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História Falling in love for the last time. - Warm me up and breathe me.


Escrita por: gimavis

Notas do Autor


Oi, gente. Só queria dizer que esse capítulo é muito importante e um dos decisivos. Eu escrevi com carinho, com calma e muita paciência. UHSAAUSHAHUS Eu espero que gostem e que tirem algo bom dele. Depois me digam o que acharam no Twitter, eu vou gostar de saber as opiniões. Estava com saudades ))))): Muitas mesmo. Enfim, é só isso. Vocês podem ouvir "Breathe me - Sia" para o último POV da Lauren, se quiserem. Eu escrevi ouvindo, então acho que dará um clima melhor. Qualquer erro eu conserto depois. Amo vocês. ♥

Capítulo 57 - Warm me up and breathe me.


Fanfic / Fanfiction Falling in love for the last time. - Warm me up and breathe me.

 

30 de Março.

 

Lauren POV.

Eu amava tanto aquele cheiro suave, doce, viciante. Fazia com que eu sentisse vontade de morrer sufocada, extasiada. Era como um tiro certeiro no peito, entrando quente e te arrebentando por dentro. Não havia um momento do meu dia em que eu não desejasse estar ali, cercada por ele, respirando fundo e enchendo os pulmões com o aroma inebriante, suspirando de prazer, relaxando no aconchego. Fosse em Miami ou fosse em L.A, pouco me importava, na cama dela era o único lugar que eu queria estar. E eu estava, espiando com os olhos vidrados ela se arrastar sobre a cama sorrateiramente na minha direção. Mordi o lábio inferior na expectativa, ela sorriu de canto. Seu cabelo estava maravilhosamente bagunçado, seu corpo coberto por meu blusão branco e uma calcinha azul bebê. Sexy, muito sexy. Particularmente, eu tinha uma ideia formada na minha cabeça sobre uma Camila atrevida, mas aquela visão era muito melhor. Ela não estava tentando me seduzir para ter sexo, mas sim para mostrar quem é que tinha o controle nas mãos. E oh, céus! Eu nem precisava dizer que controle era tudo o que menos havia em mim.

: - Cante para mim.

Sua voz soou baixa e autoritária quando ela engatinhou pela minha lateral direita, fazendo-me acompanhá-la com o canto dos olhos. Tirei as costas da cabeceira de couro da cama, sentando-me sobre o colchão. Meu coração estava acelerado como em todas as vezes em que ela ficava perto o bastante. Eu sorri me sentindo um fantoche, completamente à mercê daquela latina.

: - O que você quer ouvir?

Perguntei sentindo os pelos da minha nuca se arrepiarem quando a sua respiração quente tocou a minha pele. Fechei os olhos e separei os lábios. Suspirei.

: - Qualquer coisa. Apenas cante.

Eu não pensei, eu não sabia como pensar em nada quando a tinha nas minhas costas, os lábios cheios roçando no meu ombro direito. Será que ela sabia que nem mesmo precisava tentar me seduzir? Eu já era naturalmente seduzida por ela.

: - She makes the hairs on the back of my neck stand up, just one touch...

(Ela faz os pelos das minhas costas se arrepiarem, apenas um toque...)

Comecei a cantar bem baixinho, minha voz rouca por conta da manhã fazendo Camila suspirar no pé do meu ouvido. Enterrei meus dedos no lençol da cama.

: - And I erupt like a volcano and cover her with my love. Baby girl, you make me say... (E eu entro em erupção como um vulcão, e a cubro com meu amor. Minha doce menina, você me faz dizer...) – Com calma ela beijou o meu pescoço, e ironicamente eu completei a canção da forma correta com o pequeno gemido que soltei. – Oh!

: - Uhumm... – Suas mãos pequenas e delicadas subiram por meus braços, tocando os meus pelos arrepiados. – Eu amo a sua voz, Lauren.

“Lauren”. Aquela pronuncia saindo de sua boca era tão deliciosa. Sorri encolhendo os ombros quando seu hálito quente me fez cócegas, a ouvindo rir baixinho enquanto sentava atrás de mim. Suas pernas logo estavam ao meu redor, seu peito em minhas costas.

: - And I just can't think of anything else I'd rather do (Eu apenas não posso pensar em qualquer outra coisa que eu prefira fazer) – Continuei cantando, jogando um pouco a minha cabeça para o lado, a dando espaço para fazer um rastro de beijos molhados em meu pescoço, deixando suas mãos gentis acariciarem a minha barriga por cima da blusa que eu usava. - Then to hear you sing, sing my name the way you do. (Depois de ouvir você cantar, cantar meu nome como você faz)

: - Eu poderia ouvi-la cantar o tempo todo. Eu acho que estou apaixonada por você.

Camila disse baixinho no meu ouvido, me rendendo um novo arrepio e um pequeno riso. Ela não havia dito, mas eu sabia que ela queria que eu continuasse. Com calma me vire de frente, me desprendendo de seus braços. Ergui a minha mão e a forcei contra o seu peito, empurrando-a para trás, fazendo com que ela deitasse as costas no colchão. Seus olhos castanhos brilhavam apaixonados e seus lábios me mostravam um lindo sorriso. Tão bonita. Eu já disse isso, não já?

Curvei-me para frente quando ela me chamou sensualmente com o dedo indicador, prendendo o lábio inferior entre os dentes. Seu cabelo estava espalhado ao redor de sua cabeça, me dando a visão que eu tanto queria.

: - Sexy love... (Amor sexy) – Continuei a canção enquanto me arrastava para cima dela, subindo minha mão direita por sua coxa descoberta, tocando a pele macia e cheirosa. – Girl, the things you do. Keep me sprung, keep me running back to you. (Garota, as coias que você faz... Você me deixa louca, me faz correr para você)

: - Oh baby, I...

Sua voz saiu rouca e manhosa quando ela completou a frase, seu corpo quente feito das melhores curvas se contorcendo na cama. Deitei-me sobre ela, sua coxa direita entre as minhas. Um encaixe perfeito e familiar. Subi os dedos pela lateral de seu corpo, traçando uma linha até sua clavícula. Abaixei a cabeça, cheirei seu queixo, seus lábios, beijei-lhe o maxilar.

: - Oh, I love making love to you. ( Eu amo fazer amor com você) – Com calma e sem segundas intenções, esfreguei meu corpo ao dela com carinho, oferecendo calor, ganhando calor. Camila suspirou e fechou seus olhos, abrindo um sorriso tão dengoso que não pude impedir o meu. Suas mãos tocaram as mechas do meu cabelo, guiando a minha cabeça até o seu pescoço, onde depositei um pequeno beijo. Eu mordi o lábio quando ela se arrepiou, colando a boca em sua orelha para sussurrar o resto do refrão. – Baby girl, you know your my... Sexy love. (Garota, você sabe que é meu amor sexy)

: - Eu deveria ter gravado isso, sabia? – Eu ri ao escutá-la, apoiando o meu corpo em meu braço esquerdo. Olhei seu rosto de bochechas coradas, olhos pequenos por conta do sono e livres de maquiagem. Não havia nada no mundo mais perfeito que isso. – Assim eu poderia ir dormir ouvindo, acordar ouvindo, ou quem sabe fazer tudo ouvindo você cantar “Sexy love”.

: - Você não precisa gravar, Camz, você pode ouvir ao vivo sempre que quiser. – Ela sorriu ciente da verdade, erguendo a mão para acariciar a minha nuca. – Levando em consideração que eu sou uma otária por você, eu faço qualquer coisa desde que você fique sorrindo assim pra mim.

: - Faz, é?

Eu reconheci a diversão no tom de sua voz, me deixando com borboletas imaginárias voando no estômago. Balancei a cabeça em positivo, acariciando o seu pequeno queixo bem feito.

: - Faço.

: - Então faz... – Quando ela começou, eu já sabia onde nós iríamos parar. Não nuas, mas sim envolvidas em uma bolha de paixão que parecia não ter fim. – Faz aquele frio gostoso crescer na minha barriga. Eu estou com vontade de ficar aqui agarradinha contigo hoje sem ligar para a hora.

: - Você sabe, temos um meet e um show para fazer mais tarde.

Comentei roçando os meus lábios em sua bochecha direita, descendo minha mão por seu quadril, apertando a carne quente. Camila respirou profundamente.

: - Sim... Mas ainda não são nem meio dia. Temos tempo suficiente para esquecer o mundo lá fora um pouco.

Sorri concordando. Eu sempre concordava com tudo o que ela falava de qualquer forma.

: - Nós estamos relembrando os velhos tempos?

Beijei seu queixo, subi para os lábios, trocamos um selinho. As mãos quentes de Camila entraram por baixo da minha camisa, subindo por minhas costas.

: - Bem, estamos em Miami de novo. A única diferença é que hoje em dia nós transamos. – Eu soltei uma risada abafada contra o pescoço dela, ouvindo sua adorável gargalhada pairar acima da minha cabeça. – Não que naquele tempo a minha vontade não fosse transar com você, na sua cama de solteiro.

: - Você queria transar comigo na minha cama quando ia dormir lá em casa, Cabello? – Perguntei ao erguer minha cabeça, olhando seu rosto ganhar uma coloração mais vermelha ainda e um sorriso sapeca nascer em seus lábios. – Meu Deus! Você era apenas uma menininha de quinze anos.

: - Oh, céus! Meus hormônios eram bem exaltados, se você não sabe. – Sua língua rosada saltou para fora, aguando a minha boca. – Eu tinha cara de boba, mas eu conseguia pensar umas coisas bem quentes com você.

: - Quando nós dormíamos juntas e de conchinha, você... Você pensava essas coisas? Pensava em me tocar? Me beijar?

: - Lo!

Camila exclamou soltando uma risada, virando a cabeça para o lado e fechando seus olhos com força. A observei fascinada, era tão gostoso ouvi-la rir.

: - Não vale sentir vergonha agora. – Eu ri da carinha que ela fez. Abaixei a cabeça e a dei mais um selinho. – Conte-me.

