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História A Última Gota - Capítulo quinze


Escrita por: NinaF

Notas do Autor


Vooolteei! (: Espero que gostem!

Capítulo 16 - Capítulo quinze


A primeira noite foi terrível. Nenhum de nós dois dormiu, embora tivéssemos discutido avidamente algumas vezes sempre pela necessidade que o outro tinha de descansar. Em certa parte nós dois apenas nos sentamos lado a lado, escorados numa grande árvore, na total penumbra da noite, cheguei até a pensar que por causa das discussões Violet estivesse emburrada, mas a idéia se esvaiu da minha mente assim que ela deitou a cabeça em meu ombro, com seu dedo mínimo entrelaçado ao meu. Já de manhã não ousamos atacar a nossa parte da comida da Cornucópia, Violet diz que vai caçar alguma coisa e eu digo que vou junto. Acabamos por colocar as mochilas nas costas e seguir pela floresta. Certa hora ouvimos um farfalhar de folhas sendo amassadas, mas não alto o suficiente para ser uma pessoa.

- Ali, ta atrás da árvore. – sussurra Violet pra mim, apontando o arco para um grande pinheiro. – Joga uma pedra no lado direito pra mim.

Eu cato uma pedra no chão e a atiro onde ela me pede. Pelo outro lado corre um esquilo que rapidamente Violet tenta acertar. Ela perde o primeiro tiro mais o abate quando ele sobre numa árvore próxima. Enquanto eu busco o bicho ela vai atrás da flecha perdida.

- Onde acertei dessa vez? – me pergunta quando volta.

- Atravessou o pescoço.  – digo, mas não em tom acusador como dá ultima vez, depois de termos brigado.

- Acho melhor pegar outro, ou outros. – Violet me diz. – Sabe, pra estocar, não sabemos o que vai vir.

Saímos andando desorientados novamente. Alguns minutos outro farfalhar de folhas, dessa vez atrás de um arbusto de amoras. Violet me dá o sinal para que eu jogue a pedra. Jogo do lado esquerdo dessa vez, mas o bicho, seja lá ele qual for, não sai.

- Outra. – ela me sussurra.

Pego uma pedra um pouco maior e jogo mais perto. Nada.

- Violet, não é um bicho ali. – digo já com a espada na mão.

Violet não abaixa o arco e nós dois vamos, silenciosamente, até o arbusto de amoras.

Ergo a espada a fim de dar um único golpe em o que quer que esteja ali, mas a abaixo assim que os vejo. Ambos escolhidos contra as folhas, quase chorando, os olhos cerrados e as mãos entrelaçadas.

- Sete... – sussurra Violet. – O que diabos vocês dois estão fazendo ai?

Duas crianças, os de doze anos do distrito 7.  A garota que Violet diz lembrar sua irmã e o garoto que me lembra Gabe.

- Por favor, não mata a gente... – a menininha diz.

Abaixo a espada.

- Nós não vamos. – digo.

Não, eu não vou matar essas crianças. Se fosse algum tempo atrás eu atravessaria os dois com a espada sem dó, mas, agora, alguma coisa me impede de fazer isso.

- Levantem daí, nós não vamos machucar vocês. – Violet diz, mansa.

Os dois se levantam de trás do arbusto, ambos com olhares assustados. Não largam a mão do outro um único segundo.

- O que vocês estavam fazendo ai? – Violet pergunta.

- Estávamos fugindo... De vocês... – o garoto responde. – Vocês estão caçando tributos não é? Você são carreiristas...

- Somos carreiristas, mas a única que estamos caçando agora são esquilos. – respondo guardando a espada. É melhor para não assustá-los.

- Nós nos separamos dos outros. – diz Violet.

Reparo na aparência dos dois. Sujos, arranhados e magros, bem mais magros do que quando Violet escorregou aqueles pudins para eles no Centro de Treinamento. Não levam armas nas mãos nem nada disso, a única coisa que parecem ter é uma mochila amarela que está nos ombros do menino.

- Vocês estão com fome? – pergunto.

