.

- Que assim seja – trovejou Arian – Vamos à superfície... eu os farei sentir a minha ira, não existirá lugar no mundo onde Aro, Caius e Marcus poderão se esconder.

 

E dito isso, Arian libertou seu poder. Todos sentiram aquela familiar presença opressora emanar de Arian, como quando chegaram às catacumbas e aquele ódio personificado os recebeu como um aviso de que algo muito poderoso estava ali adormecido. De repente, o chão recebeu um abalo e as paredes de rocha tremeram, blocos e mais blocos de rocha do tamanho de homens despencaram do teto espatifando-se próximo a eles. As portas, outrora barreiras intransponíveis da prisão de Arian, tombaram pesadamente pelo chão causando um estrondo, as escadarias pareceram oscilar enquanto sua própria estrutura abobadada desabava nos degraus de pedra.

Arian havia abalado as estruturas de Volterra, e como um vento furioso pegou Bianca no colo e arremeteu pelas escadarias para deixar para sempre as Profundidades... sua prisão por quase mil anos.

- Seth – gritou Edward prevendo o perigo – Corra para a superfície com Giuliana... a toda sua velocidade. Charlotte, Kaori, vocês também! Vamos antes que ele bote tudo abaixo.

Edward teve que empurrar Kaori para cima enquanto Charlotte seguia Seth que corria como um cometa desesperado rumo à superfície antes que acabassem soterrados por todas aquelas toneladas de rocha.

 

Que o mundo se preparasse...

… Arian estava chegando para destruir tudo.

 

Os Três estavam condenados.

 

 


Notas Finais


Próximo Capítulo: A Queda de Volterra


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