: - Se eu disser que não estarei mentindo, então... Teve uma vez que eu me aproveitei da situação e juro que fiquei... Eu fiquei, você sabe...

: - Camz! – Foi a minha vez de começar a rir, me jogando ao lado dela e caindo de costas no colchão. – Eu não acredito que você se aproveitou de mim.

: - Ei, eu não abusei de você, eu abusei de mim.

: - Não! – Eu exclamei abrindo a minha boca em um O perfeito, virando a cabeça para olhá-la. Camila tinha sua mão esquerda cobrindo o seu rosto, os joelhos dobrados e a mão livre largada sobre a barriga. Eu senti que se ela pudesse, com toda a certeza, afundaria no colchão. – Você... Não!

: - Sim!

: - Não! – Repeti apenas para fazer com que ela ficasse mais vermelha ainda.

: - Sim!

: - Oh, meu Deus! Você se tocou do meu lado na minha cama enquanto eu dormia. – Eu praticamente gritei, explodindo em uma risada quando ela pulou em cima de mim, tentando cobrir a minha boca. – Camila!

: - Cala a boca, Lauren. Cala a boca.

: - Você... – Comecei a falar sufocada contra a sua mão, segurando seus punhos com força para descobrir a minha boca. O cabelo de Camila caía em meu rosto, sua expressão envergonhada daria uma bela foto. – Você gozou pensando em mim, na minha cama.

: - Shiu! Por favor, esquece isso. Para com isso, Lauren.

: - Foi gostoso? Você gemeu o meu nome? – Descobri a minha boca, erguendo a cabeça para bicar os seus lábios. Segurei seus punhos em suas costas com a mão direita, e enfiei a esquerda entre suas mechas de cabelo, trazendo o seu rosto para perto. – Diz pra mim como você fez, diz o que pensou. Diz! Deixe-me excitada.

: - Lauren! – Camila choramingou enquanto se debatia, virando o rosto para me impedir de beijá-la. Deixá-la daquela forma era tão bom, ela ficava terrivelmente fofa com vergonha. Seu peso sobre mim me fez começar a respirar mais rápido. – Para! Me solta.

: - Não. – Beijei suas bochechas, seu nariz. Ela relutou, mas começou a rir quando eu estalei beijos em seu pescoço. – Quantas vezes você fez? Foi só uma? Você tocou em mim enquanto fazia? Tocou? Conte-me, Camz.

: - Isso não te interessa. – Ela resmungou afundando o rosto na minha camisa, entre os meus seios. Eu comecei a rir e afaguei seus cabelos, adorando sentir os fios macios deslizando entre os meus dedos. – Me deixe ir.

: - É claro que me interessa, foi na minha cama e na minha casa. Eu tenho o direito de saber. – Beijei o topo de sua cabeça. – E você não vai a lugar nenhum.

: - Eu vou ficar brava. – Ela disse.

: - Fique.

: - Eu estou falando sério.

Contorci-me quando ela mordeu com um pouco de força meu seio direito.

: - Ai! Cachorra... E eu também estou falando sério.

Rebati confiante, apertando mais seus punhos para que ela não se soltasse.

: - Que merda, Lauren! Seu aperto está me machucando.

Eu sabia que ela estava fazendo drama apenas para que eu a soltasse, mas eu não estava com vontade de deixá-la sair. Não por querer uma resposta, mas sim por querer ela em cima de mim.

: - Eu não te machucaria nunca, então nem adianta meter essa apenas para que eu lhe solte. Responda-me o que eu lhe perguntei e nós entraremos em um acordo.

Camila ergueu sua cabeça e apoiou seu queixo entre os meus seios, me deixando ver seus olhos estreitos. Sorri para ela, mas imitei sua expressão.

: - Você é insuportável. – Concordei com a cabeça e ela girou os olhos, completamente adorável. – Foi só uma vez. Agora me solta.

: - E o resto das perguntas? Responda.

: - Lauren!

Camila esbravejou tão assustadoramente que eu fechei os olhos com medo de levar uma cabeçada.

: - Por favor!

Fiz manha, mas como eu só me ferro na vida...

: - Kaki? – A voz de Sofia atrás da porta fez a garota estressada em cima de mim suspirar de alívio. – Lolo?

Soltei seus braços e ela girou para o lado, caindo no colchão. Esfregou os punhos dramaticamente e me olhou de cara feia. A dei um selinho rápido e pulei da cama.

: - Escapou dessa. – Avisei apontando o meu dedo para ela enquanto ia até a porta. – Mas não por muito tempo.

: - Vai pra merda, Lo.

Ela resmungou virando-se de bruços, as bochechas tão vermelhas que deveriam estar quentes.

: - Eu também amo você.

: - Não!

Foi a minha vez de rolar os olhos quando coloquei a mão na maçaneta.

: - Quietinha. – Eu disse antes de abrir a porta, observando uma Sofia de pé bem na minha frente, um sorriso bonito no rosto e os bracinhos atrás do corpo. Curvei-me para beijar sua testa. – Bom dia, pequena.

: - Bom dia, Lolo. – Ah, como eu adorava aquele cheirinho. – A Kaki já acordou? Eu posso entrar?

Tadinha! Ela lembrava muito bem da última vez que abriu a porta sem bater e levou uma pequena bronca da irmã mais velha. Sorri para ela, beijando uma de suas bochechas gordas. Sofi riu toda gostosa.

: - Camz chatinha já acordou sim. E é claro que você pode entrar, pequena.

Ela bateu palmas, ficando na ponta dos pés para abraçar o meu pescoço. Com um gemido de dor na coluna, a puxei para cima, a pegando no colo para apertá-la em um abraço antes de devolvê-la ao chão.

: - Você é mais legal que a Kaki, Lolo.

: - Disso eu já sabia. – Nós rimos juntas. – Agora vem.

Dei espaço para que Sofi entrasse no quarto e fechei a porta atrás de mim, a observando caminhar timidamente até a cama onde a menina mais velha estava deitada.

: - Bom dia, princesa.

Camila disse a irmã quando a mesma subiu na cama, se arrastando de forma preguiçosa até se alinhar no corpo dela. Eu sorri com a cena, adorava a doce relação das duas.

: - Já tá na hora de levantar, Kaki. – Sofi disse com olhinhos sábios, enroscando os dedos no cabelo bagunçado de Camila. – Tomar café. A mama fez vitamina de banana.

Deitei-me na cama ao lado delas, deixando Sofia no meio da minha namorada e eu. Ronronando mais que uma gata, Camila passou seu braço direito em torno do corpinho de Sofi, afundando mais ainda o rosto no colchão.

: - Vamos ficar aqui mais um pouquinho, está bem? Eu, você e a Lo.

: - A Lolo vai levantar, não é Lolo? – Concordei com a cabeça, me arrastando para perto das duas, praticamente apertando a pequena entre nós. – Não, Lolo, levanta.

: - Hmmmmm, estou com preguiça.

Resmunguei escondendo o meu rosto no pescoço gordinho que ela deixava à mostra, passando o meu braço por cima de seu pequeno corpo e da cintura de Camila.

: - Lolo, você disse que ia levantar. – Suspirei, bocejando ao me aconchegar ainda mais nela. – Você está me apertando. Kaki, a Lolo está me apertando. Kaki?

: - Fecha os olhinhos e dorme mais um pouco, Sofi. Faz como a irmã, vai. Assim, agarradinha com a gente. Só dorme...

Camila já falava tão lentamente que eu podia jurar que se calássemos a boca, ela pegaria no sono. Eu quis rir, mas fiquei apenas no carinho em suas costas.

: - Eu não quero dormir, eu quero descer pra brincar. – Em vão, Sofi tentou se soltar do nosso abraço, suspirando irritada quando viu que não adiantaria tentar. – Por favor, Kaki, levanta.

: - Eu estou dormindo.

Camila respondeu com a boca contra o colchão.

: - Lolo?

: - Nós já vamos, pequena... Só mais alguns minutinhos.

E aqueles “minutinhos” se transformaram em uma hora. Fomos levantar na hora do almoço, para a irritação de Sofi. A menina ficou entre nós calada o tempo em que permanecemos na cama, no final, colocando a sua pequena cabeça na curva do meu pescoço. Foi gostoso ficar daquele jeito com elas, parecíamos mais uma família do que outra coisa.

Estávamos em Miami para um show, parecia que toda a cidade estaria presente, eu ouvia falar disso o tempo todo nos noticiários. Passei o dia em casa e terminei a noite com Camila, já que passaria o dia seguinte com minha família antes de voltarmos para Los Angeles. Nossa agenda estava tão lotada que qualquer tempo para descansar era um milagre. Eu me sentia como um robô, sempre fazendo movimentos programados e repetitivos. Mal via a hora de tirar uma semana para não pensar em mais nada, apenas eu, uma casa perdida em algum lugar e Camila.

A tarde não demorou a passar, demos uma entrevista para um programa de televisão local e realizamos o meet. As 20:00 estávamos em cima do palco, cantando entregues para um público de 7 mil pessoas. Eu sentia saudades do Brasil, sabe? Havia uma diferença tão grande entre os fãs de lá e dos outros países que era quase frustrante. Nós amávamos todos, nunca demos prioridade para ninguém, mas acontece que os brasileiros sabiam como fazer com que nós sentíssemos vontade de viver intensamente. Eu pedia para Deus todos os dias para que nos desse a oportunidade de voltar, que fosse em tour ou a passeio. Eu sai do palco daquele show em Miami pensando nisso, e mesmo que estivesse cantando para a minha cidade, eu não conseguia me convencer de que havia um lugar melhor do que o Brasil. Até porque não havia. Depois de ficar um pouco com Vero e Lucy nos bastidores, fui para o camarim completamente exausta e suada, desejando um banho e um bom prato de comida.

: - Onde estão as meninas?

Perguntei a Normani ao me jogar no sofá ao seu lado, levando as mãos até a barra da camisa que eu vestia, passando-a por minha cabeça. O top preto ao redor dos meus seios estava molhado de suor, me incomodando ao extremo.