O que está acontecendo comigo eu não sei, mas de repente senti uma dó imensa dessas crianças. Vê se elas teriam chance contra um cara do meu tamanho? Não teriam chance nem contra alguém menor, do tamanho de Violet. É injusto elas terem de vir para cá, competir com pessoas como nós. Os Jogos Vorazes estão me parecendo cada vez mais sujos.

- Não comemos a uns três dias. – a menina me diz. Rue. Ela me lembra muito ela, mesmo que eu não tenha convivido com a garotinha.

- O que vocês têm ai? – pergunta Violet a eles.

- Uma corda, um pedaço de plástico, uma faca e alguns fósforos. – diz a garotinha.

Violet suspira ao meu lado então tira sua mochila das costas. Ela se ajoelha no chão e começa a espalhar algumas de suas coisas por ele. Metade de sua comida, uma de suas garrafas de água, um de seus óculos de visão noturna e seus dois sacos térmicos de dormir.

- Me dá sua mochila. – ela pede ao garoto, agitada.

O menino tira a mochila das costas e entrega a Violet. Ela soca tudo o que tirou de sua própria mochila lá dentro, fecha e a entrega novamente ao garoto. As duas crianças estão boquiabertas.

- Mas e você? – a menininha pergunta esganiçada.

- Eu vou ficar bem com ele. – ela me olha e sorri. Vejo que seus olhos estão cheios. – Agora, você, - ela aponta o garoto. – vai levar isso aqui.

Violet tira sua foice de dentro da mochila e entrega a ele.

- Se defenda. Vocês fizeram uma aliança não foi?

Nessa hora os dois enrubescem drasticamente e seus olhos procuram o chão.

- Bem... Somos mais que aliados. – o garotinho diz.

- Que bom. – rio, agora entendendo as mãos apertadas que não se soltam por nada. – Nós dois também.

Eles olham de mim para Violet e então a garotinha solta, dando uma risada:

- Eu sabia que vocês se gostavam! Sempre desconfiei...

Violet ri desconcertada e me olha novamente, eu também rio.

- Já que vocês são mais que aliados, - Violet começa. – proteja ela também, ok?

O garoto assente. Nessa hora eu sinto que tenho de fazer alguma coisa, por mínima que seja. Faço o mesmo que Violet, separo metade da minha comida e entrego a eles.

- Você não pode ficar sem nenhuma arma, não é? – digo para a garotinha.

Tiro o facão e entrego a ela. Ela me olha com os olhinhos arregalados.

- Escutem agora. – diz Violet séria. – Aqueles sacos vão manter vocês aquecidos durante a noite, então, em hipótese alguma, façam fogueiras. Os óculos são de visão noturna. Não durmam no chão, subam em alguma arvore e se amarrem lá ou encontrem alguma gruta escondida. A comida deve dar pra uma semana. Comam frutas caso acabe, mas só se tiverem certeza de que não é venenosa! A foice deve quebrar um ganho, pesque!

Ela está realmente agitada, respirando rápido. Está se esforçando  para prender o choro.

- Agora vão. – digo. – Ficar perto de nós não é seguro.

A garotinha coloca a comida que dei a ela na mochila que o garoto leva nas costas e então os dois seguem, agora de armas em punho.

Assim que dão alguns passos a menina volta e abraça Violet fortemente pela cintura.

- Obrigado...- sussurra o menininho para nós.

Violet se agacha não altura da garota e a segura pelas mãos.

- Fiquem vivos, vocês dois... – ela diz.

- Nós vamos. – ela responde e se vira pra mim. – Obrigada...

- Vão logo, tem gente vindo atrás de nós dois. – digo com certeza e ela assente.

Eu e Violet ficamos lá parados e observamos os dois irem embora, com as mãos firmemente entrelaçadas. Em silencio nós dois recolocamos as mochilas nas costas novamente e seguimos na direção aposta àqueles dois.

- Vamos continuar caçando. – Violet diz certa hora. – Vamos precisar muito dessa comida.

Sua voz pesa de dor, de tristeza e quando falo, percebo que a minha também.

- Tem razão.

Aqueles dois não me saem da cabeça durante várias horas, e eu só me distraio quando temos que assar um dos cinco esquilos de Violet.

- Dá pra comer um inteiro agora? – pergunto, realmente faminto.

- Dá sim, esfomeado. – Violet sorri pra mim, mas um sorriso triste. – Quando os outros acabarem eu...

Ela para de falar e fecha os olhos.

- Que foi? – pergunto, alarmado.

Violet demora alguns segundo pra responder, eu chego mais perto e a seguro pelos ombros.

- Nada... – ela diz se recuperando. – Fiquei tonta... Mas, não foi nada demais.

Continuo olhando-a durante vários momentos.

- Deve ser a fome. – digo, ainda desconfiado.

Violet tonta... Chegamos a ficar tempo mais longo que esse sem comer antes e ela nunca ficou tonta. Desde que chegamos na Arena Violet nem sequer espirrou e agora ela está tonta? E não foi uma tontura comum, não pela expressão dela.

O bendito esquilo finalmente fica pronto e nós dois comemos cada um uma metade para depois continuar seguindo pela floresta.

- Onde vamos dormir? – Violet me pergunta.

- No lugar em que a gente cansar. – respondo à ela.

Assim acontece. Nós nos sentamos debaixo de uma arvore de tronco largo e esperamos o tempo passar. Se as noites na arena eram frias, ficaram dez vezes mais. Quando me dou conta eu e estou tremendo e Violet, que está enroscada entre as minhas pernas, bate queixo.

- Baixinha, entra no saco de dormir... – digo a ela. Só temos um desses agora.

- Não, você é quem ta tremendo. – ela diz, sua voz ligeiramente embargada. Coloco as mãos em seu rosto para fazê-la se virar pra mim e me assusto. Violet está ardendo em febre.

- Ta se sentindo bem? – pergunto tentando não deixar o desespero transparecer na voz.

- Só meio cansada e com muito frio... – ela me responde.

- Violet... Você ta muito quente. – murmuro apalpando seu rosto, confirmando se sua temperatura está tão alta ou se é apenas ilusão minha.

Não é um bom sinal ter febre aqui, não mesmo. Tonteira e febre alta, tudo no mesmo dia. Eu estou realmente ficando desesperado, tento disfarçar para que Violet não se agite, mas isso não é nada bom. Eu a aperto ainda mais contra mim, como se aquilo fosse fazê-la ficar melhor. Meu pressentimento não é dos melhores, Violet é forte, porque adoeceria de uma hora para a outra? Não, ela não adoeceu, Cato. Amanhã ela vai estar melhor.

Nem sequer discuto quem vai ficar de vigia, e também Violet acaba adormecendo encima de mim sem que eu ao menos perceba. Não acho que seja uma boa posição para ela, mas nada me faz soltá-la. Passo a madrugada inteira bem acordado e assombrado. A temperatura dela sobe durante a noite, é bem perceptível, por vezes escuto seus gemidos de desconforto. A medida que amanhece meu desespero só aumenta: manchas vermelhas tingem suas bochechas, deixando as poucas sardas em evidencia. Eu devo tomar café da manhã, mas estou completamente desnorteado. Chamo por Violet e ela abre os olhos para mim com dificuldade.

- Porque não me chamou? – ela me pergunta.

- Porque achei melhor não te acordar. – forço um sorriso, mas ela continua a me olhar desconfiada.

- Eu to com frio...

Prometo a ela que o frio irá passar e pergunto se está com fome. Violet me garante que seu apetite é zero e diz não querer qualquer coisa que ofereço. Me forço a comer uma maçã.

- Enquanto termina de comer vou arrumar nossas coisas. – ela me avisa e então se levanta.

A maçã que eu estava comendo rola pelas folhas quando tenho de correr e segurar Violet antes que ela atinja o chão. Ela se levantou, mas caiu na mesma hora, não conseguiu se manter de pé por mais que cinco segundos.