: - Lá fora conversando com umas pessoas que não conheço. Devem ser da imprensa.

Dei de ombros e joguei a blusa ao meu lado, esticando o braço para pegar uma toalha branca sobre a cadeira. Mani tinha seus tornozelos cruzados sobre o sofá, os olhos na tela do celular e a cabeça balançando no ritmo da música que soava no ambiente fechado em que estávamos. “Banks – Warm Water”. Abri a toalha, sequei o rosto, o pescoço e a coloquei em torno da nuca, curvando o meu corpo para frente.

: - Você e Dinah vão fazer alguma coisa essa noite?

Perguntei enquanto pegava a garrafinha de água que ela havia deixado ao seu lado, abrindo para beber um gole.

: - Assistir uns filmes, comer alguma coisa. Não sei se ela vai querer dormir no meu quarto para que possamos aproveitar mais. Caso durma, vamos inventar o que fazer.

Eu ri baixinho e neguei com a cabeça, largando a garrafinha no chão depois de beber mais um pouco.

: - Inventar? Há muitas coisas para fazer, Mani. Uma em especial.

: - Lauren, nós não vamos transar.

Mani tirou o olhar do celular para fitar o meu rosto completamente séria. Ergui as sobrancelhas para ela, puxando as mechas de cabelo para cima até formar um coque frouxo, liberando a minha nuca.

: - E por que não?

Havia algo de mal em fazer sexo? Ou havia algo de errado nela? Ou em Dinah? Ou era apenas eu e Camila que gostávamos de sexo demais? Considerando que eu pudesse continuar tendo sexo com frequência, a resposta pouco me importava.

: - Porque não. – Mani sorriu sem graça e largou o Iphone ao seu lado, colocando os pés para baixo. – Não acho que esteja preparada para isso ainda. Sei lá, é tão confuso.

: - Bem, Dinah já está. – Eu soltei uma risada quando a vi esconder o rosto entre as mãos. – E aposto que você também, Mani. O jeito que vocês se olham, eu não sei... Há algo familiar nisso, me lembra o jeito que eu olhava pra Camila no passado. Se for medo o que você sente, tire isso da sua cabeça, Dinah será uma pessoa completamente carinhosa se vocês chegarem lá. É só se deixar levar, não há um manual que explique como fazer sexo. Apenas faça, aprendam juntas. Acredite, é a melhor coisa.

Eu disse sincera, queria fazer com que ela se sentisse bem consigo mesma e com Dinah. Eu sempre fui uma boa amiga para ela e ela para mim, queria que compartilhasse comigo os seus medos para que eu pudesse tentar amenizá-los. Mani respirou fundo, deixando o seu corpo afundar no sofá, largando sua cabeça no encosto. A avaliei por um tempo, sua testa enrugada me deixava ver que ela estava pensando.

: - Sabe, nessas semanas que se passaram e que nós estamos deixando rolar, até chegamos perto umas duas vezes. Na hora eu travei porque me senti estranha. Não por estar com Dinah, não por ser uma mulher e muito menos por sermos amigas antes de tudo, mas sim porque me lembrei que não sou a única na vida dela. Eu não quero me entregar a ela dessa forma e depois descobrir que existe a opção de ser passada para trás. Eu sei que não posso fazê-la escolher entre Siope e eu, até porque nem mesmo sei o que nós temos. Mas eu também não posso fechar os olhos e fingir que ela não tem um namorado na Califórnia.

De uma forma bem incômoda, Mani tinha razão. Eu não sei se aguentaria estar na situação dela, sendo extremamente possessiva e ciumenta do jeito que sou. Mas existia um porém. Se Dinah não ligava o suficiente para isso, por que ela tinha que ligar?

: - Mani, eu sei que a tua posição nisso tudo não é nada satisfatória. Mas pense pelo lado mais fácil, nunca pelo mais difícil. Dinah gosta de você e pelo o que estou vendo, não está se importando muito com quem tem ou deixa de ter na Califórnia. Então, diga-me, por que você vai se importar? Quem tem de resolver isso é ela e não você. Não é como se eu estivesse lhe dizendo para ser egoísta e só pensar no teu umbigo. Não, estou lhe dizendo apenas para confiar nela.

: - Talvez eu esteja sendo dramática demais.

Ela disse com um tom de voz exausto, encolhendo os ombros. Levantei-me de onde estava sentada para sentar ao seu lado, pegando sua mão direita entre as minhas. Ela me olhou e sorriu tímida. Retribuí.

: - Não está, está sendo realista. Mas as vezes nós precisamos fugir um pouco da realidade e viver uma fantasia, cometer loucuras, esquecer do mundo. Viva a sua, está bem? Viva e deixe que Dinah, um dia, transforme essa loucura em algo sólido.

: - Você acha que ela fará isso?

Eu vi nos olhos de Mani algo que nunca vi antes relacionado à alguém. Eu vi esperança neles, expectativa... Excitação? Eu acho que sim. Naquele momento eu achava muitas coisas e tinha certeza de outras.

: - Eu não acho, eu tenho certeza.

Respondi convicta, erguendo a mão para acariciar suas bochechas. Mani olhou para baixo rapidamente antes de voltar a colocar seus olhos em mim, se curvando para frente e me envolvendo em um abraço apertado. Eu ri em seu ombro.

: - Eu estou suada, Manibear.

: - Eu também. E eu não me importo. – Ganhei alguns beijinhos no rosto. – Obrigada por me dizer essas coisas, tirou um peso das minhas costas.

: - Eu estou aqui para isso. – A apertei contra mim com mais força. – Eu te amo.

: - Eu também te amo, Laur.

Eu poderia passar um bom tempo naquele abraço, eu não tinha dúvidas.

: - Nossa! Que amor, que doce, que mimimi.

Ouvi a voz de Camila soar atrás de nós e não contive uma risada.

: - Você nos interrompeu, Mila.

Mani disse piscando um dos olhos para mim, sorrindo de forma divertida quando nos separamos. Passei a mão pelo rosto e me virei para encontrar Camila, que parada na frente da porta, olhava para nós com uma cara emburrada.

: - Eu percebi. Mais um pouco e as duas morriam de diabetes.

Mani explodiu em uma gargalhada, jogando seu corpo para trás até que estivesse deitada. Eu neguei com a cabeça e prendi meu riso, me levantando do sofá. Camila estava completamente suada, o cabelo preso em um coque como o meu. A calça de couro preta que ela usava a deixava tentadora. Sem contar as botas de cano longo que enfeitavam suas pernas delineadas.

: - Está com ciúmes, é?

Perguntei erguendo as sobrancelhas, sentindo pingos de suor escorrerem pelo meu abdômen. Observei seus olhos acompanharem as gotas até que elas sumissem em algum lugar, tornando a se fixarem em meus próprios olhos um segundo depois. Ela engoliu a saliva, eu sorri de canto.

: - E se estiver?

Camila respondeu com outra pergunta, cruzando os braços embaixo dos seios. Mani apenas ria atrás de nós, ciente de que estamos prestes a criar uma cena dentro do camarim.

: - Será interessante.

Estiquei o meu braço direito e envolvi sua cintura, puxando-a para mim. Um pequeno resmungo de surpresa saiu de sua garganta, mas ela sorriu quando eu cheirei seu pescoço molhado. Que cheiro delicioso ela exalava mesmo depois de dançar duas horas em cima de um palco.

: - Eu não estou achando graça.

Sorri contra a sua pele, acariciei suas costas.

: - Você fica linda com ciúmes, Camz. E quando é ciúmes desnecessário fica ainda mais linda.

Com a mesma vontade que eu de permanecer perto, Camila envolveu seus braços em meu pescoço, grudando mais ainda nossos corpos suados.

: - Assim fica difícil permanecer brava. Eu me esqueci do quanto você pode jogar sujo quando quer.

: - Graças a Deus.  

Eu não esperei que ela dissesse mais alguma coisa, apenas a beijei louca de saudades. Juntei nossas línguas com calma, aproveitando a sensação de ter sua boca na minha depois de longas horas sem qualquer pequeno contato. As pequenas mãos de Camila soltaram o coque feito em meu cabelo, enfiando-se entre as mechas. Ela puxou com habilidade, arrepiando os pelos da minha nuca. Beijá-la era sempre uma tempestade, deixava-me trêmula e irritantemente molhada. Ela sabia exatamente como mover os lábios e a língua aveludada para me enlouquecer. Eu suspirei quando troquei a posição da minha cabeça, aprofundando mais ainda o beijo. Minhas mãos ansiosas tocavam suas curvas, seus dentes mordiam meu lábio inferior uma vez ou outra. Eu suspirei, ela também. Não queria parar, não poderia parar, mas parei quando ouvi uma voz familiar soar atrás de Camila.

: - Lauren Michelle!

Eu rolei os meus olhos, segurando na cintura de Camila para afastá-la um pouco. Minha mãe estava parada lá, uma expressão raivosa e olhos faiscando. Eu me perguntei se iria ser forçada a dar explicação sobre algo que não era obrigada. Eu nem mesmo me preocupei em trancar a porta do camarim porque as únicas pessoas que poderiam entrar ali eram as credenciadas, e as credenciadas sabiam do meu namoro com Camila. E falando nela, estava mais vermelha que tomate, cabeça baixa fitando os meus pés, incapaz de se virar para encarar a figura quase irreconhecível atrás dela. Eu queria dizer para que ela não se sentisse envergonhada, que não havíamos errado em nada, mas nem mesmo tive tempo.

: - O que você pensa que está fazendo? Essa não foi a educação que eu lhe dei. Há pessoas além de vocês aqui. O que vocês têm na cabeça?

Respirei fundo e peguei na mão de Camila, a puxando para o meu lado.

: - Eu não posso beijar a minha namorada na frente de ninguém? Não é algo que coloquei nas minhas regras.

Perguntei com um tom sarcástico, sorrindo da mesma forma. Camz apertou a minha mão, obviamente me repreendendo.

: - Vocês não têm mesmo limites para essa palhaçada. Não é possível que sejam tão tolas a esse ponto. Quando vão crescer?

: - Quando você vai parar de se meter na minha vida?

Eu dei um passo para frente, automaticamente colocando Camila atrás de mim. Em um piscar de olhos Mani estava de pé ao meu lado, olhando-me apreensiva. Falar com minha mãe era o mesmo que conversar com o Diabo. Ficar calma era impossível, o descontrole chegava junto com a sua presença.

: - Lo...

A pequena mão de Camila tremia levemente, o que me fez apertá-la com mais força.

: - Não ouse falar comigo desse jeito, eu sou a tua mãe e me deve respeito.

: - Não me venha falar de respeito. Como queres discutir sobre a questão se você não me respeita?

Minha respiração estava alterada, a dela também. Ficamos em silêncio por alguns segundos, nos fuzilando em olhares. A tensão dentro daquele camarim poderia ser sentida de longe. O clima ficou pesado de repente.

: - O que é isso nas suas costelas? – Ela ignorou a minha pergunta ao notar a tatuagem presente embaixo do meu seio esquerdo, fazendo-me ter certeza que uma guerra infernal teria início. – Você fez a droga de uma tatuagem e não me disse? Você acha que sou uma idiota, Lauren?

: - Eu não lhe devo satisfações de nada, eu sou maior de idade e da minha vida quem sabe sou eu. Entenda isso de uma vez por todas.

: - Você não sabe o que está falando – Clara passou as mãos pelo cabelo exasperada. Eu respirei fundo para me controlar, ouvindo os ofegos rápidos de Camila atrás de mim. – Eu aposto que você fez isso pra essa menina. Não foi? Não foi por causa dela que você marcou o seu corpo com essa merda?

: - Foi. E vou marcar quantas vezes mais eu quiser. Meu corpo, minhas regras. Meu relacionamento, meu interesse. Resumindo, você não tem nada a ver com isso. Me deixa em paz.

: - Eu deveria ter lhe dado uma boa surra quando todo esse circo começou.

: - Lauren!

Foi a mão de Mani que tocou o meu ombro quando eu avancei mais um pouco, nitidamente deixando com que aquela áurea pesada roubasse meus bons modos. Na minha cabeça a única ideia que eu tinha era de arrastar aquela mulher para longe dali, livrando Camila e Mani daquela cena desnecessária e de mais aborrecimento. Eu não conseguia entender os motivos de ser tratada feito um animal apenas por coisas simples, coisas que diziam respeito apenas a mim. Ela era minha mãe, mas isso não valia de muita coisa quando a mesma fazia com que eu me sentisse um lixo.

: - Sai daqui. – Fechei meus olhos e respirei fundo. – Por favor, vai embora.

: - Você vai embora comigo, nós vamos ter uma conversa quando chegarmos em casa. Vou esperar no carro e não quero ter que voltar aqui para lhe arrastar até lá. Cinco minutos.

Ela apontou o seu dedo para mim, enfurecida. Olhou entre eu e Camila diversas vezes antes de negar com a cabeça e nos dar as costas, saindo do camarim e batendo a porta. Eu soltei todo o ar preso em meus pulmões, era como se brasa estivesse tentando entrar pelas minhas narinas. Sentia-me sufocada, irritada, magoada.

: - Não perde o controle agora, Laur. Não deixe isso acontecer.

Mani disse alisando as minhas costas quando eu me curvei para frente, apoiando as mãos nos joelhos.

: - Eu não aguento mais. – Lamentei negando com a cabeça, as mechas do meu cabelo caindo por cima dos meus ombros. – Eu, realmente, não sei mais o que fazer sobre isso.

: - Olha pra mim. – A voz de Camila soou rouca, eu percebi em seu tom que ela tinha vontade de chorar. Amaldiçoei aquela situação trinta vezes. – Lauren, olha pra mim.

Ergui a minha coluna e olhei para ela, que com o rosto vermelho me encarava com lábios trêmulos. Ergui a mão para tocar seu pescoço, precisava tocá-la de alguma forma.

: - Vai pra casa, coloque a tua cabeça no lugar e converse com ela. Mas converse direito, de igual para igual.

: - Eu não vou aguentar olhar pra cara dela.

: - Sim, você vai. – Camila segurou as minhas mãos em seu pescoço, acariciando as costas com os dedões. – Você pode fazer qualquer coisa desde que queira. Você vai até lá, vai conversar com a tua mãe, tentar amenizar a situação e depois vai pra minha casa dormir comigo. Você me entendeu?

Eu posso dizer com sinceridade que a única parte da frase dela que eu entendi foi “você vai pra minha casa dormir comigo”, o resto eu praticamente ignorei. Eu não queria ter que conversar com aquela mulher, eu não queria ter que explicar os motivos que me levaram até ali. Eu não queria ter que explicar o que não precisava de explicação. Mas eu não deixaria de atender um pedido de Camila por nada, nem que aquilo me custasse a sanidade.

: - Você vai ficar bem?

Perguntei preocupada, com medo de que a cena que minha mãe criou pudesse tê-la machucado de alguma forma. Camila sorriu tristemente, seus olhos castanhos brilhavam nas lágrimas que ela não deixou jorrar. Senti-me uma merda, mais merda do que haviam feito com que eu me sentisse.

: - Vou. – Com calma ela chegou para frente, selando os meus lábios antes de grudar nossas testas. – Eu vou ficar bem, não se preocupe. Apenas vá.

: - Vai ficar tudo bem, Laur. – Mani disse passando seus braços ao redor de Camila e eu, nos abraçando. Eu queria ficar ali para sempre, era um bom lugar para estar. – Você é forte, não se esqueça disso. Nada pode contra você, nem mesmo a sua mente.

Mani beijou a minha bochecha e afagou o meu cabelo, se afastando um pouco. Eu respirei profundamente e segurei o rosto de Camila com as duas mãos, grudando meus lábios em sua testa por alguns segundos.

: - Eu não vou demorar. – Eu disse contra a sua pele, meu nariz batendo em seu cabelo. Inalei com força para sentir seu cheiro. – E eu te amo. Está bem? Eu amo você. Espere-me em casa, eu juro que chego logo.

: - Eu também te amo, Lo. – Sua voz trêmula partiu o meu peito em vinte. Eu não aguentava a dor de vê-la magoada. Antes carregar todo o sofrimento sozinha do que compartilhar com ela. – E tenha calma... Por favor!

: - Certo.

Nem eu sabia se aquela era a verdade. Separei-me dela muito sem querer e olhei ao meu redor, me sentindo estranhamente perdida. Parecia que eu estava indo para o abatedouro, e de certa forma estava. Vesti minha blusa, peguei minha bolsa e sai daquele camarim depois de dar um abraço longo em Camila, dizendo para mim que logo eu estaria com ela outra vez, longe de problemas.

O caminho até em casa foi feito através do silêncio, para a minha saúde mental. Meu pai foi para a casa dos Cabello’s, já que iria sair com Alejandro e mais alguns amigos do futebol. Taylor estava quieta no banco detrás pendurada no celular e Chris, como sempre, eu não fazia ideia de onde foi parar. Minha mãe e eu nem mesmo nos olhamos, era nítida a nossa vontade de ficar longe uma da outra. Bem, ao menos a minha era exatamente essa. Fui o tempo todo pensando nas meninas, nos meus fãs, em Sofi. Pensar em tudo aquilo me deixava calma e me lembrava do quão amada eu era. Quando chegamos, Taylor pulou para fora e sumiu da minha visão em segundos. Perguntei-me se ela estava ansiosa para ficar sozinha e falar com a namoradinha. Eu ficava do mesmo jeito quando queria falar com Camila. Aquilo me rendeu um sorriso, éramos parecidas.

Eu entrei em casa quase me arrastando, estava exausta, com dor de cabeça e o corpo dolorido, só queria me deitar e dormir um pouco. Mas aquele pensamento ficou distante quando a porta da sala se fechou atrás de mim, me fazendo encolher os ombros por conta do barulho oco que encheu o ambiente. Comecei a pedir para Deus que me desse toda a paciência necessária.

: - O que você está fazendo com a sua vida, Lauren?

Ela começou ao parar no meio da sala, praticamente me obrigando a me virar para encará-la. A minha expressão era de tédio, a dela de ódio. Há coisas na vida que eu nunca consegui entender e aquela era uma delas. Como uma mãe podia demonstrar tanto ódio em relação a um filho? Passei a mão pelo cabelo me lembrando das palavras de Camila: “Tenha calma”.

: - Tudo o que eu já deveria ter feito há muito tempo. Livrando-me do que não vale a pena, arrumando da melhor forma, vivendo, sendo feliz. Por que é tão difícil pra você aceitar que eu estou feliz?

: - Você não pode estar feliz.

Rolei os olhos, respirando fundo.

: - E por que não? Eu sei do que se passa aqui dentro, mãe. – Bati a palma da mão contra o meu peito rapidamente. – São meus sentimentos e eu nunca estive mais feliz que isso antes.

: - Ninguém é feliz assim, ninguém pode ser feliz vivendo desse jeito. – Eu senti vontade de cobrir os ouvidos para não escutar todo aquele amontoado de merda. – Não há felicidade nesse modo de vida.

: - Que modo de vida? – Eu ri incrédula, fechando as mãos em punhos para manter o elástico do meu controle no lugar. – Amar uma mulher e se dedicar a ela não é um modo de vida, uma escolha por falta de mais opções, é humano. As pessoas estão propícias a se apaixonarem umas pelas outras independente do sexo, da religião, da cor da pele. Isso tudo é o que menos importa, mãe. Quando há amor, nada disso precisa ser posto em jogo.

: - Não me venha falar de amor, Lauren. – Clara jogou suas mãos ao ar e negou com a cabeça. – Você nem mesmo sabe o que é amor. Você não sabe de nada.