- Violet, o que foi? Ta tudo bem? – pergunto, desesperado, mesmo sabendo a resposta.

Sua respiração está acelerada, ela olha o chão assustada.

- Eu não... Eu não to me sentindo bem, Cato. – sua voz deixa o terror transparecer.

Caio sentado com ela em meus braços.

- O que ta acontecendo com você? Violet, o que você ta sentindo? – pergunto desesperado.

- Eu-Eu não sei, - ela gagueja. – eu simplesmente não consegui... Eu... Cato eu ainda to com frio.

Toco seu rosto e constato que a febre continua alta. Eu olho Violet durante um tempo, me perguntando o que fazer e então me lembro que temos remédio para febre. Deixo-a sentada, escorada no tronco e então pego duas das pílulas dentro da minha mochila. Violet as engole com dificuldade, mesmo com a ajuda da água.

- A gente tem que sair daqui. – digo à ela.

- Ta... – sua voz é fraca. – Me ajuda a levantar.

Olho para Violet incrédulo. Ela passou mal a noite inteira, acabou de quase se espatifar no chão quando tentou se levantar e quer seguir andando como se nada houvesse acontecido.

- Não mesmo... Eu te levo.

Violet franze as sobrancelhas pra mim.

- Não, não vou deixar você fazer isso.

- Porque não? Acha que eu não te agüento? – forço uma risada.

- Não, não é isso...

- Violet, deixa de ser teimosa.

- Não! – ela me diz desesperada. – Eu... Eu não to tão mal assim. Eu dou conta!

Não discuto. Seu tom é urgente e doloroso demais. É claro que o certo seria levá-la, para que ela não se esforce demais, mas vejo que seria pior pra ela. Violet não quer aceitar que a situação está bem estranha, ela talvez esteja só afirmando a si mesma de que está bem, talvez esteja tentando não parecer fraca.

Forço Violet a me deixar carregar as mochilas e nós seguimos. Ela consegue ficar de pé e andar, mas estamos bem mais lentos que o normal. Percebo que seu esforço para dar alguns passos é grande, abraço-a pela cintura e deixo que ela se apóie em mim. Paramos a noite e assim que nos sentamos Violet se deita em meu colo e dorme em menos de dois minutos. Sua febre não abaixou durante o dia – o remédio não funcionou -, as manchas vermelhas não saíram de seu rosto. Ela por vezes ficou tonta, negou quando perguntei, mas era visível. Violet não está bem, ela está realmente muito doente. Eu me torturo tentando descobrir o que possa ser, mas nada me vem à mente. É terrível vê-la assim e não poder ajudar em nada.

Em certa parte da madrugada sinto-a se remexer e logo depois sua voz me chama.

- Que foi? – respondo.

- Nada. – ela diz simplesmente me fazendo rir. Depois de muita briga obriguei-a a usar o saco de dormir e me deixar com meu casaco. – Eu não to com pressentimento bom...

Entendo sobre o que está falando.

- Não é nada. Você vai ver, amanhã você vai ficar melhor e então eu vou te tirar daqui.

Seus olhos estão brilhando para mim em meio à escuridão, depois de um tempo me fitando ela se vira, escondendo o rosto na minha barriga, e dorme.

Quando amanhece decido acordar Violet e a forçar a comer. Chamo-a e recebo um grunhido como resposta depois de um tempo.

- Qual é? Ta com tanto sono assim? Você precisa comer. – brinco.

Mais um grunhido, não, não é um grunhido, é um gemido de dor.

- Violet. Violet é sério. – chamo desesperado. – O que foi?

Ela abre os olhos e se levanta com uma extrema dificuldade.

- Ta doendo tudo... Tudo. – sua voz é áspera, seu peito sobe e desce com dificuldade. Ela fecha uma mão em punho. – Eu to completamente sem forças.

Ela tenta a todo custo apertar a própria mão, mas parece não adiantar, seus olhos começam a se encher.

- Não deve ser nada demais... Você deve ter dormido numa posição errada... – percebo que minha voz é falha e meus olhos se enchem em desespero.

- Cato, tem alguma coisa errada comigo. – Violet diz, deixando uma lágrima escorrer. – Muito errada.

Eu a trago pro meu colo e a beijo. As lagrimas de Violet escorrem por seu rosto sem parar, eu não me permito chorar, tenho que ser forte, passar segurança a ela.

- Vai passar, baixinha. – sussurro colando minha testa na dela.

Voltamos a nos beijar e depois de longos minutos Violet se afasta de mim de repente. Abro os olhos e a vejo fitando o chão, sua expressão me assusta, é horrorizada, mais do que antes.

- Que foi? Tem mais alguma coisa errada?

Violet nega com a cabeça e ergue seus olhos pra mim.

- O sanguessuga, Cato.

Demoro alguns momentos e então sinto o ar se esvaindo do meu peito. O sanguessuga. O maldito sanguessuga. A cena do mosquito amarelo berrante sentado próximo ao pulso de Violet vem à minha cabeça e então eu entendo. Tonteira, febre, fraqueza... Sinais de deterioração. Minha respiração se acelera, eu luto para conseguir o ar, minhas mãos na cintura de Violet a apertam cada vez mais, como as dela apertam minha nuca com a pouca força que ainda tem. Foi ele, o bestante da Capital. É por causa dele que Violet está... Morrendo. Violet está morrendo, aqui e agora, nos meus braços. O mosquito é absolutamente letal. Eu não quero aceitar a possibilidade, mas sei que ninguém sobrevive à ele. Não, ela não vai... Minha maior vontade agora é acabar com toda a Capital, com seus cientistas que criaram o ser que... Que está levando Violet de mim. Olho nos olhos dela por um momento. É como se Violet houvesse se transformado em areia e agora ela escorre lentamente das minhas mãos sem que eu possa fazer nada. Deve ter algum antídoto, uma planta que cure esse tipo de infecção. Não, não existe. É como uma doença terminal, a picada do sanguessuga. Ergo o braço de Violet na altura dos meus olhos e então vejo, uma estranha mancha escura onde o mosquito se sentou, com pequenas veias na mesma cor que correm braço acima e vão desaparecendo devagar, a toxina do bicho se espalhou. Porque não percebi antes? Eu viro a personificação do desespero, quero gritar, mas parece que minha língua foi cortada como a daqueles Avoxes. Nunca entrei em choque desse jeito, ao me olhar Violet chora ainda mais.

- Não, Violet, você não. – ouço minha voz embargada. Meus olhos se enchem, mas eu me lembro novamente de que não tenho permissão para chorar. Olho para Violet e a vejo, seus olhos nunca estiveram tão tristes.

- É... É isso ai. – ela diz, fungando e acenando com a cabeça. – Acabou pra mim.

As palavras martelam a minha cabeça, me recuso a aceitar que Violet está morrendo.

- Não, baixinha...

Violet pega meu rosto com as suas mãos e me força a olhá-la.

- Cato, já era pra mim. Isso tudo que eu to passando... Eu to em estado terminal. Não tem volta.

Eu nego com a cabeça. Ela se deita sobre meu peito e nós ficamos parados. Não sei por quanto tempo, a minha cabeça a mil. Violet está morrendo. Meu maior medo: Ver as pessoas que amo morrerem. Aconteceu com Clove e agora vou perder Violet também.

- Cato, - ela me chama. – vai embora.

Eu a olho atordoado, meus olhos ardem pelo esforço em não chorar.

- Ir embora?

- É, vai, você ainda tem chances. Eu vou morrer de todo jeito. – suas palavras doem. – Você tem que fugir, Revlon e Ryan estão por ai.

Eu paro por um instante e então digo, consigo manter a voz calma, mas ela sai fria:

- Eu não vou. Não sem você.

Violet suspira.

- Cato, é o fim da linha pra mim. Eu não consigo nem ao menos andar direito. De que adianta eu ir, te atrasar e no final acabar morrendo. Eu sou algo perdido.