: - E você sabe? – Perguntei me aproximando um pouco, minha respiração levemente alterada. – Você sabe o que é amor? O que é felicidade? Você nem mesmo consegue reconhecer essas duas coisas na sua própria filha. Você está se deixando cegar por um conceito estúpido e princípios arcaicos. Você está se tornando um monstro, mãe. Está fazendo com que eu me afaste cada vez mais de você.

Minha garganta estava seca, eu pude sentir o peso das lágrimas em meus olhos, o incômodo da rejeição, a ardência da falta de compaixão. É difícil enfrentar a intolerância dentro da sua própria casa, vindo da sua própria mãe. As vezes, a vontade que se sente é de jogar tudo para o alto e sair sem rumo, esquecer que um dia teve amor, carinho e compreensão da parte dela. As pessoas só entendem o que as outras carregam nos ombros quando se colocam no lugar delas. Ninguém sabe as feridas que se abrem quando se bate de frente com o preconceito o tempo todo, a vida toda. O gosto do sangue fresco vem na boca, a exaustão e a falta de paciência fazem com que você ligue o foda-se para ela, faz com que você se afaste, com que queira ficar cada vez mais longe. Você não quer isso, mas infelizmente é a única coisa que pode fazer. E eu estava fazendo.

: - Você só me decepciona, Lauren. – Eu abaixei a minha cabeça e fechei meus olhos, pressionando os lábios para não chorar. Eu não queria chorar, eu não podia me humilhar assim. – Olhe só para você, não restou nada daquela garotinha amável e normal.

: - Eu tenho dado tudo de mim a vida toda para te agradar, mãe. – Ergui meus olhos para ela. – Eu fiz tudo o que você queria esse tempo todo. Eu trabalhei por noites intermináveis para estar onde estou hoje e lhe fazer sorrir, lhe dar orgulho. Como você pode me dizer que eu só lhe dou decepção? E todas aquelas alegrias? Os abraços que trocamos? O amor que sempre compartilhamos? Onde tudo isso foi parar, mãe? Eu continuo sendo a sua filha, eu continuo sendo normal.

Eu estava lamentando, um revolto mar de lamentações, olhando para ela como se minha vida dependesse de sua compreensão. Meu coração batia acelerado, minha cabeça sustentando a ideia de que eu deveria fazê-la entender, enquanto o meu corpo implorava para que eu deixasse pra lá e apenas me deitasse.

: - O que você está fazendo não é normal. – Ela negou com a cabeça algumas vezes, colocando as mãos na cintura, olhando para todos os lados, menos para mim. – Você não é assim, eu sei que não é. Eu sei que isso foi influência dessa menina. Você vai perceber isso, Lauren. Você vai voltar a estar com homens e esquecer que um dia cometeu toda essa sujeira. É por causa de Camila que você está vivendo dessa forma medíocre. Sinu e Alejandro deveriam colocar limites nela, mas nem isso fazem. Eu não quero você com ela, ela está estragando a tua vida. Ela...

: - Eu sou gay.

Eu disse baixo, fechando as mãos em punhos enquanto ela falava, falava e falava. Minha cabeça começou a latejar, eu queria sair correndo dali, eu queria poder fazer com que aquela situação parasse de doer em mim. Ouvi-la falar daquela forma da garota que era tudo pra mim me deixava louca. Eu estava respirando tão forte para manter a minha cabeça no lugar que mal percebi minhas unhas fincadas em minhas palmas.

: - Eu não te criei assim. Não, eu não te criei para ficar com uma mulher. Eu não quero isso, eu não quero essa vergonha na nossa família. – Minhas pernas tremeram quando ela começou a andar de um lado para o outro, o som de sua voz ecoando pelas paredes e me deixando enfurecida. – Você precisa dar um fim nessa palhaçada toda.

: - Eu já disse que eu...

: - CALA A BOCA, LAUREN.

Ela gritou apenas para me interromper, fazendo com que eu gritasse de volta como nunca gritei antes na minha vida.

: - EU SOU GAY. EU DISSE GAY, VOCÊ OUVIU BEM? NADA QUE VOCÊ FAÇA VAI MUDAR ISSO. – Apontei o dedo para ela, tremendo tanto que senti minha cabeça rodar dez vezes por segundo. – E NUNCA MAIS ABRA A SUA BOCA PARA FALAR ASSIM DA CAMILA. QUEM PRECISA DE LIMITES É VOCÊ, NÃO ELA.

O que enxerguei nos olhos dela gelou todo o meu corpo, naquele momento eu soube que o resto do laço que nós mantínhamos havia ido pelo ralo. Mesmo sendo ciente de que a nossa relação de mãe e filha não tinha mais uma solução, nada me preparou para ouvir o que saiu da boca dela.

: - Eu preferia que você não tivesse nascido, assim não teria que vê-la se transformando em uma lésbica suja e colocando o nome da nossa família no meio dessa vergonha.   

Eu dei um passo para trás completamente fraca, incapaz de impedir que as lágrimas rolassem com pressa. Ouvir aquilo da pessoa que me deu a vida foi como morrer, literalmente. Eu estava de pé, mas me sentia no chão depois de levar uma rasteira. Saber que aquela mulher desejava que eu não tivesse nascido apenas por ser homossexual, fez com que eu repensasse o sentido de amor. Olhei para ela como quem olha alguém pela última vez, o gosto do ódio amargando a minha língua.

: - Eu te odeio. – Eu não me reconhecia, nem mesmo a minha voz parecia a mesma. A dor que eu sentia não tinha uma explicação, apenas maltratava. Era apenas eu e o meu interior queimando incontrolavelmente. Eu sabia que teria de começar de novo, dessa vez, sem alguém para chamar de mãe. – Você se tornou a pessoa mais desprezível que eu conheço. Eu odeio você.

: - Cala a sua boca.

Ela disse entre os dentes, os olhos tão vermelhos que me causou medo. Eu gritei de novo, louca de raiva, afogada na mágoa

: - EU TE ODEIO. VOCÊ É UM MONSTRO E NÃO MERECE NADA ALÉM DE FICAR SOZINHA.  

Eu não ouvi mais nada, apenas senti e gemi de dor com o tapa estalado que levei do lado direito do rosto. Meu ouvido zuniu e eu cambaleei para o lado, levando a mão até a minha bochecha que ardia insanamente.

: - Saia daqui. – Naquela altura, compreender e agir se tornou tão difícil quanto respirar. Eu me sentia tão sufocada que me curvei nos joelhos para puxar o ar. – Saia daqui agora e vá para o teu quarto, Lauren.

Eu clamei por Deus baixinho, resmungando descontroladamente milhares de orações para me livrar de toda a queimação que arrebentava o meu peito. Nem mesmo o tapa que levei na cara doía mais do que as palavras que ouvi dela. Eu pensei em Camila, eu pensei em nós, eu pensei nos meus fãs, eu pensei nas meninas, eu pensei em Sinu e Alejandro, em pensei em santos e anjos, eu pensei no Diabo. Eu pensei em cometer uma loucura com aquela mulher, eu pensei em apenas fechar os olhos e dormir por uma semana até que parasse de doer.

: - AGORA, LAUREN. SAIA DAQUI ANTES QUE EU LHE DE UMA SURRA. – Seus gritos faziam meus ouvidos implorarem por silêncio. – AGORA!

Deixando um soluço alto escapar pela minha garganta, eu levei a mão até a minha boca e corri dali o mais rápido que eu consegui, esbarrando em Taylor na entrada do corredor, só então me dando conta de que ela estava lá. Não olhei para trás, não olhei para lado nenhum, o meu quarto ficava cada vez mais distante enquanto eu parecia tropeçar nas minhas próprias pernas para chegar até lá. Quando alcancei a porta, entrei sem hesitar, a batendo com tanta força que estremeceu as janelas do meu quarto. Olhei ao meu redor enquanto chorava sem conseguir acreditar que havia acabado. Que eu e ela não éramos mais nós, que ela não tinha mais uma filha, que eu não tinha mais uma mãe. Nunca em toda a minha vida me senti tão desolada e descontrolada, nem mesmo quando Jodi pegou as minhas fotos com Camila, nem mesmo quando recebi a notícia de que o meu sonho no grupo teria um fim.

Fui passando as mãos por cima da minha estante e derrubando tudo o que havia por cima, gritando para quem quisesse ouvir o quanto a odiava. Quebrei porta-retratos, vidros de perfumes, potes de maquiagem. Ia destruindo tudo o que via pela frente, tentando amenizar a dor, tentando encontrar o que se perdeu.

: - LAUREN! LAUREN, ABRE ESSA PORTA. – Ao fundo eu ouvia Taylor gritar, socando a porta do meu quarto como se quisesse derrubar. – POR FAVOR, ME DEIXE ENTRAR.

Eu a ignorei, eu não queria falar com ninguém, eu não queria pena de ninguém.

: - LAUREN, PARE COM ISSO. – Eu gritei qualquer coisa para que ela fosse embora, tacando um pote de vidro que guardava meus anéis na porta. – VOCÊ VAI SE MACHUCAR, LAUREN. POR FAVOR!

Arrastei-me para o banheiro, deixando Taylor e sua embargada voz para trás. Abri o pequeno armário com porta de vidro em cima da minha pia, passando as mãos pelos olhos com raiva antes de começar a procurar por algo que me trouxesse de volta. Derrubei tudo ali por cima, caçando com mãos trêmulas por um pote pequeno e branco que guardava uma dúzia de remédios para dormir. Há algum tempo, desde que começamos a fazer show’s, nós frequentamos psicólogos e até mesmo psiquiatras. Para um artista aguentar a longa jornada, só com acompanhamento profissional. Como eu sempre tive dificuldades para dormir e isso muitas vezes me atrapalhava no dia, um dos médicos me receitou uma dosagem pequena de calmante para os meus dias de folga, apenas para que eu ficasse sonolenta. Desde que comecei a namorar com Camila, nunca mais havia tomado um deles. Até aquele momento. Eu só queria dormir, eu precisava dormir e esquecer o que ouvi, o que vivi. Eu precisava com todas as minhas forças apagar, ou o desespero que nunca senti antes faria de mim refém. E ficar presa naquele buraco negro era tudo o que eu menos queria.