- Você não é algo perdido, não é o fim da linha. Eu não saio daqui sem você, eu não sigo nessa coisa sem você. – levanto-a pelos ombros e a forço a me olhar. – Eu te amo Violet Beauregard, e eu vou até o fim do mundo por você. Eu não vou te deixar, em hipótese alguma, entendeu?

Ela se cala, olha pra mim e seus lábios se curvam num pequeno sorriso.

- Você é terrível, sabia?

- Você é duas vezes mais.

Eu me inclino e beijo Violet. Tem o gosto das lagrimas dela, mas logo isso passa. O pensamento de que esse pode ser um de nossos últimos beijos me revolta, me deixa arrasado e faz com que eu a beije com mais voracidade. Uma de minhas mãos está em sua cintura, a outra em sua coxa, suas pernas entrelaçadas em volta de mim. Ela para por um instante para tomar fôlego, mas não se afasta, continua com a testa colada à minha, sua boca roçando na minha. Os lábios de Violet estão ligeiramente quentes, talvez seja por conta da febre.

- Vamo’ sair daqui? – pergunto.

Violet assente. Observo-a se sentar no chão com um enorme esforço.

- Será que dá pra colocar tudo o que temos numa só mochila? – pergunto.

- Acho que dá. – ela me responde.

Com dificuldade, mas dá. Enxoto tudo em uma só mochila e prendo minha espada no cinto. Subo numa arvore mais próxima, até onde os galhos me agüentam e então escondo a mochila vazia entre suas folhas, não podemos deixar sinais para qualquer um que venha atrás de nós.

- Acha que dá conta de ficar em pé? – pergunto a Violet.

- Me ajuda a levantar que dá.

Eu pego Violet pelas mãos e a ergo. Ela fica encostada contra o tronco da arvore, mas se mantém em pé.

- Vai ser difícil... Mas consegue agüentar essa mochila nas costas? – pergunto receoso.

Violet assente e então eu a ajudo a colocar a mochila nos ombros, ela agüenta.

- Agora, sobe nas minhas costas. – digo me virando de costas e me abaixando ligeiramente.

Nada.

- Violet, anda logo! – teimosa, teimosa e teimosa.

- Ta alto. – ouço-a dizer emburrada.

Me abaixo mais e então ela passa seus braços envolta do meu pescoço. Consigo ergue-la e então ela se arruma, se segura em mim com todas suas forças restantes e eu a ajudo segurando suas coxas.

- Quando cansar, me coloca no chão.

- Eu não vou cansar. – realmente não vou, Violet deve ter uns 60 quilos apenas, é tranquilo para mim.

Com tudo perdi totalmente a fome de modo que não como nada o resto do dia. Várias vezes pergunto a Violet se ela está com fome e ela nega. Mais ou menos no meio da tarde, levo um susto quando chamo por ela, mas não tenho resposta, dez segundos depois constato que ela simplesmente dormiu com a cabeça apoiada nas minhas costas, próxima ao meu ombro. Não sei como, mas ela conseguiu dormir. Não é cansativo carregar Violet, ela é leve e mesmo que não fosse, meu instinto imediato em mantê-la a salvo, mantê-la viva, faria com que eu a agüentasse por milhares de quilômetros se fosse preciso.