Quando encontrei o tão esperado pote, o abri e entornei alguns na mão, levando a mesma completamente trêmula até a boca. Engoli os comprimidos a seco, os forçando por minha garganta até que eu não os sentisse mais. Olhei-me no espelho e senti pena de mim, do que estava lá. Uma aparência horrível fisicamente, marcas de dedos em alto relevo marcando a minha bochecha, meus olhos tão obscuros e sem vida. Mas nada se comparava com a aparência da alma, do coração, sabe? Eu não sabia dizer onde enfiei o brilho que tanto admirava neles.

Andei de volta para o quarto, meus olhos embaçados lutavam abertos para enxergar a cama. Eu desejei Camila, eu queria ela e seu cheiro, seu toque, seu carinho. Pensei em pegar o meu celular e chamá-la depois de alguns longos minutos, mas fui afundando na minha cama, ouvindo de longe ainda os berros de Taylor, mas sem saber se eram as minhas fantasias. Talvez eu soubesse que tomei uma quantidade muito grande daqueles pequenos comprimidos, talvez eu estivesse ciente de que me intoxiquei, talvez eu estivesse desesperada para vomitá-los, mas eu não consegui fazer nada além lamentar, lamentar e lutar para não fechar os olhos. Eu senti medo de não voltar a abri-los. Eu sentia o meu corpo tremendo, como uma rejeição necessária. Minha boca formigava e eu separei os lábios para chamar por alguém, mas eu nem mesmo sabia se existia alguém. Morrer não podia ser tão fácil, mesmo que eu soubesse que não ia morrer. Eu não ia morrer, eu não ia morrer. Eu comecei a dizer para o meu subconsciente que tudo o que eu faria era dormir por um longo tempo. Eu só estava sendo dramática, sim, eu estava. Aquela sensação de estar indo para um lugar sem volta deveria ser apenas coisa da minha cabeça. Eu salivei e senti a saliva escorrer pelo canto da minha boca. Eu comecei a tremer violentamente e lutei com o que não sabia para que meus olhos não se revirassem, mas eles reviraram. Eu sabia que aquilo iria parar, ia parar e eu dormiria de alguma forma. Ia parar, tinha que parar, precisava parar por mim, por Camila... E parou. Independente do que me causou, parou. E me lembrar de alguma coisa depois que o tormento me deixou não era uma opção.

 

Camila POV.

Eu estava em casa com Sofi em meu colo quando recebi uma ligação desesperada de Taylor, dizendo-me que Lauren estava quebrando tudo dentro do quarto depois de ter uma briga horrível com Clara. Na hora eu saltei da cama, meu coração começou a sair pela boca enquanto Taylor me pedia para correr até sua casa antes que Lauren se machucasse. Eu nem mesmo me preocupei em calçar chinelos e por uma roupa melhor da que coloquei para dormir, eu apenas corri para baixo atrás do meu pai e de Michael, orando para que eles ainda não tivessem ido para que pudessem me levar até Lauren. Eu podia acalmá-la, eu era a única pessoa que podia. Por sorte eles estavam esperando um amigo chegar para encontrá-los, o que ocasionou em Michael e eu fazendo todo o trajeto até sua casa em dez minutos. Minha mãe me pediu para manter a calma, meu pai disse que tudo ficaria bem. Mas de alguma forma, dentro do meu peito, eu sentia que se não tocasse em Lauren o mais rápido possível, as coisas não iriam se ajeitar nem por milagre. Eu liguei para o seu celular durante todo o caminho, mas ela não atendeu. Eu fiquei louca, estava angustiada, sabia que tinha algo de errado acontecendo. Quando nós chegamos, eu ouvi vozes altas vindas de dentro da casa e me esforcei para ver se uma das vozes era a da minha namorada... Mas não era.

: - Onde está Lauren? – Michael perguntou preocupado quando entramos na sala, encontrando Taylor e Clara uma de frente para a outra, no meio de uma discussão. – Taylor, cadê sua irmã?

: - Ela está trancada no quarto, quebrou tudo lá dentro e não quis me deixar entrar. E agora está um silêncio perturbador lá dentro, pai. Eu estou com medo de que ela tenha feito uma besteira.

: - Que inferno, Clara. O que foi que você disse à ela?

Michael perguntou enquanto passava por ela, correndo na direção do quarto de Lauren. Eu fui atrás, as lágrimas nos meus olhos embaçando a minha visão.

: - Deixa ela quieta, Michael, ela me faltou com o respeito e agora vai ficar trancada ai dentro.

Clara disse da sala quando nós chegamos no corredor, na frente da porta em carvalho do quarto de Lauren. Sua frase expressava raiva, mas seu rosto estava contorcido em agonia.

: - VOCÊ DISSE COISAS HORRÍVEIS PRA ELA, MÃE. VOCÊ BATEU NELA.

Eu levei as mãos até a minha cabeça quando Michael começou a socar a porta do quarto.

: - LAUREN? SOU EU, SEU PAI. ABRA ESSA PORTA.

Eu solucei e me encostei na parede, desesperada para vê-la, para abraçá-la, confortá-la. Eu estava com vontade de voltar naquela sala e dizer para aquela mulher desprezível o que ela merecia ouvir. Como ela teve coragem de bater na filha por algo que ela não tinha culpa? Como ela pode ser tão suja e desumana? Eu não conseguia entender.

: - LAUREN, O PAPAI ESTÁ AQUI. NOS DEIXE ENTRAR.

Taylor tentou completamente nervosa.

: - FILHA, POR FAVOR. – Michael socou a porta outra vez. – ESTÁ TUDO BEM, LAUREN.

: - Aconteceu alguma coisa. – Eu comecei a dizer olhando para os dois, apontando para a porta. Meu coração apertado me dizia que nada estava em seu devido lugar, que eu estava perdendo alguma coisa. Eu não conseguia respirar. – Ela não responde, nem um ruído está fazendo. Aconteceu alguma coisa. Abra essa porta.

: - Só ela pode abrir a porta, Camila, eu não tenho como fazer isso.

: - ABRA ESSA PORTA AGORA. – Eu gritei para ele com toda a minha força. – ABRA ESSA PORTA AGORA E TIRE ELA DAÍ DE DENTRO. EU NÃO VOU PERDOAR VOCÊS SE ALGO ACONTECER COM ELA, EU SEI QUE NÃO ESTÁ TUDO BEM, EU SINTO, EU SINTO AQUI DENTRO. – Bati no meu peito com a palma da mão direita. - FAÇA ALGUMA COISA. FAÇA!

Michael me olhou apavorado, assim como Taylor. Eu comecei a contar os segundos enquanto chorava, ouvindo alguém esmurrar a madeira. Andei de um lado para ao outro, dizendo baixinho para Lauren e para mim que eu estava ali, que eu não a deixaria sozinha, que eu logo a colocaria em meus braços. Levou alguns minutos até que Michael conseguisse arrombar a porra daquela porta, e quando eu vi Lauren deitada naquela cama mais pálida do que já vi em toda a minha vida, senti como se alguém tivesse arrancado o meu coração do meu peito a sangue frio. Foi a pior sensação que eu já tive algum dia, eu me sentia morta, mas continuava de pé enquanto Michael e Taylor a pegavam pelos ombros, a sacudindo incontáveis vezes. Eu queria gritar, mas não tinha voz, queria me ajoelhar e chorar, mas não conseguia me mexer. Era como se um filme estivesse passando ao meu redor em câmera lenta, onde eu assistia de um lugar privilegiado. Eu não conseguia acreditar no que via, acho que nem mesmo respirava, apenas ouvia gritos e via a movimentação. Ela estava completamente mole, seus lábios separados e uma espuma branca saía pelo canto de sua boca. Sabia que ela estava respirando porque ouvi Taylor dizer no meio daquela confusão. Meu corpo inteiro estava doendo, eu não raciocinava mais. Eu não podia perdê-la, eu não seria nada sem ela. Eu não era nada sem ela. Não existia no mundo a opção de ficar sem Lauren. Eu não aceitaria permanecer ali no meio de toda aquela gente se ela me deixasse. Eu vi quando Clara entrou no quarto desesperada, com as mãos na cabeça e as lágrimas rolando por seu rosto. Sem pensar duas vezes eu parti pra cima dela, a empurrando para trás com as mãos tão forte que ela bateu contra a parede.

: - Por quê? – Eu perguntei sem forças, chorando e sacudindo a cabeça em negação sem pausa. – Por que fez isso com ela? Você é imunda. Você a deixou doente, você fez isso com a garota que eu amo. Você enlouqueceu a sua própria filha.

: - Vem, Camila. – Taylor me puxou pelo braço enquanto chorava, tinha um pequeno potinho em sua mão. Michael já havia sumido com Lauren. – Vem!

: - Eu odeio você. – Eu dizia enquanto deixava Taylor me arrastar para fora. Clara me encarava horrorizada, parecia tão perdida que eu sentiria pena dela se fosse outra situação. – Você me dá nojo. Você vai pagar por isso, eu sei que vai.

: - Ande, Camila.

Nós saímos do quarto e eu me deixei gritar uma última vez.

: - EU TE ODEIO, CLARA. VOCÊ VAI SOFRER MUITO PELO O QUE FEZ.

Eu sabia que não precisava dizer mais nada, a vida já havia feito todo o trabalho por mim.

 

2:40 da manhã. Era esse o horário que o relógio marcava a última vez que eu olhei no celular. Aquele corredor branco e gélido parecia não ter fim, era como uma passagem do mundo dos vivos para o mundo dos mortos. Eu sempre odiei hospitais, tendo Lauren em um daqueles quartos naquele momento fez com que eu odiasse muito mais. Meus olhos estavam doloridos e inchados de tanto chorar, eu mal conseguia abri-los. Todas as meninas estavam ali, meu pai também. Minha mãe teve que ficar em casa por conta de Sofi, pois não a queria no meio de um hospital aquela hora da madrugada, mas me ligava de cinco em cinco minutos para saber notícias. Notícias. Nós recebemos três até determinado ponto. A primeira foi que Lauren sofreu uma séria intoxicação por conta da quantidade de calmantes que tomou, que eles tiveram que fazer uma lavagem estomacal e mais alguns procedimentos para garantir que o remédio saísse de seu organismo. A segunda foi que se ela tivesse ingerido uma quantidade maior e não tivéssemos a levado até o hospital com pressa, teria entrado em coma e então... Algo que eu me recusava a repetir na minha cabeça. E a terceira foi que teríamos de esperar ela acordar para só então entrar para vê-la. E esperar era o que estávamos fazendo. A direção do hospital concordou em manter sigilo sobre o caso, ou melhor, sobre o que levou Lauren a parar ali.

: - Quer comer alguma coisa, Chancho? - Dinah perguntou no topo da minha cabeça, esfregando sua mão em meu braço direito para me proteger do ar condicionado do hospital. Funguei um pouco e neguei com a cabeça, rodando a aliança de compromisso que tinha no dedo. – Você precisa comer, não queremos mais uma internada nesse hospital.

: - Eu só vou comer depois de vê-la.

: - Ela ainda vai demorar para acordar, Mila. – Dinah beijou a minha cabeça e me abraçou com mais força. – E não vai gostar nada de saber que você passou a madrugada sem comer. Você quer levar esporro? Lauren vai ficar muito brava com você.

: - Não! – Me encolhi contra o corpo dela, enfiando meu rosto em seu decote. – Tudo o que menos quero é fazer com que ela se irrite. Mas não vou conseguir comer nada.

: - Nós vamos tentar. Eu te dou na boca. – Dinah me empurrou para trás pelos ombros, colocando uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha. Ela sorriu para mim, triste e gentil, curvando-se para frente e beijando a minha testa. – Vai ficar tudo bem, ok? Eu vou ali e volto já, vou lhe comprar algo para comer bem gostoso. Fique quietinha aqui.

: - Não quero que vá.

Eu choraminguei, não queria perder o seu calor. Ally e Mani dormiam exaustas abraçadas mais no canto, não poderia cometer o egoísmo de acordá-las.

: - Eu vou voltar em poucos minutos. – Dinah pegou minha mão direita entre as suas e beijou repetidas vezes. – Você confia em mim?

: - Confio.

: - Então... – Com calma ela se levantou, ajeitando o seu casaco sobre os meus ombros. – Não vou demorar.

Apenas concordei com a cabeça, a vendo andar para longe de mim com um pouco de pressa. Suspirei exausta fisicamente e mentalmente, escorregando para baixo na cadeira. Eu só queria estar com Lauren, conferir se ela estava bem e sorrindo para mim. Eu só precisava disso para sentir vontade de seguir novamente. Ao meu lado eu podia ouvir Clara e Michael conversando, mesmo que tivesse os ignorado a maior parte do tempo. Meu pai estava sentado no outro canto cochilando na cadeira, o que não me deixou opção a não ser ouvir a conversa dos dois.

: - Eu nunca iria te perdoar se o pior tivesse acontecido com a minha filha, Clara. – Michael disse secando os olhos, visivelmente inconsolável. – Nunca.

: - Eu não sei o que me deu, eu... – Senti vontade de vomitar ao ouvir a voz dela. – Eu sinto tanto por isso, Michael. Eu fui horrível com ela, eu disse coisas terríveis. Eu me arrependo tanto. Eu não sei mais como dizer o quanto me arrependo do que causei nela. Se eu pudesse voltar no tempo, eu...

: - Agora não adianta mais nada, Clara. Olha só todo o mal que você causou pra sua própria filha. – Michael apontou o dedo para a porta de frente, onde Lauren estava. Eles conversavam baixo, mas o eco daquele corredor frio permitia que qualquer pessoa próxima o bastante escutasse. – Tudo isso porque ela é gay, Clara? Todo esse absurdo, essa rejeição porque Lauren não vai fazer a vida dela com um homem e lhe dar netos do modo tradicional? E o que isso importa? Você deveria ficar feliz por ela estar feliz. Ela não está matando ninguém e nem se drogando, ela apenas é gay. Veja, olhe ao seu redor, olhe a legião de fãs que Lauren carrega, todas as pessoas que dariam tudo por um momento perto dela e enchê-la de amor, apoio. E você que podia ter feito isso o tempo todo, só fez com que ela se sentisse um lixo. Você deu uma rasteira nela sem dó, Clara. Tudo isso por causa de um preconceito imundo. Você é a mãe dela, a pessoa que ela mais confiava no mundo. Olha toda essa merda que você causou. Lauren poderia estar morta agora.

: - Não fala uma coisa dessas, por favor. – Eu me encolhi em minha cadeira quando ela começou a soluçar dolorosamente. Eu não queria, mas a forma que ela colocou para fora o que sentia me fez perceber o tamanho da culpa que carregava. Meus olhos se encheram de lágrimas, não por ela, mas por lembrar do lugar em que Lauren estava. – Eu nunca vou me perdoar por todo o tempo que a rejeitei, nunca. Só Deus sabe o tamanho da dor que carrego aqui dentro, Michael, só ele sabe. Infelizmente eu só consegui enxergar o quanto estava sendo desumana com ela quando vi o pior quase acontecer na minha frente. Eu estava cega, eu sei disso e me arrependo mais do que posso dizer. Não é nada fácil para mim lidar com tudo isso, eu não sei nada em como ser uma boa mãe agora, eu tenho sido péssima por muito tempo. Olhe para Sinu... É tão fácil ser ela, ela é tão melhor do que eu. Camila teve sorte. Eu não posso dizer o mesmo da minha filha... Eu só quero consertar tudo o que destruí. Me ajuda a fazer isso, eu imploro. Me ajuda a ser uma mãe melhor pra minha menina.

Eu chorei baixinho no meu lugar a vendo chorar. Eu chorei porque estava doendo em mim e doendo nela. Eu chorei porque mesmo tendo odiado aquela mulher por um longo tempo, eu sabia que a dor do arrependimento era a pior existente nesse mundo. Não existia uma máquina que fizesse o tempo voltar para consertar os erros, existia apenas o futuro e o futuro era feito de paciência. Na vida, as coisas são traçadas por linhas invisíveis e intermináveis. Ali, nós escrevemos a nossa história sem saber se estamos borrando a tinta fresca. No final, quando percebemos, há uma grande mancha no papel, uma mancha de dor e arrependimento que completa todas as palavras erradas ditas sem pensar, as vírgulas colocadas nos lugares dos pontos finais, os pontos finais colocados nos lugares das vírgulas, as interrogações onde deveriam ser afirmações. Nós destruímos um texto que era para ser perfeito, a poesia que era para ser tema de uma vida. Nós complicamos o que era para ser fácil, nós tornamos fácil o que era para ser difícil. Nós só damos valor para algo quando estamos perto de perder, ou quando perdemos. Clara quase perdeu a própria filha para o seu egoísmo e preconceito, estava na hora dela começar a escrever as novas linhas da forma certa... Antes que não tivesse mais jeito.

 

Lauren POV.

A sensação não era uma das melhores, mas tudo parecia melhor do que a escuridão que eu enfrentei há algum tempo. Ainda não havia aberto os olhos, mas podia ouvir os sons ao meu redor. Apitos insistentes de uma máquina, os pingos irritantes de um líquido caindo em algum lugar, a minha respiração quase inexistente, o meu coração batendo calmo como nunca antes e um choro compulsivo. Baixo, mas ainda sim compulsivo. Eu separei os lábios e mexi a minha língua completamente seca dentro da boca, um gosto terrível me rendeu uma careta. Sentia-me completamente sonolenta, mas não queria voltar a cair na inconsciência.

: - Lauren?

Eu ouvi alguém me chamar e imediatamente reconheci a voz. Eu não morri, afinal. Aquilo era bom, muito bom. Eu não queria morrer, não, eu não queria. Eu só queria dormir para exterminar a dor. E eu dormi. Mas diferentemente do que eu achei, dormir acabou não sendo tão bom assim. Era como se eu estivesse andando em um beco escuro por toda uma vida, molhado e frio. Eu sabia que tinha de achar uma luz e sair de lá, mas ela nunca chegava. Será que se eu chegasse no final daquele túnel eu encontraria a morte? Perguntei-me novamente se morrer era fácil daquele jeito. Se fosse, com certeza era mais leve do que viver. Mas viver era o que eu queria fazer. Eu só queria viver e ser feliz. Com ela... Eu chamei por ela.

: - Camila? – Eu sabia que não era ela quem estava ao meu lado, não senti seu cheiro doce e viciante. Eu sabia exatamente quem era. Mas eu queria que ela fosse a primeira pessoa que eu visse quando conseguisse abrir os olhos, por isso chamei outra vez com a voz baixa. – Camila?

: - Camila está lá fora, filha. – Houve um aperto em minha mão direita, logo depois mais soluços. – Lauren...

: - Não! Chame a minha Camila. Chame!

Eu resmunguei aquela frase baixinho porque era a única coisa que eu conseguia dizer. Não queria ouvir nada, só queria que ela saísse, que fosse embora. Eu já havia experimentando uma rejeição sem tamanho há algum tempo, não precisava provar outra vez.

: - Shiu! Querida... Não diga nada. – Eu senti quando sua mão tocou o meu peito, esfregando entre os meus seios como se quisesse fazer o meu coração bater. Recusei-me a abrir os olhos. – Só me deixe falar... Só me escute.

Eu não tinha mais nenhuma outra opção, por isso respirei fundo e virei a minha cabeça para o lado contrário, procurando a saliva em minha boca que parecia não existir mais. Havia uma agulha na minha mão incomodando todas as vezes que eu mexia os dedos. O silêncio reinou por algum tempo, eu poderia dormir outra vez se ele persistisse por mais longos minutos. Até que ela começou a falar o que eu não sabia se queria ouvir.