A noite é quando a realidade mais me atinge. Me lembro de como costumava ser até dias atrás, nós, carreiristas, escorríamos hostilidade, éramos o melhores. Nós nos sentávamos em volta de uma fogueira comendo e discutindo quem iríamos matar, eu me sentia como se tivesse uma leão dentro de mim que rugia querendo sangue, sangue e mais sangue ainda, querendo voltar pra casa no trem de luxo da Capital, então ganhar uma casa na Aldeia dos Vitoriosos e treinar crianças para futuramente virem até essa Arena e se tornarem verdadeiros predadores. Violet tinha o mesmo desejo, ela e seu arsenal de armas, a Violet que escalou metros de altura em pouco mais de dois minutos e atirou uma menina de lá de cima, ela era tão sedenta por sangue e pela vitoria quanto eu. Agora nós dois estamos fugindo, como dois animais cercados, não queremos matar ninguém, não discutimos caçadas a noite, não brincamos com nossos brinquedos mortais. Olho Violet e meu coração fica do tamanho de uma ervilha, comparo a Violet enérgica de antes com a que está sentada a minha frente. Ela não fala a horas. Brinca com as folhas no chão, seu olhar é mais triste que nunca. Onde está aquele olhar, o olhar tão intenso de quando ela arrancava cabeças com um machado, cabeças essas tanto de bonecos de espuma quando de pessoas. O que vejo é uma Violet... Lutando para se manter viva, eu estou lutando para mantê-la viva.

Pela primeira vez penso em nós dois além da Arena. Como seria se conseguíssemos sair os dois da Arena, sei que é impossível, mas como seria? Eu tenho dezoito, o pessoal no meu distrito é obrigado a começar a trabalhar aos dezenove, até chegarem lá têm a permissão de ficar somente por conta da escola e para treinar para os Jogos. Todos têm uma carga horária obrigatória, nosso distrito é grande e as coisas precisam ser bem organizadas. Os vitoriosos também têm trabalhar, normalmente preferem as fabricas de armas, mas sua carga horária é bem reduzida e eles ocupam os cargos mais altos, depois vão para casa ou então passam ao seu segundo emprego, este é mais por pura vontade: treinar crianças. Pode parecer ridículo, mas eu já tinha minha vida traçada bem antes de vir para a Arena pela primeira vez. Sempre quis trabalhar nos testes de armas, sempre gostei da idéia. Testar a potencia e essas coisas, ficar atirando em um alvo. Eu trabalharia nisso – é meio incomum vitoriosos quererem cargos assim - e então treinaria algumas turmas entre 12 e 14 anos nos Centros. Nunca planejei me casar, nunca até agora.  

Eu já fui a algumas cerimônia de casamento no 2, eu achava legal mas não me imaginava numa dessas. É bem simples, um oficializador fala algumas coisas sobre o matrimônio e então ele pergunta se é de ambas as partes o desejo do casamento, os noivos respondem, há a troca de alianças e então o beijo. Depois disso, na saída dos noivos, vários tiros são disparados para cima e daí tem a festa e tudo mais. O noivo costuma vestir terno e a noiva vestido em cores claras. Dizem que nossa cerimônia de casamento é a que mais se aproxima das cerimônias que eram realizadas por nossos ancestrais, quando Panem ainda era a tal America do Norte. Depois da festa, que geralmente vai até altas horas da madrugada, tem a lua de mel dos noivos. Todos os noivos do distrito dois vão passar sua lua de mel nas montanhas, é meio que uma tradição. Eu ia para esses casamentos, via tudo, aproveitava a festa, mas nunca pensando “daqui a alguns anos eu estarei ali”. Agora tudo isso mudou, eu já estou olhando Violet a vários momentos, já vendo-a em seu vestido, vindo até mim. Estou escutando o nosso sim e então me vendo dançar com ela na festa.

Então bato de cara da parede da realidade e me lembro de que estamos nos Jogos Vorazes, de que Violet está sendo consumida pouco a pouco pelo veneno de um bestante da Capital e de que posso perdê-la a qualquer hora. Eu cubro o rosto com as mãos, passo a mão pelo cabelo com frustração. A única, a única que amei agora está indo embora e eu não posso fazer nada além de não sair do seu lado por um segundo e assistir a isso, desejando tomar seu lugar para acabar com seu sofrimento, para mantê-la a salvo. Meu estado é de total descrença. Eu ainda não acredito cem por cento de que Violet possa ir, parece que a ficha ainda não caiu totalmente. No fundo, bem lá no fundo, ainda consigo acreditar na imagem de nossa cerimônia de casamento.

Passo tanto tempo olhando-a que ela percebe e me encara de volta, sorrindo fracamente.

- Que foi? – ela me pergunta.