: - Lauren... – Um soluço, uma respiração profunda. Apertei as pálpebras. - Eu não sei se você lembra, mas quando você era apenas uma garotinha, eu te prometi que independente dos monstros que você achasse existir embaixo da sua cama, eu estaria lá para expulsá-los. E eu expulsei todos eles enquanto você crescia, assim como mandei embora todas as pessoas que um dia te machucaram.

Não era a minha intenção deixar que as lágrimas me dominassem como na noite anterior, mas lembrar daquele passado feliz e perfeito fez com que eu sentisse saudade, e saudade dói de um jeito inimaginável. Clara apertou a minha mão entre as suas, tomando uma respiração longa antes de continuar.

: - Acontecesse que, dessa vez, as feridas foram feitas por mim, logo por mim que sempre fiz tudo por você, que sempre lhe jurei o melhor que eu pudesse lhe dar. Eu sei que eu errei, Lauren, eu sei que eu me transformei em um alguém terrível que não consigo compreender. Ontem a noite quando eu te vi naquele estado eu senti a pior dor que uma mãe pode sentir na vida, a dor de perder um filho. Eu senti como se estivesse sem rumo porque eu havia perdido você de alguma forma, e estava quase perdendo de outra. Eu me senti o pior dos seres humanos porque eu sabia que a culpa era minha.

Eu apenas concordei com a cabeça, querendo tirar a minha mão do meio das dela, mas perdendo a batalha quando a senti praticamente deitar o rosto na minha palma, molhando toda a região com suas lágrimas. Eu não posso dizer com clareza o sentimento que encheu o meu peito naquele momento, mas eu sabia que estava prestes a passar por cima de algo que nunca imaginei que venceria.

: - E eu estou aqui agora porque eu quero lhe pedir perdão. – Ela soluçou mais alto, junto com os apitos irritantes da maquina que media os meus batimentos cardíacos. Meu coração disparou. – Me perdoa, filha... Por favor, me perdoa. Eu sei que tenho sido uma péssima mãe, mas eu posso tentar outra vez, você pode me ensinar como ser boa pra você... Pra Camila. Me perdoa. Eu imploro, eu não posso viver carregando essa culpa nas minhas costas, por mais que eu mereça. Eu não posso deixar você seguir em frente sem mim, carregando uma mágoa que não precisa. Me ajuda a ser melhor, me ajuda a lidar com as coisas novas, a entender que nem tudo pode ser do jeito que eu quero.

: - Mãe...

Eu sussurrei entre um soluço, sentindo o meu corpo tremer. Naquele momento não mais de dor, mas sim de alívio.

: - Eu aceito você, Lauren. Eu aceito você, eu aceito a Camila, eu aceito vocês. Eu quero você feliz, eu só preciso que você seja feliz. Eu não posso suportar ver nos teus olhos novamente o que vi ontem, o ódio por mim. Você é minha filha, a minha garotinha... – Ela riu entre lágrimas, acariciando o meu peito, tocando o meu rosto. Eu deixei que ela me tocasse, eu deixei que ela me alinhasse. Eu precisava de carinho, eu precisava dela. Eu estava gritando internamente um “aqueça-me, respira-me”. Eu só queria amor, eu queria só queria calor. – Não importa a sua sexualidade, não me importa, Lauren. Eu demorei para perceber isso, mas antes tarde do que nunca. Você mesmo me dizia isso para algumas coisas, lembra? Eu estou aqui agora, eu não vou sair mais do teu lado. Foi preciso quase te perder para entender que na vida existem coisas muito mais importantes que aparências. Você me ensinou que o amor de mãe é mais verdadeiro do que qualquer coisa nesse mundo. Você me fez nascer de novo, filha. Me deixe te consertar, me deixa curar as feridas que eu te causei. Só me perdoa... Por favor, Lauren.

Sabe quando tudo parece ser um filme? Ou uma longa caminhada cansativa em que você só deseja o final? E quando você encontra o final tudo o que sente é alívio e vontade de beber uma fonte inteira de água? Eu havia chego no final, e todas aquelas palavras que saíram da boca daquela mulher eram a fonte de água. Ela desceu gelada pela minha garganta, esfriando todo o meu corpo, aliviando o que parecia não ter alívio, salvando o que não tinha mais salvação. Uma vez me disseram que Deus escrevesse certo por linhas tortas, e que algumas coisas precisam acontecer para servirem de exemplo. Eu entendi imediatamente porque tive que passar por tudo aquilo para alcançar aquele prêmio. Eu entendi que o beco escuro que eu atravessei e fez com que a morte ficasse cada vez mais perto, era necessário para servir como uma aprendizagem para a minha mãe. Um exemplo de vida, um exemplo claro de que nunca se é tarde demais para voltar ao começo. Eu voltei quando abri os olhos e olhei para ela, e ela voltou assim que disse com todas as palavras que me aceitava.

: - Eu...

: - Eu te perdoo, mãe. – A interrompi fracamente, ainda sentia-me exausta. Mas precisava dizer a ela o que era certo. – Eu perdoo você. Todo mundo merece uma segunda chance. E apesar de tudo... Você é minha mãe e eu preciso de você.

Fechei meus olhos e respirei fundo, tornando a abrir. O que enxerguei em seu rosto me levou de volta ao passado, quando eu a dizia que ela era a melhor mãe do mundo. Mesmo que não fosse, eu estava disposta a ajudá-la a ser. Clara se levantou do banquinho que estava sentada aos prantos, sorrindo como fazia tempos que eu não via. Ela negou com a cabeça e colocou o dedo indicador na frente dos lábios, indicando que eu deveria ficar em silêncio.

: - Está tudo bem... Meu amor. – Sua voz falhava e eu observei com os olhos embaçados pelas lágrimas quando ela se sentou na cama ao meu lado. – Descanse... Não precisa dizer mais nada.

: - Mãe...

: - Shiiu!

Com calma e delicadeza, a senti deitar a cabeça em meu peito, sobre os meus seios. Abraçou-me com cuidado, fazendo com que meu coração disparasse freneticamente. Foi a minha vez de chorar de forma compulsiva, pela primeira vez em muito tempo, de alegria. Ela chorou comigo, me tomou em seus braços como fazia quando eu era pequena, descansando em meu peito como se pudéssemos passar o resto de todo o tempo ali. Quase sem forças por causa da sonolência pesada que eu sentia, ergui o braço livre da agulha e levei a mão trêmula até sua cabeça, acariciando seus fios de cabelo.

: - Eu te amo. – Eu disse bem baixinho, as pálpebras fechadas vibrando por conta das lágrimas. – Eu te amo... Mãe.

Como eu sentia falta de dizer aquilo, como eu sentia falta daquele abraço, como eu sentia falta da minha mãe e da aceitação que nunca tive.

: - Eu também te amo, filha. – Sorri entre lágrimas, ciente de que um novo tempo iria começar para nós. – Muito, muito, meu amor, nunca se esqueça. Eu vou começar outra vez, eu serei tudo o que você precisa. Eu prometo.

Eu não iria me esquecer, eu não podia me esquecer. Eu sorri ainda de olhos fechados quando senti um cheiro gostoso invadir o quarto no mesmo momento, fazendo a minha felicidade repentina se completar da forma que precisava. Eu ouvi minha mãe sussurrar alguma coisa, mas não entendi o quê. Eu senti uma pequena mão tocar a minha testa, lábios quentes e trêmulos depositarem um pequeno beijo na ponta do meu nariz. Eu sorri de novo, lutando para abrir os meus olhos e encontrar Camila, de pé ao nosso lado na cama, sorrindo tanto que seus lindos olhos castanhos quase se fechavam por completo, inchados e avermelhados. Eu iria dizer algo, mas ela negou com a cabeça rapidamente, para que eu não me esforçasse. Era bom vê-la, era melhor do que qualquer outra coisa que eu havia desejado desde que acordei.

: - Camz...

Eu sussurrei para ela, lutando para não voltar a dormir.

: - Eu estou aqui, Lo. – Ela disse bem baixinho, acariciando o cabelo no topo da minha cabeça. – Nós estamos aqui.

Quando eu olhei para baixo uma última vez, vi minha mãe pegar uma das mãos de Camila entre as suas, entrelaçando seus dedos sobre o meu peito. Se aquele era um sonho que eu precisava ter antes de morrer, eu só desejei que ele continuasse acontecendo quando eu partisse.

: - Durma... – A voz rouca de Camila soava no meu ouvido de forma angelical, me embalando enquanto eu sucumbia de felicidade. – Eu te amo... Eu te amo.

Amor. De quantas formas diferentes você pode amar alguém? É possível nutrir por uma mesma pessoa três tipos de amor? Amar por amar, amar por motivo e amar por necessidade? Amar de forma pura, sem pedir nada em troca. Amar porque não tem outro jeito, amar apenas pelo jeito. Amor de mãe, amor de amiga, amor de mulher. Amor com atitude, amor com paixão, amor com devoção. Amor, só amor. Um ser humano é capaz de carregar dentro de si por uma mesma pessoa todas essas formas de amor? É capaz de perdoar, de começar de novo, de abrir mão por amor? De ver o lado positivo, de esquecer o negativo, de mostrar as feridas e implorar pela cura... Por amor? Se todas as pessoas no mundo pudessem perdoar umas as outras de forma sincera e abrir seus corações para todas as formas de amor, nós seríamos filhos de uma terra generosa e fértil. Amar é para os fortes, perdoar é uma virtude das grandes almas. A vida é um jogo onde não vale a pena perder tempo guardando rancores, pois uma hora ou outra esse jogo pode mostrar o seu final, e tudo o que lhe restará é o arrependimento. E você vai perceber que deveria ter amado mais, perdoado mais, consertado mais... Vivido mais. Algumas coisas acontecem para nos fazer entender que nada é por acaso, e que precisamos dar valor a elas antes que seja tarde demais, antes que chegue o dia em que possamos, infelizmente, perdê-las.

 


Notas Finais




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