- Nada... – não consigo ao menos sorrir. – Tava te olhando.

- Isso eu percebi. – Violet rebate, seu sorriso desaparece e um ruga surge entre suas sobrancelhas, como quem me analisa. – Você ta horrível.

Eu solto uma risada leve.

- Que coisa boa pra se ouvir da namorada... – digo.

Violet me olha aturdida, mas sorrindo.

- Namorada? – ela me pergunta. – Posso ser considerada sua namorada, senhor Cato Stoll?

Eu faço uma careta pensativa por puro deboche.

- É claro que pode, senhorita Beauregard.

Toco seu rosto e aliso sua bochecha com o polegar.

- Por mim, já pode ser chamada de futura senhora Stoll, se quiser...

Violet tem uma expressão misteriosa no rosto, mas percebo que seus olhos âmbar readquiriram um pouco do brilho que tinham antes. Ela coloca sua mão sobre a minha e sorri.

- Bem que eu queria isso mesmo... – sua voz se torna tremula, mas ela logo corrige. – Se eu não tivesse tão pouco tempo com você.

Eu faço um chiado.

- Você não vai, eu não vou deixar.

O olhar de Violet sobre mim é como o olhar de um adulto que fala com uma criança. A criança teima em afirmar algo impossível e então o adulto, compreensivo, finge acreditar em suas palavras para não magoá-la. É exatamente assim que ela me olha.

- Você dorme hoje, tudo bem? – me diz.

Eu começo a negar, mas ela me interrompe.

- Nem começa, você não dorme a dias! Está mais que cansado, não quero você se depredando assim... Nós estamos bem no limite da floresta, dorme que eu fico essa noite.

Realmente não durmo a vários dias, estou cansado. Não. De repente noto que estou muito mais que cansado, e devo estar horrível como Violet disse. Não quero nem imaginar minha aparência agora, mas... Não quero deixar Violet vigiando, não do jeito que ela está. Não porque eu tenha medo que ela caia no sono, mas porque só faria mais mal a ela se cansar assim.

- Não, ninguém vai ficar de vigia hoje. Nós dois vamos dormir. Como você disse nós estamos muito fundo na floresta, é menos perigoso.

Violet hesita, mas acaba cedendo. Para meu animo consigo forçar Violet a comer uma maçã e beber água, eu como um pouco de esquilo, mas é forçado também. Então arrumamos as coisas para irmos dormir. Eu havia me esquecido o fato de que agora temos apenas um saco de dormir. Bem, vi Katniss e Peeta dormirem juntos em um só na reprise dos Jogos no ano passado mas temos um problema... Eu sou bem maior que Peeta. Violet é pequena para mim, mas não chega a ser menor que Katniss. Eu entro no saco de dormir primeiro, receoso mas me espanto ao ver Violet se encaixando nele comigo perfeitamente. E nós nem ficamos apertados.

- Eu to com febre... – ela diz. – Melhor tirar o casaco.

- Bem lembrado.

Acabo por usar meu casaco e o dela como travesseiros pra mim, já que a mochila está cheia demais. Violet deita sua cabeça em meu ombro e fica em silencio. Meu braço livre está em sua cintura enquanto o em que ela está deitada segura a espada, não abro mão de dormir com ela mesmo tendo medo de machucar Violet à noite, já que dormimos juntos uma vez e acordamos num emaranhado de membros.

Realmente eu estaria sofrendo se não tivesse retirado o casaco, a temperatura de Violet é muito alta e acaba nos esquentando. É de grande ajuda já que a noite é mais que fria, mas ao mesmo tempo me lembra o quão ela está doente. Aperto-a mais contra mim ao lembrar disso. Depois de alguns minutos em silencio acabo por perceber por sua respiração tranquila que Violet está dormindo no mais pesado sono enquanto eu ainda estou acordado. Encosto minha boca em sua testa e sussurro, implorando, mesmo que ela não ouça.

- Fica comigo...


Notas Finais


OMG E AGOORA? :'( Quero comentários falando da história hein?


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